Passos firmes e sorriso no rosto. Nem parece o homem que 34 dias atrás enfrentou uma das mais longas e complexas cirurgias da medicina. O vice-presidente José Alencar está em recuperação pela nona vez.
"Eu estou me sentindo bem. Eu ainda tenho um pouco de cansaço, esse cansaço vem de várias fontes, uma delas é o próprio tratamento porque a quimioterapia traz diversos efeitos colaterais, entre eles está esse, o de maior cansaço. Mas estou me sentindo um pouco melhor", disse Alencar em entrevista.
Há pouco mais de onze anos, José Alencar luta pela vida. Foi em um exame de rotina que o vice-presidente descobriu os primeiros tumores malignos, em 1997. O rim direito e dois terços do estômago foram retirados.
Cinco anos depois, outro tumor, dessa vez na próstata, que foi removida. Em julho de 2006, um sarcoma, um tumor maligno, apareceu no abdômen. Apesar de removido, o tumor voltou quatro meses depois.
Em 2007, o vice-presidente foi operado outra vez. Mais um ano e o sarcoma voltou a se formar. Pela oitava vez, José Alencar foi para a mesa de cirurgia.
Cirurgia complexa
No mês passado, os exames revelaram que o tumor continuava crescendo no abdômen. A alternativa apresentada pelos médicos: uma cirurgia radical e complexa, a mais longa e difícil na vida do vice-presidente.
"Não foi nenhum heroísmo não, porque eu tinha que tomar essa decisão, eu não tinha outra. Porque eu não podia escolher operar ou não operar. Eu tinha que operar, então não foi nenhuma decisão corajosa, foi uma decisão lógica, eu tinha que me operar", ressaltou. "Eu não estou habituado às coisas fáceis. Eu sempre me deparei na vida com problemas difíceis e nunca deixei de enfrentá-los."
O vice-presidente sempre discutiu abertamente as alternativas com a equipe médica. Ele sabia que corria um alto risco de morrer na operação. E até assinou um documento autorizando todos os procedimentos necessários.
"Eu não tenho medo da morte, tenho medo da desonra. A morte é um fenômeno natural, assim como você nasce você vai morrer um dia, isso não tem que pensar nisso de forma alguma. E você vai viver o tempo que Deus quiser que você viva", frisou.
"Eu não posso de forma alguma pensar que vai acontecer alguma coisa comigo sem que Deus queira. E, se Deus quiser inclusive que eu morra, é porque vai ser bom para mim, porque Deus não faz nada ruim contra ninguém", afirmou Alencar. A caminho da cirurgia, ainda não totalmente sedado, José Alencar percebeu uma certa apreensão na equipe. E reuniu o que ainda tinha de forças para chamar a atenção dos médicos.
"Mas o que está havendo, vocês estão desanimados? Aqui não há lugar para desanimo não. Vamos todos com fé e coragem e com ânimo, porque nós não podemos recuar da operação", lembrou o vice-presidente.
O médico Ademar Lopes, com 31 anos de experiência e mais de 8 mil cirurgias de tumores, chefiou uma equipe de 12 pessoas.
Duas etapas
A cirurgia era complexa, e o corte foi feito em duas etapas: um de cima para baixo, de cerca de 30 centímetros, e outro da esquerda para a direita, do umbigo até as costas, na coluna vertebral.
Para facilitar o trabalho, o vice-presidente foi colocado ligeiramente inclinado para a direita. Ao abrir o abdômen, o cirurgião viu que, de fato, o câncer ocupava quase todo o lado esquerdo. Ele encontrou e retirou dez pequenos tumores.
Depois, o médico deslocou o único rim do vice-presidente e começou a remover o tumor principal. Comprometidas por causa da doença, partes dos intestinos grosso e delgado e do ureter - o canal que liga o rim à bexiga - foram retiradas. Os médicos refizeram o canal com tecido do intestino delgado.
Dez horas depois, a parte mais delicada e complexa: o tumor havia tomado toda a região dos vasos ilíacos, responsáveis por levar sangue à bacia e às pernas. Por menor que fosse, qualquer imprecisão com o bisturi poderia provocar uma hemorragia irreversível. Essa região é chamada pelos cirurgiões como "o ponto da morte".
"São veias de grosso calibre e quando aquilo sangra, sangra muito, e muitas vezes isso nos dá medo. Nessa hora seria até muito cômodo parar e voltar, mas aí vem a responsabilidade do cirurgião oncologista. Voltar seria depois dizer ao vice-presidente e à sua família que nós não tiramos todo o tumor. Mas notícia para ele seria desastrosa", diz o cirurgião.
Por fim, durante mais uma hora e meia, os médicos adotaram um procedimento poucas vezes feito no Brasil: a quimioterapia hipertérmica. Todo o abdômen foi lavado com o próprio medicamento a uma temperatura de 42 graus. Nessa temperatura, aumentam as chances de o remédio matar as células do tumor.
Ajuda
Foram quase dezoito horas na mesa de operação. Quem não saiu do lado dele durante todo esse drama foi dona Marisa, sua mulher há 51 anos. Uma força que evita algumas travessuras.
"Ajuda até muito, que às vezes atrapalha de tanto que ajuda, porque não me deixa fazer nada. Por exemplo, porque não me deixa tomar um gole. Mas eu já posso, já tem 30 dias a operação", diz o vice-presidente. "Eu posso, mas eles falam que eu não posso por enquanto."
Na luta contra a doença, José Alencar descobriu que a torcida por ele vai além da família. "Os brasileiros todos têm me ajudado muito porque o que eles torcem por mim me deixa emocionado. Determinadas mensagens que eu recebo me deixam emocionado, são pessoas que moram longe nesse Brasil enorme."
Ele agradece a Deus e não pede nada. "Deus não deve, e nem eu quero que Ele me dê nem um dia de vida a mais de que não possa me orgulhar. Se Deus achar que a minha vida possa ser útil e me dê mais um dia de vida, eu fico naturalmente reconhecido e vou procurar fazer que esse dia seja útil", ressaltou.
Quando perguntando do que espera da vida daqui para frente, Alencar responde: "Espero legar uma herança da qual seus herdeiros possam se orgulhar. Mais nada."
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