Transparência dos governos, acesso à informação e participação formam o tripé que sustenta o conceito de governo aberto ou OGP (do inglês, Open Government Partnership). A iniciativa para que os países adotem esse tipo de medida congrega 64 governos, entre eles o do Brasil. A OGP é um organismo multilateral e independente, que faz com que os governantes aceitem um acordo para cumprir tarefas relacionadas à transparência da administração pública. Os países assinam um tratado bianual chamado plano de ação e, a partir daí, se comprometem a adotar medidas como abertura dos orçamentos e discussão sobre prioridade nos investimentos. Dois anos depois, o plano passa por uma relatoria. O Brasil faz parte da OGP desde 2008 e passa, atualmente, pela fase de avaliação do segundo plano de ação, que será feita por Fabro Steibel, membro do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS). Ele vai analisar quais pontos do documento foram cumpridos pelas instituições determinadas no último plano de ação. Steibel conversou com a Gazeta do Povo sobre o conceito de governo aberto. Veja alguns trechos da conversa:
Como podemos explicar o conceito de governo aberto?
O governo aberto prioriza quatro valores. O primeiro é a transparência: os dados têm que estar à disposição do cidadão. Depois, a participação: tem de haver mecanismos de participação. Temos também o accountability, que é um conceito relacionado à responsabilização dos agentes públicos com relação aos gastos ou ferramentas para que o cidadão saiba como o dinheiro público foi gasto. O quarto valor do governo aberto envolve tecnologia, porque é possível usar a tecnologia para criar ferramentas para que os três valores anteriores sejam cumpridos. Esses quatro pilares estão integrados. No Brasil, quem centraliza as ações é a CGU [Controladoria-Geral da União]. O último plano bianual do país tinha 54 pontos, que envolvia diversos ministérios.
Governo eletrônico e governo aberto são semelhantes?
São duas coisas diferentes. Governo eletrônico significa que uma parte da administração está on-line. Mas não significa necessariamente participação. O governo aberto inclui a abertura do governo para o cidadão, com foco em tecnologias que possam intensificar essa relação.
Que tipo de meta é incluída nestes relatórios de cada país?
O importante a entender é que a OGP não é um ranking. Nunca saberemos qual é mais aberto que outro. A unidade de análise é o comprometimento, que quem faz é cada país, de acordo com a sua realidade. Nós auditamos a meta de acordo com o que se comprometem. A OGP exige que o comprometimento seja ousado. Aquelas experiências que dão certo são compartilhadas com os outros integrantes, que podem passar a adotá-la. Dos 64 países que integram o grupo, alguns deles têm sérios problemas de corrupção, falta de transparência. Por isso a OGP é muito importante. Países como a Indonésia, Republicana Dominicana, Trinidad e Tobago, Ucrânia, por exemplo, não divulgavam os gastos do governo e passaram a fazer isso com a OGP. Nós conseguimos monitorar o comprometimento dos países. Uma coisa importante é que, no final da auditoria do relator independente, são definidas algumas áreas e metas que o país tem a obrigação de responder. Por exemplo: se na relatoria do plano de ação brasileiro for identificado que existe pouca transparência naquilo que é relacionado à Copa, o país tem de dar um parecer sobre aquilo. O relatório da OGP tem um potencial extremamente transformador.
Mas essa iniciativa exige a participação do cidadão?
Temos dois grandes clientes: os governos e a sociedade civil organizada, que em cada país é consultada. O relator averigua se o comprometimento foi entregue parcialmente ou totalmente. Depois, conversa com a sociedade civil organizada relacionada às áreas trabalhadas nas metas, para ver qual foi a visão dela. Vamos supor que Brasil se comprometeu a fazer orçamento participativo da Copa. Fez site, ofereceu ferramentas para a participação. Depois de passar pela auditoria, a OGP vai falar com a sociedade civil para saber se foi um sucesso ou não. A tarefa do relator não é nem pesar, nem só celebrar, mas ajudar a compor um quadro real para saber se o país está dentro do que consideramos como governo aberto. O desafio é desenvolver expertise, tecnologia, para que as pessoas possam ajudar a criar soluções possíveis, porque estou convencido de que as pessoas querem participar da política. Mas ninguém sabe como abrir um governo, é um princípio experimental que quebra a lógica anterior. 99% do que os governos fazem não tem participação. Então, qualquer medida que faça isso é uma solução positiva.
Há bons exemplos de iniciativas de governo aberto?
O Brasil é um dos países mais adiantados nesse sentido. O Portal de Transparência que o Brasil inaugurou em 2004 é um exemplo, bem como o aplicativo Colabore em Curitiba; o Gabinete Digital, do Rio Grande do Sul; a Assembleia Legislativa de Minas Gerais e a própria consulta pública sobre o Marco Civil da Internet. Os resultados das iniciativas de governo aberto são vistos a longo prazo, pois há uma curva de aprendizado no ser cumprida. Mas os governos estão dispostos a aprender. E uma vez que o governo se abre, é difícil que volte a fechar.