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Sede do TJ: abono permanência e auxílios-saúde e alimentação elevam a remuneração | Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
Sede do TJ: abono permanência e auxílios-saúde e alimentação elevam a remuneração| Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

TC também paga acima do limite

Situação similar à do Tri­­bu­­nal de Justiça (TJ) é encontrada no Tribunal de Contas do Paraná (TC). Em abril, por exemplo, todos os sete conselheiros do TC aumentaram seus vencimentos até o limite do teto com gratificações relativas à ocupação de funções de direção no tribunal. E cinco deles passaram a ganhar mais do que o máximo constitucional devido a um benefício chamado de abono permanência.

O salário dos conselheiros do TC hoje é de R$ 24.117 – igual ao de um desembargador. Entretanto, todos eles recebem uma gratificação de direção que varia entre R$ 4,8 mil e R$ 6 mil. Parte dessa gratificação é retida para não ultrapassar o teto constitucional, atualmente em R$ 26,7 mil. Na prática, o rendimento bruto dos sete conselheiros, desconsiderando outros benefícios, é exatamente o teto. Mas cinco deles ainda ganham o abono permanência, que não é retido e corresponde a mais R$ 2,1 mil, acima do teto.

O curioso do pagamento de gratificações para funções diretivas é que essas atividades são necessariamente exercidas pelos conselheiros, que constituem a cúpula do órgão. O presidente do TC, Fernando Guimarães, argumenta que o exercício de direção é atividade diferente da função original dos conselheiros, que é de julgar as contas do estado e dos municípios. Isso, segundo ele, torna as gratificações legais.

Mais benefícios

Além desses benefícios já concedidos aos conselheiros, a partir deste mês o TC também pagará um auxílio-refeição de R$ 630, que não será retido pelo teto. A medida foi tomada por isonomia, depois que o Tribunal de Justiça (TJ) também concedeu esse benefício aos magistrados do estado. O benefício será retroativo a 2004, assim como no Judiciário. O custo anual será de R$ 150 mil.

E o TJ pretende criar um novo benefício para todos os juízes do Paraná. En­­caminhou para a Assembleia, em maio, uma proposta que estabelece que os magistrados terão direito a um reembolso anual de até R$ 3 mil para a compra de livros, soft­­wares e outras obras jurídicas. O projeto deve ser votado em breve.

Polêmica

Proposta de emenda constitucional extingue limite salarial

O teto constitucional é o salário máximo que qualquer funcionário público pode receber. Ele equivale ao que ganha um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Hoje, esse salário é de R$ 26.723,13 brutos. Além dos ministros do STF, deputados federais, senadores e a presidente Dilma Rousseff também recebem esse valor.

Quando um servidor público ganha alguma gratificação que faz com que seus rendimentos ultrapassem o teto, a diferença é retida. Entretanto, isso não vale para diversos auxílios e também para abonos de férias e de permanência. Uma proposta de emenda constitucional (PEC), que tramita na Câmara dos Deputados, pode flexibilizar essas regras e, na prática, extinguir o teto constitucional, pois liberaria o acúmulo de diversas vantagens que hoje são proibidas.

R$ 27,2 mil

por mês é a média mensal de rendimentos dos desembargadores do Paraná entre fevereiro e maio. O teto constitucional é de R$ 26,7 mil.

  • Miguel Kfouri Neto, presidente do TJ.
  • Fachada do TC: 5 dos 7 conselheiros ganham mais que o teto

O salário de um desembargador paranaense é de R$ 24.117. Entretanto, entre fevereiro e maio deste ano, nenhum deles ganhou apenas isso. Com auxílios e benefícios extrassalariais, o rendimento bruto mensal deles variou entre R$ 24,7 mil e R$ 32,1 mil, descontando as férias. Em geral, os ganhos no Tribunal de Justiça (TJ) são maiores do que o teto salarial do funcionalismo público em todo o país previsto na Constituição – R$ 26,7 mil atualmente. Cada um dos desembargadores do Paraná ganhou R$ 27,2 mil por mês, em média. Mas, como os benefícios não são considerados salário pela lei, eles não cometem ilegalidade.

Os principais responsáveis pela elevação na remuneração total dos magistrados são o abono de permanência e os auxílios-saúde e alimentação. O auxílio-saúde varia entre R$ 109 e R$ 672 mensais, dependendo da faixa etária. O auxílio-alimentação é de R$ 630. Já o abono de permanência é um benefício dado a quem tem idade ou tempo de serviço para se aposentar, mas que se mantém ativo. Dos 119 desembargadores, 90 receberam esse benefício em maio.

