Um outdoor instalado na Marginal Tietê, bem perto da maior rodoviária de São Paulo, denuncia: o tráfico de animais silvestres na cidade preocupa. O outdoor é um apelo da viação Itapemirim, numa parceria com a organização não-governamental Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (Renctas), para que as pessoas denunciem a presença de animais no bagageiro de ônibus interestaduais, já que as empresas não podem, por lei, vistoriar os pertences de seus clientes.
Os números da Polícia Ambiental paulista indicam que o problema é crescente. As apreensões aumentaram quase 50% entre 2004 e 2005 apenas na Grande São Paulo, e passaram de 4.259 para 6.264. Se considerado todo o estado, a alta foi de 37% e o número de animais saltou de 18.217 para 25.111 em dois anos. Na avaliação do tenente Marcelo Robis Francisco, da Polícia Ambiental, as apreensões aumentaram porque mais animais silvestres estão sendo trazidos de outros estados para serem vendidos na cidade ou, também, exportados.
Aos olhos leigos, o tráfico de animais parece só um trabalho de formiguinha de muita gente, que caça bichos nas matas para ganhar um dinheiro nos grandes centros. Mas não é bem assim. O tráfico de animais é também um subproduto vendido junto com drogas e armas ilegais e até pedras preciosas, delitos de gente grande. Mas quem é pego com animais silvestres tem tratamento de crime pequeno perante a lei. Até 1998, o crime era inafiançável. Desde então, passou a ser crime de menor potencial ofensivo, com pena máxima de 2 anos de prisão que ainda pode deixar de ser aplicada pela Justiça e substituída, por exemplo, por doação de cestas básicas. Na delegacia, não cabe lavrar Boletim de Ocorrência, só termo circunstanciado.
- Normalmente, onde tem bicho, se vasculhar, vai achar arma e droga também - diz o tenente.
Em janeiro passado, a Polícia Ambiental recebeu denúncia de que um hóspede de uma pousada na cidade de Aparecida estava transportando pássaros. Com ele foram encontrados 16 canários da terra, 10 canários da terra peruanos e um canário do reino. Mesmo tendo uma documentação do Instituto do Meio Ambiente (Ibama) que permitiriam o transporte das aves, ele tentou soltar algumas pela janela. Desconfiados, os policiais vasculharam o quarto e acharam uma pistola 380, revólver calibre 38, dois Speed Louder e um porta Speed Louder com 18 cartuchos intactos de calibre 38. Nenhuma das armas tinha documentação. Em outubro do ano passado, a Polícia Militar Ambiental apreendeu no Morumbi, zona sul da capital, sete araras e um papagaio junto com um arsenal de armamentos e munições de uso restrito das Forças Armadas.
Desde 9 de janeiro último as multas aumentaram. O valor é de R$ 523 por animal não ameaçado de extinção. Se estiver ameaçado, paga mais R$ 3.665. Se estiver ameaçado e incluído na convenção internacional de preservação de espécies o valor chega a R$ 5.769. O teto de multa no estado de São Paulo é de R$ 150 mil. Ou seja, desse valor não passa.
Em São Paulo, sabe-se por um levantamento da Renctas que os maiores pontos de venda estão na Grande São Paulo (capital, Guarulhos, Francisco Morato, São Bernardo do Campo e Diadema) e na cidade de Jundiaí, na região de Campinas. Na rota do tráfico estão também cidades como Santa Rita do Passa Quatro e Arthur Nogueira, que ficam à beira da Rodovia Anhangüera, que liga a capital ao Triângulo Mineiro.
Mas a lógica é a mesma do tráfico de drogas. Se tem quem vende é porque tem quem compre. E é aí que reside o 'jeitinho brasileiro' de tapar o sol com a peneira. Como sentir-se culpado o cidadão que quer apenas um Azulão cantando no amanhecer para lhe alegrar o dia?
- Dos animais capturados ilegalmente, 60% ficam no país e 40% são exportados. São estruturas profissionais, não é coisa de amador - afirma Dener Giovanini, presidente da Renctas.
São Paulo é receptor, mas também aqui se faz captura. O Azulão que canta na gaiola de moradores da mais rica cidade do país é um pássaro ameaçado de extinção e endêmico do interior do estado. Na Mata Atlântica preservada paulista - ou o que restou dela - estão alguns dos bichos que atraem os olhos dos traficantes. Também são do próprio estado o papagaio de cara roxa e o chauá, que vivem na região de Bertioga.
E o que dirão os cidadãos sobre aquele divertido papagaio que repete gracejos e só de abrir a boca já faz a criançada rir? Custa entre R$ 50 e R$ 100 no mercado negro. Francisco, da Polícia Ambiental, diz que, se não houver crime e o bicho for totalmente legalizado, nascido em criadouro oficial, o preço chega a R$ 1.000. E a diversão fica cara.
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