Peso político explica por que o tratamento é desigual
A diferença no tratamento dado às contas das prefeituras e do governo estadual se deve, principalmente, ao relacionamento político com o Tribunal de Contas (TC). Essa é a avaliação do professor de administração da Uninter e especialista em finanças públicas, Gutemberg Ribeiro. "O ideal é que não acontecesse, mas o viés político para não ter rusga entre os poderes faz com que as contas sejam aprovadas com restrições", explica. No plano municipal, os prefeitos não têm tanta influência. Isso ocorre pela forma como se estrutura o TC, explica o professor. Parte dos conselheiros é indicado pelo próprio governador e parte pela Assembleia Legislativa, que costuma ter maioria governista.
Ribeiro afirma que é preciso encontrar um meio termo: o TC não pode nem ser tão rigoroso com os municípios e nem tão complacente com o estado. "Não acho que a solução seja flexibilizar a fiscalização [para os municípios]. Com o tempo, a tendência é que nos tornemos mais conhecedores da fiscalização e encontremos um meio termo."
Imprescindível
Presidente da Comissão de Gestão Pública da Ordem dos Advogados do Paraná (OAB-PR), Luciano Elias Reis diz que investir o mínimo em saúde é imprescindível e deve ser respeitado "sob pena de afronta à Constituição". "A falta de investimento em tais áreas essenciais são sensivelmente sentidas pela sociedade. É bom destacar que não basta investir, mas tem que investir com qualidade e eficiência", pontua.
Reis relativiza a suposta disparidade de tratamento de municípios e estados levando em conta as características próprias de cada ente. "Os Tribunais de Contas devem sopesar o tamanho, a arrecadação, as dificuldades de investimentos, dentre outros aspectos." Ele afirma ainda que o tribunal deve evitar penalidades em casos em que o gestor tenha tido boa-fé, optando por outros recursos, como assinatura de termos de ajustamento de conduta.
3 prefeituras paranaenses tiveram contas de saúde reprovadas por não investir o mínimo em saúde ao mesmo tempo em que a contabilidade do governo do estado era aprovada sem o cumprimento da lei.
O governo do Paraná investiu em saúde menos do que manda a Constituição em oito dos últimos 12 anos.â Mas âo Tribunal de Contas do Estado (TC) nunca reprovou o descumprimento da legislação pelo governador; apenas fez ressalvas e recomendou que o investimento fosse ampliado no futuro. Ao mesmo tempo, pelo menos três municípios paranaenses tiveram contas reprovadas pelo TC nos últimos anos âjustamente por não terem aplicado o mínimoâ constitucionalâ nessa área.
INFOGRÁFICO: Veja como foi o investimento em saúde no Paraná nos últimos 12 anos
O investimento abaixo do previsto ocorreu em todos os últimos governos paranaenses. Desde 2002, é obrigação dos estados investir ao menos 12% da arrecadação anual na área da saúde. A variação nos investimentos no Paraná foi de 8,3%, em 2011, ao máximo de 12,54%, em 2009. O mínimo de 12% só foi ultrapassado em quatro anos (2006, 2008, 2009 e 2010).
Já os municípios devem aplicar 15% do arrecadado. Em 2010, Curiúva, no Norte Pioneiro, investiu 14,85%. Santo Antônio da Platina, também na mesma região, investiu 14,5% em 2008. Guaraqueçaba, no Litoral, em 2012 destinou 14,02% para a saúde. Nos três casos, o TC julgou irregulares das contas dos prefeitos da época.
O rigor no julgamento das contas dos municípios vem causando atritos com os prefeitos. No começo deste mês, eles foram em grupo à Assembleia Legislativa para pressionar o presidente da Casa, deputado Valdir Rossoni (PSDB), a colocar em votação um projeto de lei que coloque limites na atuação do TC. A alegação é que algumas reprovações de contas vêm por motivos supostamente pequenos, como falta de assinaturas em documentos ou erros em cálculos. Com a reprovação das contas, o TC aplica multas e os gestores podem se tornar fichas-sujas condição que os impede de concorrer em eleições.
Os limites de investimento foram estabelecidos em 2002 por uma portaria do Ministério da Saúde, que estipulou os porcentuais mínimos. A previsão vinha desde a âConstituição de 1988 que, porém, não fixou parâmetros. Essa mesma portaria permitia queâ os estados com baixo investimento em saúde aumentassem a destinação gradualmente até chegar aos 12% em 2004. Ainda assim, o Paraná só atingiu o patamar em 2006.
Os relatórios do TC da época âcitavam que o tribunal não era obrigado a reprovar as contas do governo até que os limites de investimento fossem regulamentados por uma lei, e não só por uma portaria. Isso só ocorreu em 2012, quando passou a valer a Lei Complementar 141.
Outro lado
âO TC informou que não vai se posicionar sobre o assunto. A Secretaria Estadual da Saúde prometeu que, neste ano, a meta será alcançada, contemplando ainda o que faltou para atingir os 12% em 2013.
A prefeitura de Curiúva informa que atualmente investe "mais que o mínimo" no setor. A Secretaria de Saúde de Santo Antonio da Platina diz que em 2013 o investimento foi de 18%. A reportagem entrou em contato com a prefeitura de Guaraqueçaba, que não respondeu até o fechamento desta edição.
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