Estabelecer uma relação mais próxima com os cidadãos, principalmente com a população mais jovem, é o motivo pelo qual muitas prefeituras Brasil afora decidiram apostar em uma chamada “informalidade responsável” em seus perfis nas redes sociais. A ideia é dar uma cara menos sisuda ao conteúdo informativo das administrações e elevar o nível de interesse pelas pautas do poder público, que pelo menos em oito capitais do país – incluindo Curitiba – têm sido difundidas com o apoio dos novos códigos da linguagem da internet.
Perfil da prefeitura de Curitiba atende propósito de cidade ‘mais humana’
- Angieli Maros
Ainda na semana passada - em meio às discussões que surgiram em torno da maneira como são feitos os conteúdos das redes sociais em órgãos públicos - a prefeitura de Curitiba disse que a linha assumida nesta gestão atende ao propósito de tornar a cidade “mais humana”.
Em um texto publicado nas próprias redes sociais, o órgão agradeceu as críticas e os elogios que tem recebido pela gestão de suas páginas na internet e defendeu a postura adotada como forma de se aproximar da cidade.
“Entendemos que é o poder público que deve se esforçar para se aproximar das pessoas e não o contrário”, diz o texto, que também defendeu o uso dos memes como produtos de cultura popular que devem ser respeitados.
Na ocasião, em entrevista à Gazeta do Povo, o responsável pelo Departamento de Mídias Sociais e Internet da prefeitura de Curitiba, o jornalista Álvaro Benvenutti Borba, disse que a polêmica que nasceu com a resposta da prefeitura de São Paulo gerou a oportunidade para que a equipe curitibana explicasse à comunidade a escolha em tratar as informações de tal maneira. Segundo ele, embora a estética do perfil contemple humor e cultura pop, o essencial continua sendo a “disposição ao diálogo”.
Por novos códigos, entenda-se sobretudo aquilo que se espalha de maneira viral, como vídeos e os famosos memes. Sem tirar o foco da comunicação, eles ajudariam a viabilizar uma concepção mais cômica do cotidiano, segundo algumas equipes responsáveis por gerenciar o perfil de prefeituras de algumas capitais brasileiras. Até o momento, fora Curitiba, Belo Horizonte (MG), Rio de Janeiro (RJ), Brasília (DF), Campo Grande (MS), Cuiabá (MT), Salvador (BA) e Boa Vista (RR) decidiram apostar nessa onda, embora cada uma a sua maneira, mais ou menos evidente.
A prefeitura de Belo Horizonte, por exemplo, afirma ter repensado a forma de abordagem na internet depois de acompanhar o alto engajamento da “Prefs” – como ficou nacionalmente conhecida a prefeitura de Curitiba, uma das pioneiras no estilo “despojado” nas redes sociais.
A maneira como a equipe curitibana produz o conteúdo virtual esteve em meio a uma polêmica na semana passada, que pipocou depois que uma crítica da prefeitura de São Paulo ganhou as redes. “A gente acredita que administração pública não é entretenimento, então colocar capivaras voando não ajuda a pessoa a ser mais cidadã (...)”, acusou a prefeitura paulista em reposta dada a uma estudante que questionou a postura mais formal da equipe.
Miriam Guzella, assessoria e social media da prefeitura de Belo Horizonte, defende que a alteração na forma de gerenciar a página oficial no Facebook do órgão trouxe um aumento de 408% no número de seguidores e 320% de alcance semanal dos posts.
Por lá, a mudança nasceu com base em um estudo de público, que apontou um número muito alto de jovens seguindo a página da prefeitura da capital mineira (77% abaixo de 35 anos de idade). Por isso, a proposta foi adotar uma linguagem adaptada às mídias sociais, desvinculando a reprodução informativa nos moldes institucionais. “Vendo os cases e o alto engajamento da “Prefs” e observando melhor nossos seguidores, sentimos a necessidade de uma nova abordagem, algo que nos aproximasse mais dos cidadãos e despertasse neles o interesse de conhecer os trabalhos e serviços oferecidos pela prefeitura de BH, além de estimular a prática da cidadania”, justifica Miriam, em entrevista concedida por e-mail.
De acordo com ela, o modelo – que recebeu adaptações à linha editorial conforme as especificidades culturais da cidade – trouxe também um aumento pela procura dos serviços prestados e um fortalecimento no diálogo com a comunidade.
Em Cuiabá, no Mato Grosso, a concepção da internet como um instrumento de grande alcance levou a prefeitura a investir firme nas redes sociais, inclusive, com a contratação de uma agência de publicidade para pensar nas postagens que vão pra rede. “O trabalho é grande e sempre vinculado a nossa redação, que fornece todas as informações de apoio”, ressalta Leonardo Barreto, secretário-adjunto de Comunicação da prefeitura de Cuiabá.
Ele analisa que a abrangência do meio foi uma das principais motivações do novo trabalho da equipe, que mudou a cara das redes sociais da prefeitura em 2013 e, de lá pra cá, viu o número de “curtidas” aumentar de mil para 49 mil. “É preciso passar a notar a internet como o principal veículo em termos de permanência. As pessoas ficam muito tempo na frente do computador e quando não estão lá, estão com o celular na mão”.
Uso excessivo do informal pode comprometer credibilidade
Se o uso extenuante de memes e piadas pode dar um ar mais próximo às redes sociais de órgãos públicos – historicamente cristalizados –, por outro, especialistas da área alertam que é importante ponderar o uso da linguagem informal nas publicações para não afetar a credibilidade do conteúdo.
Samuel Pantoja Lima, professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília (UnB), diz que há hora pra tudo e, por isso, nem sempre reduzir a linguagem formal à linguem do cotidiano das pessoas é a maneira mais correta de levar informação à sociedade.
“É claro que as redes sociais são um insumo estratégico para estreitar essa relação [órgão público e comunidade]. Mas, o poder público carrega uma credibilidade, uma história, uma visão de sociedade. E é preciso muito cuidado para não passar a longo prazo uma impressão de pouco seriedade que vai contra essa história”, analisa Lima. “Nem tanto a terra nem tanto ao mar é o que vale”.
A professora de Jornalismo Digital da Universidade Positivo (UP) Rosiane Correia de Freitas, também reitera que o excesso de informalidade não é a melhor estratégia para aproximar a comunidade dos assuntos geridos pela administração pública. Na opinião dela, o aparato estatal tem um papel muito sério nas relações sociais e que apelar para o uso constante de informalidade pode garantir maior cumplicidade, mas não necessariamente cidadania.
“Esse diálogo que se estabelece nas redes sociais cria a ideia de que existe um canal de conversa entre a prefeitura e o público, que é via Facebook. Mas me parece uma deturpação da ideia de cidadania. A gente tem que ser cidadão em várias coisas que a gente faz no dia a dia e não apenas postando uma reclamação”, ressalta a professora, que também é coordenadora do Núcleo de Jornalismo de dados da UP. (AM)
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