Além dos auxílios e benefícios, os magistrados ainda têm direito a duas férias por ano e a 50% de abono ao gozá-las – o trabalhador comum tem direito a apenas 33% de adicional de férias, uma vez ao ano. Na prática, os benefícios referentes aos períodos de descanso representam uma espécie de "14.º salário". Treze desembargadores receberam adicional de férias no último mês e, com isso, ganharam um total bruto acima de R$ 30 mil.

Não é possível saber quais desembargadores receberam os benefícios, já que o TJ divulga apenas os valores pagos, sem indicar os nomes dos beneficiários. Na última segunda-feira, o órgão declarou inconstitucional a divulgação individualizada dos salários dos servidores públicos do estado, conforme previa a Lei de Transparência Estadual, em vigência desde o ano passado.

O presidente do TJ, Miguel Kfouri Neto, diz que os gastos com auxílios são regulares. Como são verbas indenizatórias, elas não entram no cálculo do teto constitucional. Já o abono de permanência acaba sendo "zerado" no salário líquido, já que ele apenas anula a contribuição do servidor à Previdência.

O TJ gastou ao todo R$ 3,3 milhões com a folha de pagamento dos 119 desembargadores no mês passado. Esse cálculo desconsidera as diárias.

Regra, não exceção

O pagamento dos auxílios no TJ do Paraná não são ilegais tampouco constituem exceção no país. Trata-se de uma realidade da Justiça de todos os estados e também de outros órgãos da administração pública, incluindo o governo federal. Um exemplo é o salário dos ministros: reportagem do jornal O Estado de S. Paulo de abril deste ano mostrou que 13 ministros ganham acima do teto constitucional, elevando seus rendimentos com jetons. Esses pagamentos são referendados por resoluções do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

STF discute fim dos pagamentos além do máximo

O fim dos pagamentos acima do teto constitucional do funcionalismo público está em discussão no Supremo Tribunal Federal (STF). Uma súmula vinculante, de autoria do ministro Gilmar Mendes, define que os magistrados só poderão receber vantagens já previstas na Lei Orgânica da Magistratura (Loman), em vigor desde 1979. A corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Eliane Calmon, defende que a súmula vinculante não é o formato mais adequado para a mudança que, segundo ela, deveria ser discutida na reforma da Loman. O assunto deve ser votado pelo STF em breve.

Para a cientista política Maria Tereza Sadek, professora da USP, a Loman está datada, já que foi elaborada em um momento anterior à democracia. Entretanto, ela avalia que as opções sobre reformar a lei ou editar uma súmula não são excludentes. "Uma súmula pode ser mais rápida do que uma reforma na Loman."

Novela

A criação do Estatuto da Magistratura, previsto na Constituição de 1988 e que iria substituir a Loman, é uma novela antiga. Desde 2003, o STF discute o assunto. Um projeto chegou a ser apresentado ao Congresso, mas retornou ao Supremo para adequações. Ainda não há previsão de quando ele deve retornar ao Legislativo.

Há temores por parte de associações de juízes que parlamentares usem a oportunidade para retaliar os magistrados. "O STF tem de estudar quando é o melhor momento [para enviar a proposta]", diz o professor de Direito Constitucional Clemerson Clève, da UFPR. Para ele, o atual momento de tensão entre os três poderes, causado pelo julgamento do mensalão e a CPMI do Cachoeira, pode prejudicar a discussão da lei.

Sem critérios

Para Clève, o maior problema dos salários acima do teto é a falta de critérios para o estabelecimento de limites. Duas resoluções sobre o assunto foram editadas pelo CNJ em 2006. Mas, segundo o professor, elas abrem diversos precedentes para gratificações que superam o teto.

Essa falta de regulamentação, segundo Clève, tem causado uma "bola de neve". Na ausência de um critério adequado, diferentes órgãos acabam "copiando" os benefícios dos outros. Um exemplo é o auxílio-alimentação de R$ 630 dado aos magistrados do TJ, retroativo a 2004. Ele havia sido concedido anteriormente aos procuradores da República. Por simetria, os tribunais de todo o Brasil também o adotaram. Agora, por isonomia, ele passou a valer também para o Tribunal de Contas.

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