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O juiz federal Pedro Francisco da Silva, relator do recurso contra a demarcação da Terra Indígena (TI) Marãwatsede, no norte de Mato Grosso, considera que fazendeiros e posseiros agiram de má-fé ao ocupar a área na década de 1990, pois eram sabedores que se tratava de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios Xavante.

De acordo com o relator, que aprecia o recurso no Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, fazendeiros e posseiros simplesmente invadiram a área por vontade própria porque se auto-intitularam detentores do direito de ali serem assentados em processo de reforma agrária.

Depois que o juiz leu as 32 páginas do relatório e votou favoravelmente aos indígenas, o desembargador João Batista Gomes Moreira pediu vista do processo para examinar melhor a questão. Além do desembargador e do relator, vota no processo a desembargadora Maria do Carmo Cardoso, da 5ª Turma do TRF. A retomada do julgamento só deve ocorrer no início de 2010.

O adiamento, entretanto, não desanimou o cacique Damião (Parisené). O julgamento está muito bom, mas buscamos a vitória. É devagar. Nós não podemos pressionar, isso é trabalho, disse elogiando o relator na saída do julgamento.

O cacique foi criado na terra Marãwatsede até os 10 anos. Hoje, aos 58 anos, tem esperança de receber a terra de volta. Nunca perdemos na Justiça. Temos direito, somos habitantes do Brasil primeiro, lembrou.

No início da audiência, o presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), Márcio Meira, afirmou que a história dos Xavante e da terra Marãwatsede é uma história longa, uma enorme dívida do Estado brasileiro com esse povo".

Meira acredita que a Justiça dará ganho de causa aos índios e Funai e assegura que os ocupantes legais da terra, caso existam, serão indenizados. Nós estamos seguindo a lei. As famílias que eventualmente estejam dentro da terra indígena, se elas forem clientes da reforma agrária, serão reassentadas, irão receber lotes de terra pelo Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária]. Já existe uma área reservada para fazer esse reassentamento. Os direitos previstos na lei serão respeitados tanto para os indígenas quanto para quem tiver que sair da terra afirmou Agência Brasil.

Terra em disputa já foi o maior latifúndio do Brasil

Os indígenas que viviam na terra Marãwatsede foram expulsos da área em 1966 após a ocupação comandada pelo fazendeiro Ariosto Riva, em sociedade com o Grupo Ometto. Juntos, eles tomaram controle de uma área que, segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), chegou a ter 1,7 milhão de hectares formando a Fazenda Suiá-Missu, época o maior latifúndio do Brasil.

Depois de trabalharem gratuitamente para Riva, enfrentarem conflitos com seus empregados, passarem fome e serem deslocados três vezes dentro da fazenda, cerca de 230 índios Xavante foram transferidos por meio de avião da Força Aérea Brasileira (FAB) para uma fazenda a 400 quilômetros, a Missão Salesiana de São Marcos. Uma semana após o deslocamento, 70 índios morreram por causa de sarampo.

Depois do Grupo Ometto, o controle da fazenda Suiá-Missu foi passado para a empresa Liquifam Agropecuária Suiá-Missú S/A, que foi sucedida em 1980 pela empresa petrolífera estatal italiana Agip do Brasil S/A. A empresa italiana anunciou a devolução da terra aos indígenas em junho de 1992 durante a Conferência ECO 92, após acordo com o governo brasileiro.

Naquele mês, segundo descrito no relatório do juiz Pedro Francisco da Silva, a Fundação Nacional do Índio (Funai) tomou conhecimento de que as terras da fazenda estavam sendo loteadas por centena de famílias de 'sem terra', com apoio de políticos da região, grandes fazendeiros e da própria Agip do Brasil, com o intuito de obstacularizar o retorno dos Xavante área.

De acordo com o Cimi, o objetivo da reforma agrária privada, como ficou conhecida, era a de ter pequenos proprietários que arrendariam suas terras para a produção agropecuária de grandes latifundiários, que assim se livrariam de qualquer litígio direto pela exploração de terra indígena.

A demarcação da terra foi concluída pela Funai em 1993 e a homologação feita cinco anos depois por decreto presidencial. Em 2004 um grupo de índios Xavante retornam Marãwatsede após acamparem por seis meses beira da estrada. Segundo o Cimi, há 900 indígenas nas terras que continuam invadidas pelos posseiros e fazendeiros que entraram com recurso na Justiça.

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