| Foto: Beto Barata/AFP/Divulgação

A ausência dos “figurões” da política nas narrativas que envolvem a definição do valor de dinheiro a ser transferido, como sugeriu Marcelo Odebrecht ao falar de Michel Temer, não é novidade em Brasília. Na época do mensalão, escândalo que marcou o primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva no governo federal, o roteiro sustentado pelo ex-deputado federal Valdemar Costa Neto também excluía o petista da cena na qual se “batia o martelo” sobre valores.

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Em meados de 2005, em entrevista à revista Época, o então presidente do Partido Liberal (PL, hoje PR), Valdemar Costa Neto, disse que o ex-presidente Lula estava presente no apartamento onde se falou sobre dinheiro para construir a aliança entre o PL e o PT, em junho de 2002.

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“Estavam lá o Lula, o José Alencar, o Dirceu e o Delúbio. Depois o Lula até falou para o Zé Alencar: ‘vamos sair porque esta conversa é entre partidos, não entre candidatos’. O Lula e o Alencar ficaram na sala e fomos para o quarto eu, o Delúbio e o Dirceu. Eu comecei pedindo R$ 20 milhões para levar uns R$ 15 milhões. Daí, ficou aquela discussão”, descreveu Costa Neto.

Questionado pela revista Época se o ex-presidente Lula tinha conhecimento sobre que tipo de negociação estava sendo feita no quarto, Costa Neto respondeu que “ele sabia”. “Olha, ele e o Zé Dirceu construíram o PT juntos. O Lula sabia o que o Dirceu estava fazendo”, respondeu o ex-parlamentar.

Ainda segundo Costa Neto, o dinheiro recebido do PT − R$ 6,5 milhões, no fim das contas, segundo ele − serviu para pagar fornecedores de campanhas eleitorais de candidatos do PL. O dinheiro não foi registrado na Justiça Eleitoral.

Na época dos fatos, o então presidente Lula e seu vice, José Alencar, contestaram a versão de Costa Neto. Em nota, a dupla afirmou que apenas “participaram de conversações políticas com vistas à formação da base partidária de apoio à chapa que terminou por vencer as eleições daquele ano”.

Em 2010, arrolado como testemunha no Supremo Tribunal Federal (STF) de parte dos réus da Ação Penal 470, conhecida como nensalão, o ex-presidente Lula negou ter sido cobrado alguma vez por Costa Neto em função de alguma dívida com o PL. O petista também disse no STF que a formação de chapa do PT com o PL teria sido negociada pelas direções das duas legendas.

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Costa Neto foi condenado pelo STF à pena de 7 anos e 10 meses de reclusão, no regime inicial semiaberto, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Ele começou a cumprir a sentença em dezembro de 2013 e, em maio do ano passado, recebeu um indulto da Corte.

Lava Jato

Agora, o nome do atual presidente da República também surge na esteira da Lava Jato. Mas, o nível de participação do presidente Temer nas conversas sobre campanhas eleitorais ainda não está totalmente esclarecido.

Na semana passada, em depoimento prestado à Justiça Eleitoral, Marcelo Odebrecht confirmou ter ido a um jantar no Palácio do Jaburu, em maio de 2014, para falar com o presidente Temer e com Eliseu Padilha, hoje ministro-chefe da Casa Civil. Marcelo estava acompanhado de Cláudio Melo Filho, então executivo da Odebrecht e hoje um dos principais delatores da Lava Jato, no âmbito do STF. Mas, aparentemente, há duas versões sobre as conversas daquele jantar.

De acordo com trechos do depoimento de Marcelo acessados pela imprensa, não houve conversa sobre valores de doações a campanhas eleitorais do PMDB, assunto que ele acredita ter ficado a cargo de Padilha e de Melo Filho.

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a versão de Melo Filho tem outros contornos. Em depoimento que prestou aos investigadores da Lava Jato, “vazado” à imprensa em dezembro do ano passado, Melo Filho sugere que foi Marcelo Odebrecht quem durante o jantar teria definido a quantia de R$ 10 milhões às campanhas eleitorais do PMDB, após pedido expresso de ajuda financeira feito pelo presidente Temer.

No depoimento de Melo Filho, não fica claro se o valor acertado seria repassado de forma informal, ou seja, via “caixa dois”.

O presidente Temer afirma que pediu somente “auxílio formal e oficial à Construtora Norberto Odebrecht” e que “não autorizou, nem solicitou, que nada fosse feito sem amparo legal”. Também informou que a Odebrecht doou de fato R$ 11,3 milhões ao PMDB em 2014, como mostra a prestação de contas entregue ao TSE.