Sede de entidade fica em prédio modesto de Brasília
Brasília - Flagrado em uma gravação em que recebe instruções do secretário-executivo do Ministério do Turismo, Frederico Costa, sobre como montar uma empresa de fachada convincente, o empresário Fábio de Mello parece não ter aplicado as "dicas" na entidade que preside, o Instituto Brasileiro de Organização do Trabalho Intelectual e Tecnológico (IBT). A sede da Oscip fica no modesto edifício Ceará, no Setor Comercial Sul, região central de Brasília.
Na conversa com Mello interceptada pela Polícia Federal, o número dois do ministério deu as seguintes orientações: "Pega um prédio moderno, meio andar, fala que está com uma sede que está em construção [...]. O importante é a fachada. Tem que ser uma coisa moderna, que inspira confiança em relação ao tamanho das coisas que vocês estão fazendo". Ambos foram presos na terça-feira, durante a Operação Voucher.
O ITB funciona em duas salas de 34 metros quadrados cada. O aluguel dos escritórios do prédio varia entre R$ 400 e R$ 600. Ontem, entre as 14h30 e 15h30, não havia ninguém trabalhando no local.
Durante a tarde, nenhuma pessoa atendeu chamadas feitas para o telefone mencionado no site da Oscip (www.ibtbrasil.org.br). Uma pessoa que se identificou como funcionária do ITB atendeu em outro número que aparece em um documento do instituto, de um escritório localizado na Asa Norte de Brasília. Segundo um empregado da recepção do edifício Ceará, apenas duas mulheres frequentam o local uma dá expediente algumas vezes por semana, enquanto outra aparece esporadicamente para buscar correspondências.
A funcionária de um escritório ao lado confirmou que "raramente" vê alguém no local. No site, o IBT se define como "parceiro de instituições de pesquisa de renome além de contar com mais de XX profissionais cuja formação é ímpar no mercado". O texto aparece exatamente com as letras "XX", sem o número real de funcionários.
André Gonçalves, correspondente
Perfil
Mello é ligado a várias ONGs
Uma das figuras centrais no escândalo de desvio de verbas do Ministério do Turismo, Fábio de Mello está ligado a diversas ONGs que receberam repasses da pasta nos últimos anos. Além das suspeitas de envolvimento em irregularidades nos programas da Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba (SEB), empresas presididas ou dirigidas por Mello também foram subcontratadas com recursos do Ministério do Turismo pela Fundação Universa, ligada à Universidade Católica de Brasília, em convênios de R$ 27 milhões. De acordo com informações publicadas pela Folha de S. Paulo, duas empresas se revezavam e venciam as concorrências da Universa: a MGP Brasil e a Barbalho Reis Comunicação e Consultoria, que tem Fábio de Mello entre os sócios.
Além disso, em dezembro de 2009, Mello já havia assinado, como presidente da ONG IBT, um contrato de prestação de serviços à Universa em convênio com o Ministério do Turismo. Só para um deles, o IBT recebeu R$ 1,5 milhão. Segundo a PF, essas mesmas empresas foram subcontratadas no Amapá e não prestaram os serviços, o que levou à deflagração da Operação Voucher. (ELG)
O empresário e dirigente de ONGs Fábio de Mello, preso pela Polícia Federal na Operação Voucher, atuou diretamente nos contratos do Ministério do Turismo com a Sociedade Evangélica Beneficente (SEB) de Curitiba entidade sem fins lucrativos mantenedora do Hospital Evangélico e da Faculdade Evangélica. A informação consta do relatório da auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) que investiga os repasses do ministério para a SEB, obtido com exclusividade pela Gazeta do Povo com fontes de Brasília.
O nome de Mello tornou-se conhecido pela divulgação, anteontem, de escutas telefônicas da PF, autorizadas pela Justiça Federal, nas quais recebe orientações do secretário-executivo do Ministério do Turismo, Frederico Silva Costa. O secretário, que está preso, "ensina" Mello a montar uma ONG de fachada para fechar convênios com o governo federal.
Irregularidades envolvendo Mello e empresas e ONGs dirigidas por ele também foram apontadas pela auditoria do TCU nos contratos feitos pela SEB com recursos do Turismo. De acordo com os auditores, Mello teria elaborado os projetos de qualificação de profissionais para a Copa de 2014 desenvolvidos pela SEB. Segundo o TCU, há indícios de superfaturamento nos serviços prestados pela SEB, fraude e simulação de concorrência e alteração de dados públicos do sistema de convênios do Ministério do Planejamento.
