A exploração do trabalho infantil não é fenômeno recente, diz a doutora em Direito Marta Marília Tonin, presidente da Comissão da Criança e do Adolescente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). "Em todos os tempos a criança participou da economia familiar, especialmente das atividades agrícolas", observa. Fora do círculo familiar era tratada como mão-de-obra identificada ou vista como mercadoria. No primeiro caso, usada nos ofícios domésticos e como aprendizes alugados na Idade Média; no segundo, como pequenos escravos na época dos povos greco-romanos da Antiguidade.

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Segundo Marta, a indústria do século 19 também recorreu à mão-de-obra infantil na Europa e nos Estados Unidos. Na sociedade européia isso era comum até um século atrás, mas as reformas sociais ajudaram a reduzir o problema. Ao longo da história, as crianças que trabalham são sempre as pobres. "É a necessidade que as conduz ao trabalho", constata. Na avaliação da advogada, a história também guarda semelhanças com a nossa época: todas as formas de trabalho do passado, dentro ou fora da esfera familiar, encontram um equivalente atual, isto é, a gestão cotidiana da pobreza dentro das famílias.

A discussão em torno da erradicação do trabalho infantil tem crescido, mas isso não deve pôr fim ao problema tão cedo. "Porque a pobreza não cessa de se alastrar pelo mundo", observa Marta. "Neste panorama, há que se mobilizar os agentes sociais e políticos acerca do cumprimento do princípio constitucional da prioridade absoluta nas políticas públicas para a área da infância", diz. Mas esta é apenas uma etapa, pois eliminar esse tipo de exploração significa acionar os níveis sociais mais profundos.

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Os países pobres terão capacidade de se desenvolver sem uma intervenção social igual àquela do estado na Europa dos séculos 19 e 20? Eis a grande questão na avaliação da advogada. Seguindo a lógica da concorrência econômica mundial, eles precisam baixos custos sociais para se desenvolver. Marta conclui que não é a concorrência dos indivíduos entre si que permite entrar no círculo do desenvolvimento, mas, ao contrário, a tomada de decisões de políticas de educação e da redução das desigualdades. "Na verdade, a erradicação do ‘trabalho’ infantil traduz uma questão primordial, que ultrapassa o quadro dos países em desenvolvimento: que visão social nós queremos deixar para o planeta?" (M.K.)