Sob o argumento de que o Judiciário estaria se intrometendo em questões de competência Legislativa, o Senado acaba de derrubar a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de redefinir a distribuição das bancadas das Câmaras dos Deputados.
Após mais de duas horas de discussão, os 14 estados não atingidos se dividiram nas posições, mas venceu a tese dos oito estados prejudicados pela resolução do TSE, tendência adiantada pelo jornal O Estado de S. Paulo nesta quarta-feira, 23.
Para que a determinação de recontagem das bancadas de deputados seja suspensa em definitivo, o projeto de decreto legislativo ainda precisa ser analisado pela Câmara dos Deputados, onde a tendência é pela aprovação e manutenção da atual divisão de cadeiras.
A Corte Eleitoral havia determinado em maio que as quantidades de deputados federais, estaduais e distritais deveriam ser revistas com base em dados do último Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 2010. Hoje, a distribuição das vagas está baseada na população dos Estados em 1998.
A determinação do TSE reduziu em uma vaga as bancadas de Alagoas, Espírito Santo, Pernambuco, Paraná, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, e também tirou duas vagas da Paraíba. Ganham assentos Amazonas (1), Santa Catarina (1), Ceará (2), Minas Gerais (2) e Pará (4).
A já esperada discussão, por se tratar de matéria federativa e, portanto, suprapartidária, alterou os ânimos e levou pelo menos 20 dos 62 senadores que votaram na matéria à tribuna do plenário além das manifestações feitas fora da tribuna. O bate-boca foi semelhante ao ocorrido em outras questões em que os interesses dos partidos se sobrepuseram a dos Estados representados pelos senadores, como nas votações da distribuição dos royalties e do Fundo de Participação dos Estados (FPE).
Os defensores da decisão do TSE argumentaram que, em 1993, foi aprovada uma lei complementar na qual o Congresso delegou ao Tribunal Eleitoral a prerrogativa de fazer essa recontagem. Até mesmo parlamentares de Estados não atingidos pela resolução usaram esse argumento. "Hoje um decreto legislativo suspendendo uma decisão do TSE é tão drástico, mas a interpretação da Constituição não é só jurídica, é jurídico-política", destacou o ex-procurador da República, Pedro Taques (PDT-MT).
A discussão levou até o senador Jader Barbalho (PMDB-PA), que não costuma fazer uso da palavra com frequência no plenário, à tribuna para criticar a derrubada de uma determinação da Justiça. "O Senado não pode se dar ao direito de cometer uma violência jurídica que é essa afronta ao poder Judiciário." Para ele, a aprovação do decreto abre um precedente "grave". "A partir desse momento, qualquer matéria decidida pelo poder Judiciário, poderemos aqui apresentar uma medida legislativa no sentido de sustar a decisão".
A tese vencedora, dos Estados que perderam cadeiras, baseia-se na Constituição que delega a prerrogativa do recálculo de deputados ao Congresso. "A nossa Constituição prevê que o Congresso pode delegar poder ao Executivo, mas não há precedentes de que o Congresso possa delegar poderes ao Judiciário", argumentou o senador Cássio Cunha Lima (PSDB), da Paraíba, Estado que deve perder, segundo a Corte Eleitoral, duas vagas. "No exercício da nossa autonomia, não podemos prescindir de zelar por esse apelo da nossa autonomia", destacou o presidente da CCJ, Vital do Rêgo (PMDB-PB). O projeto de decreto legislativo foi aprovado em maio pela comissão.
Sobre o requerimento, rejeitado por 11 votos de diferença, para devolver o projeto de decreto legislativo para comissões temáticas, Cássio disse que se tratava de mandar a proposta para um "passeio", já que o pedido era para análise da Comissão de Desenvolvimento Regional e Turismo (CDR).
Briga de poder
Existe, em outra frente, num ataque direto ao Judiciário, a intenção dos senadores de fazer valer a prerrogativa constitucional de o Congresso definir o número de deputados. Há meses, está na pauta da CCJ um projeto de lei complementar que trata da redefinição das bancadas de deputados federais, estaduais e distritais. Os defensores têm pressionado os demais colegas a votar a matéria, hoje retirada de pauta mais uma vez durante a reunião.
Caso aprovada, a proposta muda a cara da Câmara já para a próxima legislatura, com consequências semelhantes à da decisão do TSE. O projeto reduz os ganhos do Ceará, que passaria a ter apenas mais uma cadeira, e aumenta os do Amazonas, que ganharia dois lugares.
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