Michel Temer: ninguém arrisca dizer como ele governaria.| Foto: Ueslei Marcelino/Reuters

Na última vez em que concorreu a deputado federal, em 2006, Michel Temer bateu na trave. Com 99.046 votos (0,476% do total), elegeu-se “por média”, ou seja, graças à distribuição das sobras de vagas por coligação. Dentre os 70 eleitos por São Paulo, foi o 54º mais votado e o pior colocado da magérrima bancada de três parlamentares do PMDB.

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O fraco desempenho nas urnas é uma das nuances da enigmática trajetória do atual vice-presidente da República. “É alguém que te deixaria com ótima impressão em um encontro casual numa biblioteca, mas que jamais ganharia seu voto após um comício”, diz um jovem peemedebista da Câmara.

Em conversas com congressistas, os adjetivos contido, formal e morno são os preferidos para descrevê-lo. Houve quem usasse a comparação com uma esfinge. Mas quase ninguém se arrisca a cravar o que ele pensa sobre direita ou esquerda, conflitos internacionais ou soluções imediatas para tirar o país da crise.

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Nos anos 1990, o todo-poderoso senador baiano Antônio Carlos Magalhães costumava chamá-lo de “mordomo de velório”. Referia-se a uma frieza que, a princípio, era usada como um instinto de autodefesa ao tiroteio do dia a dia popularesco do Congresso. Na época, o sobrenome do peemedebista impunha mais respeito entre acadêmicos do que numa mesa de reunião com o coronelato regional do partido dos Barbalho, Calheiros, Quércia, Sarney e Requião.

Desde os anos 1970, Temer é considerado um dos papas do constitucionalismo. Publicado em 1982, seu livro “Elementos de Direito Constitucional” vendeu mais de 200 mil exemplares, chegou no ano passado à 24ª edição e é disputado à tapa por concurseiros. Formado pela USP, construiu a carreira de professor na PUC-SP e deu aula para boa parte dos atuais ministros do Supremo. Dentre eles, o recém-empossado paranaense Luiz Edson Fachin. “Nos anos 1980, fazer o curso de mestrado coordenado pelo Temer mudava a carreira das pessoas”, diz o deputado federal Osmar Serraglio (PMDB-PR). Ele, Fachin e o ex-presidente do STF, Carlos Ayres Britto, integraram a mesma turma, em 1983.

Michel Miguel Elias Temer Lulia nasceu em 1940, em Tietê (SP) filho de libaneses. Disputou a primeira eleição em 1986, quando se elegeu constituinte. Permaneceu na Câmara por mais cinco mandatos até ser eleito vice-presidente na chapa com Dilma Rousseff .

O nascimento político,se deu pelas mãos do então governador de São Paulo Franco Montoro, que o indicou ao cargo de procurador-geral do Estado, em 1983. Um ano depois, passou para o cargo de secretário de Segurança Pública, que voltou a ocupar entre 1993 e 1994, após o massacre do Carandiru.

Nos anos como deputado, brilhou das portas dos gabinetes para dentro, desviou de escândalos e acumulou prestígio intrapartidário. Foi presidente da Câmara por três biênios e é presidente nacional do PMDB desde 2001. “Temer foi esperto o suficiente para entender que os caciques do PMDB sempre se anulariam entre si nas brigas internas e precisariam de alguém com menos peso eleitoral para comandar o partido”, relata outro peemedebista.

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Essa característica neutra em um ambiente tão diverso quanto o PMDB, que em tese nunca seria diferencial para alçá-lo à Presidência da República, cacifou Temer como um trunfo para quem defende um governo de concertação após um possível impeachment de Dilma. Com a faixa presidencial no peito, porém, poucos se arriscam a prever como seria uma gestão Temer (quase nenhum parlamentar ouvido pela reportagem aceitou ter o nome citado e outros tantos nem quiseram dar depoimento).

“Talvez por se expor tão pouco, Temer está chegando aonde quer: apresentar-se como uma alternativa razoável em meio a uma onda de radicalismo por todos os lados. Talvez só aí todo mundo saiba quem ele realmente é”, aposta mais um anônimo peemedebista.