A presença do advogado Ricardo Salles no posto de secretário particular do governador Geraldo Alckmin gerou mal-estar entre integrantes do governo paulista e do PSDB. As declarações de Salles questionando a existência de crimes cometidos por militares durante a ditadura foram criticadas na quarta-feira por tucanos que combateram o regime, e criaram desconforto em relação à permanência do advogado no cargo.
Membros do partido disseram discordar das opiniões de Salles a respeito da ditadura, feitas no ano passado em comemoração ao golpe de 1964 no Clube Militar. As afirmações foram reveladas na terça-feira (02) pelo jornal O Estado de S. Paulo em reportagem sobre sua participação na cerimônia de abertura do acesso eletrônico a documentos do antigo Departamento de Ordem Pública e Social (Dops) - espécie de central de repressão da ditadura.
Salles, advogado e fundador do Movimento Endireita Brasil (MEB), é um crítico da Comissão da Verdade e já disse em entrevista que "felizmente tivemos uma ditadura de direita no Brasil". "Não vamos ver generais e coronéis, acima dos 80 anos, presos por causa dos crimes de 64. Se é que esses crimes ocorreram", declarou o advogado, no evento do Clube Militar.
Para o senador tucano Aloysio Nunes Ferreira (SP), que lutou na clandestinidade contra a ditadura, Alckmin deve ter motivos para ter nomeado Salles secretário particular. No entanto, destacou que o fundador do MEB vê a história brasileira sob uma ótica "muito diferente" da sua: "Discordo quando se tenta negar a existência de violações aos direitos humanos".
O ex-governador Alberto Goldman também não questionou a indicação de Salles para o posto, feita por Alckmin em março, mas disse que falta conhecimento de história ao advogado. "No mínimo, ele desconhece a história brasileira", afirmou o tucano, que foi filiado ao PCB enquanto o partido estava na clandestinidade.
Dois secretários do governo paulista que combateram a ditadura também atacaram as declarações de Salles e a manutenção dele no cargo. Para eles, o assessor joga contra o esforço de Alckmin em contribuir para esclarecer o período da repressão.
Ontem, o escritor e colunista do Estado Marcelo Rubens Paiva pediu a Alckmin uma retratação a respeito das declarações de seu secretário, responsável por cuidar da agenda do governador. O escritor é filho do deputado Rubens Paiva, morto sob tortura pelo governo militar em 1971.
"Sim, esses crimes ocorreram. Nem precisamos citar a extensa biografia a respeito, nem os testemunhos colhidos há décadas, no projeto Tortura Nunca Mais, da Igreja", afirmou Paiva. "Sou testemunha viva. Eu e minhas irmãs. Vimos meu pai, minha mãe e irmã Eliana serem levados."
Para Belisário dos Santos Jr., ex-secretário de Justiça de São Paulo na gestão Mário Covas, a declaração de Salles revela uma tentativa de esconder fatos da ditadura e justifica a existência da Comissão da Verdade - "uma comissão que apure esses fatos e faça a publicidade do que apurou".
"Respeito a opinião dele, mas sei aonde isso leva e tenho medo de aonde isso leva. As pessoas que negavam a tortura passam a admiti-la e a justificá-la", disse Belisário. "Mas a tortura é injustificável", declarou. "É evidente que tivemos no Brasil um período autoritário", afirmou o ex-deputado Arnaldo Madeira, que foi secretário da Casa Civil de Alckmin.
Procurado, o Palácio dos Bandeirantes disse que não iria comentar as declarações de Salles, por se tratarem de opiniões de cunho particular que não refletem a posição do governo. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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