O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União investiga a suspeita de que a Petrobras tenha aceitado tomar prejuízo em um contrato com a estatal boliviana YPFB. A manobra permitiria repasse maior de dinheiro ao país vizinho, governado por Evo Morales, um aliado ideológico do PT.
O MP aponta o ex-presidente da estatal José Sergio Gabrielli como responsável por um possível dano ao erário federal causado pela decisão. Mas quer que o TCU avalie se houve, de fato, prejuízo. O tribunal avaliará também quais as outras pessoas e instâncias da empresa responsáveis por aprovar um aditivo contratual que permitiu aos bolivianos diminuir o potencial calorífico mínimo do gás entregue diariamente pela YPFB à empresa brasileira. "É imperativo averiguar o fato de a repactuação estar fora das práticas da indústria do petróleo e de não gerar aparentemente nenhuma vantagem para a empresa brasileira", escreveu o procurador Júlio Marcelo de Oliveira, autor da representação entregue na sexta-feira. "É natural inferir que a repactuação, por conta da mudança do teor calorífico do gás, possa ser um acordo subreptício para majorar o valor efetivamente pago pela Petrobrás em razão do contrato", argumentou Oliveira.
A mudança foi feita em dezembro de 2009 em um contrato assinado entre Petrobrás e YPFB em agosto de 1996 para fornecimento de gás à estatal brasileira. O acordo original, relatou o procurador, estabelecia a compra de uma quantidade diária de gás com poder calorífico de 9.200 kilocalorias (kcal) por metro cúbico. Com a alteração, "sem explicação aparente", esse valor caiu para 8.200 kcal por metro cúbico.
Em outubro, esse mesmo contrato já havia chamado a atenção do Ministério Público por causa de outra modificação. Na ocasião, Oliveira pediu uma auditoria para apurar possível dano ao erário motivado pelo pagamento de US$ 434 milhões extras pelo fornecimento de gás boliviano.
O acréscimo foi justificado como "indenização" por componentes nobres misturados ao gás entregue à Petrobrás pela correspondente boliviana. Agora, por causa do aditivo, o procurador desconfia que pode ter havido um prejuízo ainda maior à estatal e ao País.
Em andamento
A apuração solicitada em outubro já começou e segue em andamento, informou a assessoria do TCU. Com a nova representação relacionada ao aditivo, essa investigação deve ter seu foco ampliado. A unidade do TCU responsável por conduzir a auditoria é a Secretaria de Controle Externo da Administração Indireta no Rio de Janeiro (SecexEstat), que produzirá um relatório a ser entregue ao relator, Vital do Rêgo, que sucedeu a José Jorge no TCU.
Na representação de outubro, Oliveira anexou reportagens sobre a atuação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em favor da indenização reivindicada pelo colega Evo Morales em 2007. Apontou também a ausência de justificativas técnicas para o aumento do valor.
O reajuste foi polêmico principalmente por causa da dúvida a respeito do aproveitamento das frações nobres - propano, butano e gasolina natural - escoadas pelo gasoduto Brasil-Bolívia com o gás natural. Em princípio, eles poderiam ser usados na indústria petroquímica. Mas, para isso, o Brasil teria de instalar, no curso do gasoduto, uma planta para separá-los e organizar um setor de venda específica das frações nobres. Essas unidades separadoras jamais foram instaladas. "A Petrobrás estaria, pois, remunerando a Bolívia por algo que não teria nenhuma utilidade econômica para suas atividades", escreveu.
Procurada pela reportagem, a Petrobrás não se pronunciou sobre o caso.
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