Entidades jurídicas apresentaram nesta segunda-feira (3) em uma audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado críticas ao projeto que torna mais rígidas as punições para os crimes de abuso de autoridade. O principal criticado é o que pune o juiz por sua interpretação.
A sessão no Senado foi esvaziada pela ausência do senador Roberto Requião (PMDB-PR), que é relator do projeto de autoria do senador Renan Calheiros (PMDB-AL). Também não compareceu o procurador-geral do República, Rodrigo Janot, que apresentou há alguns dias uma proposta alternativa de projeto de lei.
O sub-procurador da República, Nívio Freitas Silva Filho, representando Janot, alertou aos senadores que é “flagrante” inconstitucionalidade o chamado crime de interpretação ou crime de hermenêutica, que prevê punição para o juiz de primeira instância que considerar crime uma prova, e ela ser derrubada na segunda instância.
Para os depoentes, o ponto fundamental da proposta de Janot, é a retirada do artigo que trata do crime de interpretação. José Robalinho Cavalcanti, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), explicou, por exemplo, que se o parecer de Requião for aprovado como está, os senadores poderiam ser punidos por manter os direitos políticos da presidente cassada Dilma Rousseff, na votação do impeachment.
“Pela Constituição, de forma clara, o afastamento dos direitos políticos da ex-presidente Dilma seria claramente obrigatório. Mas Vossas Excelências interpretaram e entenderam o contrário. Se o projeto do senador Requião fosse aprovado como está, qualquer um dos senhores senadores poderia ser processado porque contrariou a literalidade da lei”, exemplificou Robalinho.
“Esse projeto não atende à Constituição, é uma tentativa de calar o Ministério Público e isso não é bom, não interessa à sociedade brasileira, uma tentativa de violar a independência funcional dessas carreiras. Querem transformar juízes em meros despachantes de interesses particulares. Os juízes não podem decidir com medo dos poderosos”, criticou José Antônio Collossí, diretor de assuntos legislativos da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra).
Os outros representantes de entidades jurídicas também criticaram a pressa na votação do projeto, com o intuito de intimidar as investigações da Lava-Jato. O relator, Roberto Requião ( PMDB-PR), nem sequer estava presente na audiência pública.
“Não legislemos ao sabor de uma situação momentânea que é a Lava-Jato”, alertou o Jaime Martins, presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), completando que, tal como está, o parecer de Requião vai se cercear a atividade jurisdicional de maneira grave.
Em defesa do projeto, e na ausência de Requião, o senador Edison Lobão (PMDB-MA) reagiu: “O projeto não tem o objetivo menor de punir, impedir, obstaculizar a Lava-Jato. Seria apequenar a nova lei. Eu entendo sua posição como líder da associação de juízes”..
O presidente do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), pretende encaminhar para a CCJ o projeto alternativo apresentado pelo procurador geral Rodrigo Janot. Mas o presidente da Comissão, Edison Lobão já avisou que caberá a Requião acatar ou não algum dos pontos sugeridos por Janot. O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) também pretende encaminhar as sugestões de Janot como um projeto alternativo. Requião ignorou todas as sugestões de Janot.
Randolfe pode apresentar como projeto e eu vou nomear o Requião como relator no plenário. Ele acata ou não. O procurador Janot tem o direito e o dever de se posicionar , é normal e até útil que faça isso, mas quem vota é a CCJ e depois o plenário”, avisou Lobão.
Para o senador Cristovam Buarque (PDT-DF), a imagem que passa é que essa é uma lei que está sedo votada para proteger os que estão sendo investigados. Ele diz que não é o momento. “Concordo que não podemos votar essa lei com açodamento. Ideia que está passando é que é uma Lei anti-Moro. Nós todos estamos sob suspeição. Estamos legislando para tentar tolher, coibir , ameaçar, todos nós, me incluo nisso. Não quero passar a ideia de que vou votar uma leu que vai tolher alguém que vai me julgar”, criticou o senador Cristovam Buarque.