Trecho de rodovia sob concessão da ANTT| Foto: Henry Milleo/ Gazeta do Povo
Bernardo Figueiredo: recondução foi barrada

Peça fundamental para tirar os pacotes de concessão de rodovias e ferrovias do papel, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) está escanteada e enfraquecida. Desde a saída de Bernardo Figueiredo do comando, após sua recondução ao cargo ser barrada pelo Congresso, no ano passado, a diretoria está incompleta – desfalque que poderá comprometer os trabalhos do órgão como fiscalizador e regulador. Da mesa da diretoria, sairão os editais de licitação mais esperados pelos investidores na área de infraestrutura.

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Dos três executivos responsáveis pelas decisões do órgão, dois são interinos, indicados pelo Ministério dos Transportes, e apenas um passou pela sabatina do Senado Federal. Trata-se de Jorge Luiz Macedo Bastos, um ex-diretor do time de basquete Universo, de Brasília, que desde fevereiro ocupa o posto mais alto da ANTT.

Indicado à diretoria da agência em 2010, quando era assessor técnico do ex-senador Wellington Salgado, ele substituiu Ivo Borges, cujo mandato expirou no início do ano. Quando entrou na agência, o próprio Bastos afirmou que sua única experiência com transportes era como usuário. Os dois diretores interinos são profissionais de carreira da agência (uma terceira diretora interina está de licença) e conhecem bem os meandros do setor, mas não contam com a boa vontade do Senado para serem aprovados.

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No começo de dezembro de 2012, a presidente Dilma Rousseff indicou três nomes para ocupar a diretoria da agência: Carlos Fernando do Nascimento e Natália Marcassa de Souza, ambos funcionários da ANTT, e Daniel Sigelmann, atualmente no Ministério dos Transportes. Até hoje, no entanto, a Comissão de Infraestrutura do Senado não definiu os relatores da matéria nem parece interessada no assunto. Procurada pela reportagem, a comissão afirmou que as indicações não estão em pauta e que o senador Fernando Collor, presidente da comissão, não tinha agenda para atender a demanda.

O único nome que já tem relator definido para apreciar a pauta é o do ex-ministro dos Transportes Paulo Sérgio Passos, substituído em abril por César Borges. Passos, profissional experiente na área, foi indicado pela presidente para ser diretor- geral da agência. Mas sua estreia está ameaçada. O relator da pauta é o senador Alfredo Nascimento, ex-ministro dos Transportes, que deixou o cargo sob denúncias de corrupção, em 2011. Passos o substituiu e comandou a chamada faxina nos Transportes, com a demissão de vários diretores. O senador não quis falar do assunto.

Agência corre o risco de perder espaço na tomada de decisões

Com a diretoria desfalcada, várias atribuições da ANTT têm sido repassadas para outras autarquias. Uma fonte que participa do processo de modelagem do trem-bala, por exemplo, afirma que não tem visto a presença de diretores da agência nas discussões. "Sempre há representantes do BNDES, do Tesouro, da Presidência e da Casa Civil, mas ninguém da ANTT."

Além disso, boa parte das decisões foi transferida para a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), comandada por Bernardo Figueiredo, ex- diretor da ANTT. Mas a publicação dos editais, as audiências públicas e minutas dos contratos terão de ser feitas pela agência. Se a atual situação for mantida, dizem especialistas, ela corre o risco apenas de emprestar o nome para publicar os documentos no Diário Oficial da União.

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"A agência ficou com o papel secundário, intermediário. Essa situação, de alguma forma, impacta os grandes projetos do país", afirma o advogado Robertson Emerenciano, do escritório Emerenciano, Baggio e Associados.

Segundo ele, os investidores estrangeiros não acompanham de perto esse vaivém das agências, mas quando decidem fazer um investimento querem saber como funcionam. "Aí você tem de explicar que o modelo é misto, que tem agência, mas suas ações são limitadas."

Perda de força

Pelas recomendações do Banco Mundial e da Organização para a Cooperação e Desen­­­volvimento Econômico (OCDE), além da independência nas decisões, as agências devem ter um órgão colegiado com cinco diretores escolhidos pelo presidente da República e chancelados pelo Congresso.

"Com o sistema atual de se pôr interinos na diretoria, há um desvirtuamento total das agências, que perdem autonomia e abrem oportunidades para outros órgãos", diz o especialista em administração pública e professor da Fundação Getulio Vargas Sérgio Guerra.

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"A ANTT, como outras agências, tem sofrido esse esvaziamento com a redução do corpo diretivo que fere o modelo", completa Guerra.