Reação
Severino diz que não se arrepende
Recife - Responsável pela confusão que terminou na expulsão do padre Vito Miracapillo, o hoje prefeito de João Alfredo, Severino Cavalcanti (PP), também não se opõe ao seu retorno. Mas diz que não se arrepende. "Já se passaram muitos anos, e ele deve ter refletido muito sobre a atitude que tomou, desvalorizando o Brasil. É bom que venha agora para ver como mudou o país que tanto criticou. Não me arrependo do pronunciamento, nem de ter pedido a expulsão, porque ele merecia punição diante da tentativa de desestabilizar o governo."
A reação dos donos de engenho, que culminou na expulsão do padre Vito, foi liderada na época pelo Sindicato dos Cultivadores de Cana. Hoje, o seu presidente, Gerson Carneiro Leão, afirma não temer mais o padre: "Junto de outras coisas que aconteceram no Brasil, como o MST, ele pode ser considerado um pinto [algo insignificante]. Ele é bem-vindo hoje. Na época, éramos aliados do governo militar, e ele insuflava os trabalhadores nos canaviais; gostava muito dos pobres e por isso era tido como incendiário. Mas a mentalidade hoje é outra. Podem vir dez Vito Miracapillos. A gente tinha muito medo do governo Lula e ele foi o melhor presidente para nossa categoria. Por que vamos ter medo desse padre?"
Recife - Expulso do Brasil em 1980 em um polêmico processo que contribuiu para agravar ainda mais o conflito entre Igreja e Estado , o padre italiano Vito Miracapillo tenta inutilmente, há quase uma década, reaver o visto de permanência no país, onde pretende retomar o trabalho pastoral interrompido durante o regime militar. A esperança de reverter essa situação veio com a concessão do visto de trabalho para o conterrâneo Cesare Battisti. O ex-ativista italiano, considerado terrorista em sua terra natal, conseguiu o documento em apenas duas semanas, em junho, após ser solto por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF).
O padre Vito quer voltar ao município de Ribeirão, a 87 quilômetros de Recife, do qual foi pároco. E residir na Zona da Mata de Pernambuco, onde se concentra a agroindústria açucareira do estado, considerada área de tensão social pelos órgãos oficiais.
"O caso Battisti não é um argumento, mas uma referência para nós. Ele, que foi condenado por quatro homicídios, obteve asilo no país e conseguiu o visto rapidamente. Se isso cabe para ele, cabe mais ainda para o padre Vito", explicou o advogado Pedro Eurico de Barros. Na segunda-feira passada, ele protocolou novo pedido na Polícia Federal para revalidar o visto do padre.
História
Em plena ditadura no Brasil, o padre foi incluído na Lei de Segurança Nacional e atingido pelo então recém-promulgado Estatuto do Estrangeiro, por ter se recusado a atender pedido da prefeitura para que celebrasse missa comemorativa da Independência do Brasil, em 7 de setembro de 1980 alegando que o Brasil, sob ditadura, não era independente. Num ofício ao prefeito de Ribeirão, Salomão Correia Brasil (PDS), o padre justificou a recusa, entre outros motivos, devido "à não efetivação da independência do povo", reduzido "à condição de pedinte e desamparado dos seus direitos".
Tido como subversivo por usineiros e donos de engenho, foi criticado na Assembleia Legislativa pelo então deputado estadual Severino Cavalcanti (PDS) o mesmo que mais tarde se tornaria presidente da Câmara dos Deputados e renunciaria com o escândalo do mensalinho, acusado de obter propina.
Severino invocou o Estatuto do Estrangeiro pela primeira vez no país, quando fez um apelo ao então ministro da Justiça, Ibrahim Abi Ackel, para que expulsasse o padre: "Esses padres subversivos precisam ser observados", disse Severino na época.
A expulsão envolveu uma batalha jurídica, com ordens e contraordens, que mobilizou advogados da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e chegou ao Supremo Tribunal Federal, que decidiu pela expulsão do sacerdote. O decreto também mobilizou o clero no Nordeste, que promoveu em Ribeirão uma missa de desagravo ao italiano que terminou em pancadaria. Donos de engenhos, fornecedores de cana e usineiros exibiram armas na igreja e usaram o mastro de uma bandeira do Brasil para dissolver a multidão de fiéis.
Colaborou Rosana Félix.
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