Assessoria
Além disso, ainda de acordo com o TCU, Mello teria assessorado a presidência da SEB até abril de 2010 e conseguiu que a entidade contratasse uma empresa dirigida por ele, o Instituto Brasileiro de Organização do Trabalho Intelectual e Tecnológico (IBT), para prestar serviços. O TCU afirma no relatório que a contratação da IBT tem "indícios de fraude e simulação de concorrência".
Os auditores identificaram ainda que, dentro da SEB, foi montada uma espécie de equipe terceirizada para lidar com os projetos relacionados à Copa do Mundo. Esta terceirização, diz o TCU, teria sido feita porque a SEB não teria capacidade técnica para gerir os projetos ligados ao Turismo, já que a entidade está mais "relacionada a projetos e programas na área da saúde".
Na equipe "terceirizada" da SEB, estariam, além de Fábio de Mello, o ex-presidente da ONG Darby Valente e o superintendente financeiro Luiz Antonio Tarasiuk. Sobre Valente e Tarasiuk, o TCU afirma que ambos "atuaram, ora por omissão, ora por ação, por vontade livre e consciente, inexistindo elementos que excluam a reprovabilidade da conduta dos gestores".
O TCU ainda têm indícios de que Cláudia Zacharow Milleo, sobrinha do deputado federal André Zacharow (PMDB), teve participação nos projetos da SEB. O deputado peemedebista foi quem destinou duas emendas parlamentares, num total de R$ 7,5 milhões do orçamento do Ministério do Turismo, para a SEB. A entidade é presidida por Zacharow desde 1988, mas atualmente o parlamentar está licenciado do cargo por exercer o mandato na Câmara.
Os progamas desenvolvidos pela SEB, supostamente com irregularidades, foram aprovados por dois funcionários do ministério. É o caso da hora/aula de cursos presenciais e on-line previstos nos programas de capacitação.
Compra superfaturada
Outro indício de ilicitude é a compra supostamente superfaturada de "reprodução de material didático" para capacitação. O custo, pelo contrato, seria de R$ 250 mil, mas os auditores do TCU encontraram o mesmo material por R$ 68,4 mil valor quase quatro vezes menor, o que sugere superfaturamento.
O relatório não menciona o suposto crime de desvio de dinheiro, mas fontes do TCU disseram que a auditoria deve ser encaminhada para Ministério Público Federal e para a PF. Diante dos indícios, o TCU do Paraná solicitou ao tribunal em Brasília que suspenda imediatamente o repasse de verbas federais envolvendo o convênio com a SEB. O pedido deve ser analisado nos próximos dias pelo ministro do TCU Antonio Sherman.
SEB nega irregularidades nos convênios
Por meio de nota, a Sociedade Evangélica Beneficente (SEB) rebateu a existência de irregularidade nos programas desenvolvidos por ela com os recursos do Ministério do Turismo. "Os convênios cumprem todos os ritos legais vigentes e os recursos [foram] aplicados em suas finalidades específicas dentro de critérios técnicos e éticos", diz o texto. A SEB afirma ainda que "todos os procedimentos estabelecidos nos termos de convênio estão devidamente registrados no Sistema de Gestão de Convênios e Contratos de Repasse (Siconv), do governo federal".
Já o Ministério do Turismo afirmou que, caso encontre alguma irregularidade na prestação de contas dos convênios com a SEB, "tomará as providências cabíveis, que envolvem até devolução da verba repassada". A pasta ainda se colocou "à disposição dos órgãos de controle interno e externo para quaisquer esclarecimentos".
Procurados pela reportagem durante toda a tarde de ontem, não foram encontrados para comentar o caso Fábio de Mello, Cláudia Zacharow Milleo, Darby Valente e Luiz Antonio Tarasiuk.
Mas, em reportagem publicada ontem, o deputado André Zacharow (PMDB-PR) e Darby Valente disseram desconhecer irregularidades na execução dos convênios da SEB e afirmaram estar surpresos com os ilícitos apontados pelo TCU. "Eu apenas encaminho a emenda para o projeto. (...) Não posso responder pela execução", disse o parlamentar.
Já Valente afirmou que, como deixou o cargo de presidente da SEB há seis meses, lembra vagamente do caso e que não viu nada de irregular.
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