Ao longo de quase cinco horas, a sessão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado reservada para a sabatina do ministro licenciado da Justiça e da Segurança Pública, Alexandre de Moraes, foi marcada por perguntas sobre temas polêmicos, parte envolvendo situações ainda anteriores à sua indicação para a cadeira de ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
Moraes só será confirmado como membro da Corte, na vaga aberta com a morte de Teori Zavascki, em 19 de janeiro, se houver o aval dos senadores. Moraes é apoiado pela larga maioria que o presidente Temer detém no Senado e sua aprovação ao STF é dada como certa.
O início da sabatina, por volta das 10h30, foi tumultuado, com três “questões de ordem” apresentadas por oposicionistas, todas rejeitadas pelo presidente da CCJ, Edison Lobão (PMDB-MA). Moraes só começou efetivamente a responder às primeiras perguntas, feitas pelo relator, Eduardo Braga (PMDB-AM), por volta do meio-dia. A maioria das questões foi encaminhada por cidadãos, que se inscreveram no Portal e-Cidadania, do Senado. Foram registradas quase 1,5 mil perguntas do “público externo”.
Em seguida, Moraes passou a responder às questões dos senadores. Com o alto número de inscritos, a sabatina foi até por volta das 21h30, com duração de 11 horas.
Após sabatina de 11 horas, indicação de Moraes ao STF é aprovada na CCJ do Senado
Leia a matéria completaEntre os temas abordados, estão polêmicas como a suposta ligação de seu escritório com a facção criminosa PCC, o suposto plágio em livro de sua autoria, além da sua conexão com a Operação Acrônimo. Moraes também já falou sobre o vínculo com o presidente Temer, e o fato de sua mulher, a advogada Viviane Barci de Moraes, atuar em processos no STF, fato que não constava no material sobre o candidato, entregue previamente aos senadores.
Ligação com o PCC
Sobre “a história de que eu sou advogado do PCC”, disse Moraes, o candidato ao STF confirmou que a cooperativa Transcooper de fato era cliente de seu escritório de advocacia. “O escritório do qual eu era sócio-administrador tinha, graças a Deus, inúmeros clientes”, iniciou ele. Moraes, contudo, sustenta que ela não tem ligação com a facção criminosa PCC, “nem o escritório de advocacia”.
“Determinado deputado estadual em São Paulo, que é irmão de um vereador de São Paulo que era um dos cooperados, pediu emprestado uma garagem da cooperativa, e fez uma reunião com pessoas que estariam o auxiliando na sua campanha eleitoral. Duas dessas pessoas, convidadas para a reunião política, estavam sendo investigadas por ligação com o crime organizado”, resumiu Moraes.
Segundo o ministro licenciado, “nada ficou comprovado em relação ao deputado estadual, nada em relação à Transcooper, que emprestou a garagem, e muito menos em relação ao escritório, que não sabia do empréstimo da garagem, não sabia da reunião”.
O episódio ocorreu no ano de 2014 e, segundo Moraes, foi “deturpado” quando ele foi nomeado secretário estadual de São Paulo, na gestão Alckmin (PSDB), em 2015. “Ingressei contra oito sites que espalharam calúnias, difamações e injúrias na internet . Mas, cada um que você retira, parece erva daninha, vai proliferando”, acrescentou ele.
Xampu, leões e farpas: a sabatina de Alexandre de Moraes não é só polêmica
Leia a matéria completaMoraes nega plágio
Sobre o suposto plágio, Moraes atacou o professor de Minas Gerais que levantou o assunto na internet e também a reportagem da Folha de S.Paulo que tratou do assunto. Recentemente, o jornal revelou que um dos seus livros, Direitos Humanos Fundamentais, de 1997, possui trechos idênticos aos de uma obra de um autor espanhol, Francisco Rubio Llorente (1930-2016), intitulada Derechos Fundamentales y Principios Constitucionales e publicada em 1995.
Segundo Moraes, os trechos são “decisões públicas do tribunal constitucional espanhol” e, por isso, suas reproduções não poderiam ser consideradas plágio.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, o professor Fernando Jayme, que é diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), reforçou que “ao deixar de fazer a citação, parece que a ideia é dele, mas é de outro autor, do qual ele copiou literalmente”.
Moraes afirmou que a reportagem foi “maldosa” e que se trata de “uma questão inventada por alguém que infelizmente foi reprovado em concurso na faculdade de São Paulo” e ficou “guardando rancor”.
Operação Acrônimo
Moraes também minimizou o episódio da Operação Acrônimo, de agosto do ano passado, quando seu nome apareceu em planilhas apreendidas na empresa JHSF Participações, investigada pela Polícia Federal por financiamento irregular para a campanha do hoje governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT). Segundo ele, a PF encontrou “notas fiscais e contratos legais”.
“O material foi encaminhado para o STF. E o STF viu que não tinha nenhum indício de atividade ilícita e determinou liminarmente o arquivamento da petição, em setembro de 2016. Jamais existiu, não existe e não existirá uma investigação [contra mim]. Pois nada ilícito foi praticado”, respondeu ele.
Sem conflito de interesse com a esposa
Em relação à esposa, a advogada Viviane Barci de Moraes, Moraes também minimizou a polêmica, que surgiu após a imprensa revelar que ela atuava em processos no âmbito do STF. “Minha esposa é advogada há mais de 20 anos. Qual o problema? A esposa tem que abdicar do seu trabalho e fazer nada em casa? Eu tenho três filhos, dois fazem Direito. Não tem vinculação”, afirmou ele. Moraes depois ponderou que certamente vai se declarar impedido para atuar nos casos defendidos por ela. Moraes não explicou, contudo, porque tal informação [parentes com processos no STF] não havia sido repassada por ele aos senadores, previamente.
Mais tarde, em outro momento, o senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) voltou a colocar o tema na pauta, apontando justamente a suposta omissão. Moraes respondeu que não considerava uma omissão. Pelo Regimento Interno do Senado, justificou o candidato, só é necessário “indicar parentes que tenham vinculação com sua atividade profissional”. Sua mulher, embora advogada, não atuava no mesmo escritório, reforçou Moraes.
Cargo de confiança: vale a indicação?
Questionado sobre o fato de ele ter defendido, em sua tese de doutorado na USP, que a indicação ao cargo de ministro do STF deveria ser proibida para aqueles que exercem cargos de confiança no Executivo, Moraes afirmou que sua ideia deve ser vista dentro de um contexto, no qual se faziam “inúmeras propostas de aprimoramento” à Corte brasileira, nos moldes dos tribunais constitucionais europeus. “Não vejo nenhuma incoerência em defender uma alteração e aceitar uma indicação. Posso garantir que atuarei com absoluta independência e imparcialidade”, respondeu ele.
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