Brasília A polêmica vivida no Paraná sobre a distribuição de medicamentos de alto custo ganhou espaço no Senado, com a discussão de dois projetos de lei distintos sobre o tema. De um lado, está a visão defendida pelo governador Roberto Requião (PMDB), de que uma máfia de advogados aliada aos interesses de indústrias farmacêuticas estaria arrombando as contas públicas com ações judiciais. Do outro, o entendimento do senador Flávio Arns (PT), que busca uma solução a partir do ponto de vista dos doentes, mesmo que isso possa dobrar os gastos anuais de R$ 1,7 bilhão com os remédios excepcionais.
Ambas as vertentes foram colocadas frente a frente durante audiência pública realizada ontem pela Comissão de Direitos Humanos do Senado. A do governador está inserida no projeto de autoria do senador Tião Viana (PT-AC), que estabelece critérios para a distribuição de medicamentos de alto custo pelo Sistema Único de Saúde (SUS). A proposta coloca apenas nas mãos do Ministério da Saúde a prerrogativa de escolha de quais medicamentos seriam distribuídos e blindaria o Estado contra possíveis ações judiciais. Durante discurso, Viana citou a luta de Requião no estado. "Queremos evitar o comportamento mafioso paralelo que atinge o SUS", citou, referindo-se ao caso de médicos que receitam medicamentos caros e sem a devida comprovação de eficácia.
No projeto de Arns, a tarefa de escolha dos medicamentos ficaria compartilhada com outros setores, incluindo entidades não-governamentais. Para isso, seria criado o Conselho Nacional de Incorporação de Medicamentos e Produtos da Saúde. Segundo a proposta, a relação de medicamentos excepcionais que não sofre modificações há quatro anos deveria ser atualizada anualmente.
Hoje, não existe lei que crie normas para a distribuição ou montagem da lista. A distribuição é regulamentada apenas por uma portaria, o que facilita o caminho para a abertura de processo judiciais movidos por pacientes. "Estamos tratando de dois pontos de vista antagônicos, que já pareceram sem solução, o do doente, que precisa do remédio, e o do governo, que paga por ele. O que precisamos agora é chamar as partes, convergir e chegarmos a uma solução para o problema", declarou o senador paranaense.
É esse rumo que deve ser seguido pelo relator do projeto elaborado por Viana, o senador Paulo Paim (PT-RS). Ele já decidiu que irá juntar os dois projetos. "Quero chegar a um consenso", afirmou Paim.
A audiência realizada ontem reuniu ainda diversas autoridades sobre o tema. O secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães, afirmou que o país vive um impasse. "De um lado temos quem luta pelo direito à vida e, do outro, aqueles que cometem abusos para garantir que isso ocorra."
Guimarães, assim como Viana, adotou um discurso ofensivo à indústria farmacêutica. "Estamos na fronteira entre os interesses comerciais e os da saúde pública", disse. O secretário também destacou que a gestão Lula ampliou os gastos com remédios de alto custo de R$ 500 milhões em 2003 para R$ 1,7 bilhão no ano passado.
Já a presidente da Associação Brasileira de Câncer, Marília Casseb, afirmou que a "demonização" dos laboratórios é uma "aberração". Ele defendeu o projeto de Arns e enfatizou que a proposta de Viana é restritiva ao limitar a entrada de medicamentos na lista.