Quando Marcelo Odebrecht foi preso há quase um ano – a se completar domingo que vem, dia 19 – seu comportamento era exemplo daquilo que, desde o início da Lava Jato, mais desagradava à força-tarefa quando tinha que lidar com a Odebrecht: ele demonstrava arrogância e prepotência. No avião de São Paulo para Curitiba, quis viajar ao lado de um colega de empresa, também levado por policiais federais naquela sexta-feira.
“Parecia que não tinha entendido que estava preso. A ficha só foi cair meses depois”, conta um dos delegados federais que acompanham sua rotina desde então.
Em depoimento à CPI da Petrobras, Marcelo desobedeceu advogados e disse não respeitar “dedo-duro”, numa crítica ao instituto da delação premiada. Dias depois enfrentou o juiz da 13ª Vara Federal, Sergio Moro, se recusando a responder perguntas em sua primeira audiência na Justiça e apresentando um inédito “autodepoimento”.
O Marcelo que hoje frequenta a carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, é outro: aparente humildade, cabeça baixa e braços para trás são hábitos que parece ter incorporado, conta quem viu o antes e depois da prisão. Leva uma pastinha com suas anotações embaixo do braço, com detalhes de sua tentativa de colaboração. Até os mais sensíveis à agressividade da estratégia da Odebrecht no início da Lava Jato (a empresa negava ter feito pagamentos no exterior, apesar das evidências) admitem a resiliência.
“Ele agora me parece mais humano, aliviado até certo ponto. Consciente do que de fato ocorre e de que aquilo que tinha por certo e como apenas uma estratégia empresarial, na verdade, eram condutas ilícitas que terão consequência”, conta outro delegado.
A rotina do herdeiro da Odebrecht na carceragem inclui acordar às 5h para fazer exercícios com um step (o “clap, clap” do sobe e desce no equipamento é motivo de queixa). Durante o dia, qualquer hora é hora de fazer flexões. De três em três horas, come uma barrinha de cereal.
O ex-aluno do mestrado da escola de negócios suíça IMD, uma das quatro melhores do mundo, dividiu nas últimas semanas cela com o traficante Paulo Cézar Flores dos Santos, preso tentando transportar pasta base de cocaína do Mato Grosso do Sul para São José dos Pinhais (PR). “Não há elemento que indique que o investigado, em liberdade, não encontrará os mesmos estímulos para a reiteração criminosa”, escreveu a juíza paranaense Ângela Regina Ramina de Lucca, ao defender a manutenção da prisão do traficante.
Buscar reerguer a empresa que sua família fundou sem reincidir no pagamento de propinas é o que promete Marcelo, por meio de seus advogados. Até agora, apenas seus seus defensores trataram com os negociadores da força tarefa de sua proposta de colaboração, que obrigatoriamente vai sendo ampliada a cada sinalização do outro lado do balcão de que os dados entregues não são suficientes.
Na carceragem, uma das visitas mais frequentes é da irmã, que tem livre trânsito para estar com ele por sua condição de advogada. É ela quem leva e traz a pasta com a versões para proposta de colaboração. A negociação é conduzida com participação da Procuradoria-Geral da República (PGR), tendo em vista a extensa lista de políticos com foro privilegiado do cardápio da Odebrecht.
Só haverá acordo se Marcelo explicitar a razão de cada transferência para conta – ou bolso – de agente público. Ou seja, será preciso dizer especificamente o que a empresa ganhou dos políticos que beneficiou.
Antes de ser preso, em abril, Marcelo redigiu carta aos comandados dizendo ter sido educado “em padrões rigorosos e com valores definidos e edificantes”. Criticou o “denuncismo vazio” da Lava Jato e estimulou o combate às “mentiras na origem”. No dia seguinte à prisão, seu pai, Emílio, escreveu pedindo “união” e apoio às famílias dos dirigentes presos. Na carta desta semana, o sucessor de Marcelo, Newton de Souza, admitiu “falhas” por “termos acatado o convívio com práticas incompatíveis com padrões de governança”. “Vamos virar essa página”, anotou.
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