Quatro dos nove ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) aptos a julgar as contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff são citados em investigações de crimes diversos e dois são formalmente investigados no Supremo Tribunal Federal (STF). Pela Constituição, ministros do TCU se equiparam a ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e por isso têm foro privilegiado junto ao STF.
O caso mais recente é o do relator das contas de Dilma, ministro Augusto Nardes. Na terça-feira (6), a Justiça Federal encaminhou ao STF citações de suposto pagamento de propina ao ministro em esquema investigado na Operação Zelotes, que apura fraudes e supostas compras de decisões no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). O julgamento das contas da presidente está agendado para as 17 horas desta quarta-feira.
O ministro Raimundo Carreiro é formalmente investigado em inquérito aberto no STF para apurar acusações feitas pelo empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da construtora UTC. Em delação premiada, Pessoa disse ter feito pagamentos para ser beneficiado em processo no TCU sobre a usina nuclear Angra 3, em Angra dos Reis (RJ). O relator do processo é o ministro Carreiro. O dinheiro – R$ 1 milhão – foi repassado ao advogado Tiago Cedraz, que teria dito que o beneficiário final seria o ministro.
O inquérito ainda tramita de forma oculta no STF, pois a delação de Pessoa permanece em sigilo. Junto com Carreiro, as investigações se concentram em Tiago Cedraz. Ele é filho do presidente do TCU, Aroldo Cedraz.
O dono da UTC disse ter feito pagamentos mensais de R$ 50 mil a Tiago para obter informações privilegiadas no TCU. A reportagem apurou que o presidente do TCU não é formalmente investigado no inquérito. Mas algumas diligências passam por atos do presidente, como um pedido de vista em 2012 -- revelado pelo GLOBO -- em processo que trata diretamente dos interesses da UTC em Angra 3. O pedido de vista adiou uma votação por duas semanas.
O ministro Vital do Rêgo, mais novo integrante do TCU e ex-senador pelo PMDB, é formalmente investigado no STF desde junho deste ano por suspeita de compra de votos. O inquérito aberto investiga ainda o deputado federal Veneziano Rêgo (PMDB-PB), irmão do ministro.
A suspeita é que os dois tenham pressionado funcionários da prefeitura de Campina Grande (PB) a votarem na candidata da família, que sucederia Veneziano na prefeitura, condicionando os empregos comissionados ao voto na candidata. Catorze funcionários da prefeitura já foram ouvidos pela Justiça Eleitoral na Paraíba e alguns depoimentos “confirmam os fatos narrados”, segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em parecer de 7 de julho. Janot entendeu haver “sinalização” da prática de compra de voto e pediu a continuidade do inquérito, com a oitiva do ministro e do deputado.
No caso de Nardes, investigações da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF) encontraram indícios de pagamentos atribuídos a ele, após a deflagração da segunda fase da Operação Zelotes. A segunda fase foi deflagrada no começo de setembro, com cumprimento de mandados de busca e apreensão em escritórios de contabilidade no DF, em São Paulo e no Rio Grande do Sul.
As citações a Nardes foram identificadas em parte do material apreendido. A Procuradoria da República no DF encaminhou essas citações à Justiça Federal, por conta da judicialização do caso a partir da existência de medidas invasivas como as buscas e apreensões. A Justiça remeteu ontem as citações ao STF. Caberá à Suprema Corte pedir uma manifestação da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre a necessidade de dar início a investigações sobre suposto pagamento de propina ao ministro do TCU. A PGR ainda não recebeu o material do STF.
Reportagem publicada pelo site do jornal Folha de São Paulo na noite de terça-feira informa que Nardes pode ter recebido R$ 1,65 milhão de empresa investigada na Zelotes sob a suspeita de fraude fiscal. Conforme a reportagem, os pagamentos teriam ocorrido entre dezembro de 2011 e janeiro de 2012.
O ministro do TCU e um sobrinho foram sócios de uma empresa chamada Planalto Soluções e Negócios. A empresa recebeu repasses de uma consultoria suspeita de corromper conselheiros do Carf. A reportagem da “Folha” cita que mensagens eletrônicas de uma secretária da consultoria faz referência a pagamentos de R$ 1,65 milhão a “Tio”. Segundo investigadores, seria Nardes. O pagamento total, incluído o suposto repasse ao sobrinho, foi de R$ 2,6 milhões.
Nardes diz que não é mais sócio da Planalto desde 2005 e nega qualquer recebimento de repasses ilegais. Cedraz nega qualquer envolvimento nos negócios do filho e diz que se declara impedido de votar nos processos de Tiago e dos sócios. Carreiro afirma que nunca recebeu repasses ilegais e que nenhuma interferência externa ocorreu em suas votações. Vital nega qualquer acusação de compra de votos.
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