O ex-promotor Antonio Di Pietro, símbolo da operação de luta contra a corrupção “Mãos Limpas” (Mani Pulite), que decapitou a classe política há 25 anos na Itália, conta sobre a situação atual no país, que continua sofrendo com a corrupção. “Aqui na Itália, não há mais uma certeza da lei, nem da condenação, há uma sensação de impunidade e impotência”, disse ele, em entrevista à AFP. A operação é muitas vezes apontada como inspiração para a Lava Jato, que está apavorando a classe política brasileira.
Di Pietro também contou sobre um episódio onde teve que marcar “cada nota” de suborno recebido por um político como forma de desmascará-lo.
Lava Jato coloca ao menos cinco ministros de Michel Temer na “corda bamba”
Leia a matéria completaQual a sua lembrança desse 17 de fevereiro de 1992 [quando ocorreu a tentativa de suborno]?
Eu sabia que o suborno seria pago porque a pessoa que deveria fazê-lo havia dito e assim combinamos a armadilha.
Eu marquei as notas, uma por uma, e quando a polícia apareceu, o acusado disse ‘este é o meu dinheiro’. E eu o questionei: ‘mas como você explica esta marca que fiz em cada nota?’
Era um sistema de corrupção que implicava uma lista de empresas, envolvidas em esquemas de licitações, obras públicas e fornecimentos de equipamento. Se você não participasse, estava fora do esquema.
Como conseguiu desmantelar todo um sistema?
Tivemos de encontrar uma maneira de quebrar o silêncio, o pacto de omertà [termo que define um código de honra de organizações mafiosas].
A operação Mãos Limpas não foi uma investigação sobre a corrupção, mas uma investigação de crimes fiscais. Nós entendemos que a maioria das empresas envolvidas em licitações públicas tinham filiais em paraísos fiscais.
Mas tais crimes podem ser documentados. Com as cartas rogatórias, conseguimos obter os documentos, e então questionei a empresa em causa: ‘Por que você fez isso?’
‘Fomos forçados’, responderam as empresas, e desta forma quebrei o pacto de silêncio.
Os promotores de Milão e Palermo organizaram o trabalho em conjunto. Isto permitiu se concentrar em crimes específicos, especialmente os crimes contra a administração pública.
Qual é a situação atual na Itália?
Na época, os políticos pegavam o dinheiro para o seu partido e para si próprios. Hoje, eu não consigo ver todo este amor para com os partidos políticos, a metade dos eleitos mudou de partido durante a legislatura.
Aqui na Itália, não há mais uma certeza da lei, nem da condenação, há uma sensação de impunidade e impotência.
As pessoas não confiam em mais nada e dizem: ‘se todo mundo engana e rouba, eu também vou enganar’.
Se eu pudesse, iria intervir com algumas regras simples para restaurar a certeza da lei e da punição.
Gostaria de começar com a introdução do agente provocador: você nunca sabe se aquele que lhe oferece dinheiro é um policial ou não. Gostaria de assegurar que a prescrição terminasse com o envio à justiça [na Itália a prescrição continua a funcionar mesmo após o encaminhamento aos tribunais] e eu gostaria de eliminar o número de recursos, deixando apenas a primeira instância e a cassação.
No momento da ‘Operação Mãos Limpas’, a opinião pública tinha a ideia de uma guerra entre polícias e ladrões. Hoje, as pessoas têm a sensação de assistir a uma guerra entre gangues de ladrões.
Símbolo da autonomia do BC, Campos Neto se despede com expectativa de aceleração nos juros
Após críticas, Randolfe retira projeto para barrar avanço da direita no Senado em 2026
Novo decreto de armas de Lula terá poucas mudanças e frustra setor
Câmara vai votar “pacote” de projetos na área da segurança pública; saiba quais são
Deixe sua opinião