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Enquanto o Senado não instala a CPI das ONGs – mais de nove meses depois da apresentação do primeiro requerimento –, o Tribunal de Contas da União (TCU) tem em andamento 42 processos de investigação sobre convênios públicos com as organizações não-governamentais (ONGs).

Além disso, somente em 2007, o tribunal já condenou a multas ou determinou investigações mais detalhadas em 13 casos de contratos públicos com entidades do tipo.

Ministério criou novas regras para repasses

De acordo com o ministro do TCU Marcos Bemquerer Costa, pela quantidade de organizações que recebem recursos federais no país – são cerca de 30 mil convênios firmados por ano – o número de processos em andamento ou condenações não é expressivo, mas mostra um grave problema no repasse das verbas públicas.

"O principal problema está na hora de definir quais ONGs receberão o dinheiro. Há problemas na apresentação dos projetos, eles vêm deficientes, e um ministério, por exemplo, aceita seu planejamento. Depois, fica difícil verificar se os recursos foram aplicados para os fins corretos", explica Bemquerer Costa.

A diretora executiva da Associação Brasileira das Organizações Não-Governamentais (Abong), Tatiana Dahmer, afirma que o número de processos registrados atualmente é pequeno se comparado à quantidade de ONGs existentes no Brasil. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2002 apontaram existência de 275 mil entidades, mas ela estima que os números atuais cheguem a 500 mil.

"Se você for ver, é um número pequeno de escândalos envolvendo ONGs. Muitas pessoas imaginam que todas as entidades são irregulares, que nós gostamos de mamar nas tetas do governo. Mas a grande maioria é séria", diz.

Segundo a diretora, grande parte dos processos envolvendo convênios com ONGs se deve à burocracia da prestação de contas. "As exigências dos convênios são feitas para o Sudeste. Imagine uma entidade que atua com indígenas. Não tem nota fiscal e CNPJ no meio da selva para comprovar gastos."

Bemquerer Costa concordou que as normas são rígidas. "Realmente, existe esse problema. Conversamos com a Abong sobre isso e já estamos analisando a questão. A complexidade da prestação de contas e a falta de experiência de muitas entidades com o assunto é um dos fatores. Agora, muitas falhas das prestações de contas ocorrem porque quem faz a análise para o repasse dos recursos não avalia se a ONG tem condições de receber e prestar contas da verba."

O Ministério do Planejamento informou que os questionamentos feitos pelo TCU foram contemplados pelo decreto 6.170, publicado no dia 25 de julho deste ano. O decreto contém novas regras para o repasse de recursos da União para Estados, municípios e entidades privadas.

Estudo

Em um documento divulgado pelo TCU no fim do ano passado sobre contratos federais com ONGs, do qual Bemquerer Costa foi relator, o tribunal investigou 28 convênios e detectou irregularidades em 15 deles. Os recursos repassados a essas entidades representaram mais de R$ 82 milhões.

Após o estudo, o TCU determinou que o Ministério do Planejamento apresentasse em seis meses projeto para implementação de um sistema on-line que permitisse o acompanhamento de todos os convênios. Segundo o tribunal, o projeto foi apresentado no prazo, mas está em fase de ajustes. O portal deve ser implantado até o fim deste ano.

O ministro Marcos Bemquerer Costa explicou ainda que um monitoramento dos convênios já verificados será feito em três etapas; a primeira delas deve ocorrer até o fim de 2007. "Vou relatar o monitoramento e a partir daí vamos averiguar se houve melhoria na transparência do repasse." O resultado só será divulgado no começo de 2008.

Repasses

Segundo dados da Controladoria-geral da União (CGU), desde 1999 o governo federal já repassou R$ 48,02 bilhões para ONGs. Os números mostram que o montante concedido no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006), R$ 19,98 bilhões, é menor que o repassado no segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (1999-2002): R$ 28,04 bilhões.

"Excluindo certas entidades que não executam propriamente programas de governo, como fundações de apoio de universidades federais, Apaes, os números (de repasse de verbas) caem. Mas a queda em relação ao exercício anterior também se mantém", informa em nota o ministro da CGU, Jorge Hage.

De acordo com Hage, a Controladoria está desenvolvendo um amplo programa de fiscalização sobre repasses de recursos a aproximadamente 320 ONGs – as 20 que mais receberam recursos entre 1999 e 2006; cerca de 120 entidades que receberam entre R$ 2 milhões e R$ 10 milhões no mesmo período; e cerca de 180 que receberam entre R$ 200 mil e R$ 2 milhões. Um resultado preliminar da fiscalização, no entanto, só será divulgado em dois meses.

Segundo o ministro do TCU Marcos Bemquerer Costa, a queda anual ocorre porque o governo mudou sua forma de repassar verbas para entidades nos últimos anos.

"Alguns repasses que antes ocorriam diretamente, agora vão por meio de fundos, como o Fundeb (Fundo Nacional de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica), e saem da estatística. Não acredito que os repasses para ONGs tenham caído, muito pelo contrário."

Tatiana Dahmer, da Abong, por sua vez, avalia que os recursos federais para as ONGs se reduzem ano a ano por conta da burocracia. "Não tem mais ou menos facilidade agora do que antes. É que a burocracia vai tornando os convênios cada vez mais difíceis."

Regulamentação

Tatiana afirma que são necessárias uma regulamentação para os repasses governamentais para ONGs e a redução da burocracia para o setor.

"Não tem facilidade para receber recursos. Quando tem facilidade é porque há conivência do poder público para desvio de verbas. Não é uma festa como muitos pensam, é difícil ter acesso", disse. Segundo a diretora, muitas ONGs são abertas com intuito único de desvio de verbas, com a convivência e até participação de políticos.

O ministro do TCU Marcos Bemquerer Costa admitiu que na auditoria realizada no fim de 2006 foram detectadas várias situações em que pode ter havido corrupção.

"Há casos de dinheiro repassado para ONG que só foi criada uma semana depois. Outra que recebeu milhões três semanas após a criação. Mas em nenhum dos casos foi comprovada má fé. Não sabemos se houve descuido ou se houve a intenção de desviar recursos. Isso precisaria de uma análise mais profunda."

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