A Polícia Federal grampeou, com autorização judicial, ao menos dois telefones de Otacílio Dantas Cartaxo, ex-secretário da Receita Federal entre 2009 e 2010 e que presidiu de 2011 até janeiro deste ano o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão responsável por julgar reclamações de contribuintes em débito com a Receita. Para a PF, há indícios de que Cartaxo participou do esquema de venda de decisões favoráveis a grandes empresas.
Conforme o inquérito, Cartaxo mantinha relações de proximidade com investigados no esquema, entre eles o próprio genro, Leonardo Siade Manzan. Nas escutas, lobistas e conselheiros conversam sobre supostas gestões do ex-secretário em favor de empresas suspeitas de pagar propina no órgão.
O monitoramento dos telefones de Cartaxo foi necessário, segundo relatório da PF enviado à Justiça Federal, “tendo em vista a suspeita que há sobre este alvo e a sua condição de presidente do Carf”. Os investigadores chegaram a pedir a prorrogação das interceptações.
Ex-conselheiro do Carf, o genro de Cartaxo é apontado pela PF como um dos principais integrantes do grupo suspeito de operar o esquema de venda de decisões. A relação com o sogro, segundo um dos relatórios, conferia a Manzan “grande prestígio e influência dentro do Carf, o que ele exerce sem pudor”.
As conversas entre os investigados, interceptadas na Operação Zelotes, fazem referências a supostas atividades do ex-chefe da Receita em favor do esquema. Numa delas, o conselheiro Paulo Roberto Cortez diz a um de seus sócios que recebeu um “recado sutil” de Cartaxo por meio do colega Valmir Sandri. O presidente do conselho queria, segundo Cortez, fazê-lo “calar a boca” sobre a forma como o processo da Gerdau estava sendo conduzido.
Em vez de ser relatado por um representante da Fazenda no Carf, o caso ficou sob responsabilidade do próprio Valmir. As investigações mostram indícios de que a Gerdau negociou propina para ter decisão favorável no caso, que envolve uma dívida de R$ 4 bilhões. O processo ainda não foi concluído.
A Gerdau informa que não foi comunicada sobre seu envolvimento na Operação Zelotes por nenhuma autoridade. Alega também que contrata “escritórios externos” para auxiliá-la nos processos que correm no Carf e que ainda não pagou esses prestadores de serviço. O pagamento, segundo a empresa, é condicionado ao êxito e ao “respeito à legalidade”.
A reportagem telefonou para os três telefones de Cartaxo e também esteve na casa dele, em Brasília. Mas não conseguiu contato. Manzan, genro de Cartaxo, também não respondeu aos contatos.
Mudança feita por Mantega permitiu ida de Cartaxo para o Carf
- Brasília
- Agência Estado
O ex-secretário da Receita Federal Otacílio Dantas Cartaxo só assumiu o comando do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) em 2011 porque o então ministro da Fazenda, Guido Mantega, alterou o regimento interno do órgão para permitir que a presidência fosse ocupada por um auditor fiscal aposentado. Antes disso, a norma só permitia o acesso a servidores da ativa.
Cartaxo foi grampeado pela Polícia Federal, que apura um esquema de pagamento de propinas a integrantes do Carf, espécie de “tribunal” que analisa recursos dos contribuintes autuados pelo Fisco.
[ex-ministro Mantega informa que]
Rejeita qualquer tipo de insinuação envolvendo o nome dele nesse tipo de episódio.
Trecho da nota de Guido Mantega, ex-ministro da Fazenda
O ex-secretário da Receita substituiu Caio Marcos Cândido em abril de 2011. Na mesma época, o Diário Oficial da União exonerou Leonardo Manzan, genro de Cartaxo, da função de conselheiro do Carf. Manzan fazia parte da Câmara Superior do Carf, órgão máximo do conselho, e passou a atuar para clientes com interesses no Carf, segundo a Polícia Federal.
Antes de ser nomeado para o Carf, Cartaxo ocupou a secretaria da Receita Federal também pelas mãos do ex-ministro Mantega. Ele substituiu Lina Vieira em 2009, que deixou o cargo após acusar a presidente Dilma, então chefe da Casa Civil, de pedir a interrupção de investigações do Fisco sobre a família do ex-presidente José Sarney (PMDB-AP).
Procurado, o ex-ministro Mantega informou, em nota, que “rejeita qualquer tipo de insinuação envolvendo o nome dele nesse tipo de episódio”. Ele lembrou que foi em 2013, na gestão dele à frente do Ministério da Fazenda, que foi criada uma corregedoria para investigar irregularidades, inclusive no Carf.
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