Entrevista
"As plataformas digitais deram um novo gás para o ativismo político"
Fabrício Silveira, doutor em Comunicação e professor da Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos-RS)
O que representa este novo ativismo na internet?
Em um primeiro momento, quando esses temas começaram a aparecer, havia uma vertente de estudiosos da comunicação que acreditava que isso levaria a um esvaziamento da ação política direta. Havia um entendimento desde a televisão, e isso voltou com a internet de que haveria uma substituição dos espaços públicos pelos meios de comunicação.
Isso aconteceu?
Não. O que eu vejo é uma revitalização da política. As redes sociais e as plataformas digitais deram um novo gás para o ativismo político.
Essas plataformas ajudam a democracia?
Determinados usos são politicamente ricos, mas a internet não está fora de um controle da liberdade política. Olhe toda a discussão que o Julian Assange [criador do Wikileaks] trouxe e como isso descortinou nossa democracia. Ao mesmo tempo, veja como houve uma tentativa de ocultar isso. Há um jogo de poder e forças em embate. E isso vale tanto para a política real como para a internet.
Um clique e uma causa. O fenômeno, que começou com as redes sociais na internet, ganhou plataformas eletrônicas específicas para a elaboração de abaixo-assinados e agora incomoda a classe política. A petição on-line contra a eleição de Renan Calheiros (PMDB-AL) à presidência do Senado, por exemplo, foi assinada por 1,6 milhão de pessoas.
Batizado pejorativamente de "ativismo de sofá", a participação em petições on-line dá voz a uma multidão de pessoas conectadas na web que até então eram pouco ligadas na política. "É a internet mudando a política e a política mudando o uso que se faz da internet", diz Pedro Abramovay, diretor de campanhas da Avaaz, uma ONG internacional de ativismo.
Foi a Avaaz a responsável pela coleta de assinaturas contra a eleição de Renan. Mas o recorde de assinaturas obtidas pela entidade dois milhões ainda é com a petição para que a Câmara votasse o projeto da Lei da Ficha Limpa.
Segundo Abramovay, a Avaaz atua como uma rede organizada em que a voz dos filiados é quem dita as causas a serem abraçadas. Foi assim com o pedido de cassação do registro de psicólogo do pastor Silas Malafaia, líder da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Ele criou polêmica ao declarar que haveria tratamento de "cura" para a homossexualidade.
Surgiu no Avaaz uma segunda petição, a favor de Malafaia. O abaixo-assinado, porém, acabou retirado do ar. "Fizemos uma consulta aos integrantes da nossa rede. A decisão deles foi de que a Avaaz não deveria encampar essa causa", explica Abramovay. Agora, o site coleta assinaturas contra a indicação do deputado Marcos Feliciano (PSC-SP) para a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Federal.
A Avaaz não é a única plataforma do tipo a atuar no Brasil. A Change, criada nos EUA e atualmente com 23 milhões de usuários, tem recebido adesões de brasileiros. A entidade usa uma metodologia diferente da Avaaz, permitindo petições contrárias entre si. "Entendemos que a internet tem seu próprio filtro. Uma petição ruim é como um vídeo ruim no Youtube. Vai ter poucos cliques e não vai pra frente", diz Graziela Tanaka, diretora de campanhas da Change.
Outro diferencial da Change é apostar nos temas mais próximos dos usuários. Graziela cita o caso de uma petição com 300 assinaturas que conseguiu que a Empresa de Trens Urbanos de Porto Alegre S.A. (Trensurb) antecipasse uma série de reformas em uma estação de trem.