Brasília é uma espécie de “ilha da fantasia”, imune às turbulências| Foto: Wilson Dias/ABr

Os altos salários pagos pelo setor público nos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário mantêm a economia da capital federal aquecida, reforçando a imagem de que Brasília é uma ilha da fantasia, imune à turbulência global. Sem a ameaça de desemprego ou de redução de salários, os funcionários públicos continuam consumindo como se a crise global não existisse.

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Essa condição privilegiada sustenta um mercado imobiliário em expansão – cujo metro quadrado é um dos mais altos do país – e movimenta o comércio de automóveis, que em janeiro cresceu 19,27%, contra uma média nacional de apenas 1,63%.

Nos últimos três anos, as vendas de veículos no Distrito Federal cresceram 42%, turbinadas pelos aumentos salariais concedidos aos funcionários públicos. Na média, os rendimentos do setor público são 4,1 vezes maiores do que a renda no setor privado, mas, em tempos de crise financeira, o fator mais valorizado é a estabilidade no emprego.

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"Nossos clientes são funcionários públicos com renda média R$ 12 mil, que desfrutam vantagens como o crédito consignado. São clientes exigentes, que buscam veículos mais sofisticados", explica Ricardo Lima, presidente dos Concessionários e Distribuidores de Veículos Autorizados do Distrito Federal (Sincodiv-DF).

Com salários iniciais que variam entre R$ 10 mil e R$ 12 mil, as carreiras de elite do Executivo, do Legislativo e do Judiciário chegam ao seu topo com rendimentos entre R$ 19 mil e R$ 24,5 mil, teto salarial para o setor público, mas, contando vantagens pessoais, muitos salários superam esse valor.

Se a venda de automóveis é um indicativo de como a crise não chegou ao Distrito Federal, é no setor imobiliário que isso fica mais evidente. O preço dos imóveis em Brasília é um dos mais altos do país – entre R$ 8 mil e R$ 10 mil o metro quadrado – e, ainda assim, o mercado tem uma demanda reprimida que só faz crescer o custo da moradia para as classes média e alta.

Há poucos dias, o governo do Distrito Federal colocou à venda um terreno de 170 hectares em área nobre de Brasília para a construção do Setor Noroeste – um bairro destinado à classe média e alta – e vendeu 90% dos lotes em poucas horas. O mercado estima que o preço do metro quadrado nessa área ficará em torno de R$ 8 mil, mas os valores podem subir ainda mais até a venda efetiva dos apartamentos.

Estabilidade

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"Brasília é uma cidade administrativa, e a estabilidade no emprego dá tranquilidade para trabalhar e gastar", observa Marcelo Oliveira, diretor da Paulo Otávio Empreendimentos, uma das maiores incorporadoras do Distrito Federal. Ele descreve o perfil de seus clientes. Dois terços são funcionários públicos; em geral, o marido e a mulher trabalham no setor público e a renda familiar chega a R$ 20 mil, o que garante uma sobra para adquirir um bom imóvel no Plano Piloto – a área central de Brasília. Essa família compra depois outros imóveis para os filhos e assim contribui para manter a demanda aquecida. "Esses dois terços (dos compradores) estão preservados. É um mercado cativo que não sofre com as intempéries", afirma o executivo.

O Distrito Federal tem 181 mil funcionários públicos, de um total de mais de 1,1 milhão de trabalhadores. Estima-se que os servidores são responsáveis por cerca de 60% da massa salarial da cidade. A capital tem também um dos custos de vida mais altos do país. No ano passado, o setor imobiliário cresceu 25% no Distrito Federal, quase o dobro do crescimento do mercado paulista (13,6%), por exemplo. E a expectativa das lideranças empresariais é de um crescimento de 20% em 2009, mesmo que a crise econômica se torne mais aguda.