Cheguei a achar que a ex-presidente não responderia às afirmações do General Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional, sobre sua relação com a inteligência. Óbvio que sabíamos de qual “inteligência” ele falava, mas foi inevitável que suas frases virassem memes e trocadilhos inspirados em sua conhecida fluência verbal. Mas Dilma Rousseff, com alguns dias de atraso, publicou em seu site uma resposta à frase “a senhora Rousseff não acreditava na inteligência”.
É uma resposta em dilmês: além de só confirmar o que o General disse, ainda tem uma mentira no meio para reforçar o ponto de vista.
Toda a resposta da ex-presidente é explicar por A mais B porque a frase do chefe do GSI é irretocável: ela realmente não acredita na inteligência brasileira e elenca diversos motivos que a levam a tal conclusão. Aliás, a frase final da resposta é a comprovação de que o General disse apenas a verdade: “Tais exemplos mostram que a inteligência do governo ainda não é credível”, escreveu Dilma Rousseff.
Não entendi bem por que logo no início a carta diz “Ex-presidentA rebate declarações do senhor Heleno”, mas é só mais uma entre as tantas informações de Dilma que eu não entendi. Já estou conformada com isso.
O outro detalhe é a história do “Senhor” Heleno, uma sutileza que eu não entendi, mas em que a ex-presidente tira a razão de Lula e Roberto Requião para dar ao ministro Sergio Moro, que reclamou quando, em depoimento, o ex-presidente chamou uma procuradora de “querida”. Oi? Como assim? Explico a salada:
Em setembro de 2017, quando prestou depoimento a Sergio Moro, o ex-presidente referiu-se a uma procuradora como “querida” e foi imediatamente interrompido pelo então juiz, que exigiu o tratamento correto, o uso do vocativo “senhora”. No meu entendimento, foi mais uma questão de compostura e menos de formalidade. Na época, os petistas enfiaram no armário a fantasia de feministas para defender o homem que chama mulher de “querida” em discussão séria. Nada de empoderamento para a procuradora.
Já quando se tratou do oposto, no dia em que o Ministério Público chamou o ex-presidente de “Senhor Luiz Inácio”, seu advogado contestou imediatamente. Sergio Moro foi coerente: exigiu também o tratamento adequado de “Senhor Ex-Presidente”.
Logo em seguida, o senador Roberto Requião, amigo da casa, apresentou o PSL 332/2017, mudando todos os pronomes de tratamento em vigor no Brasil. Ninguém mais seria chamado de excelência ou doutor, virariam todos “senhor” ou “senhora”. A justificativa é bonita: “verifica-se incabíveis em uma democracia a continuidade de tratamento procotolar herdado da monarquia, derrubada que foi há mais de 120 anos. Na democracia, todos são iguais, ou, pelo menos, deveriam ser. Dai por que o grande Ruy Barbosa, enaltecendo a pátria republicana, afirmou em célebre poema: ‘A pátria não é ninguém, são todos. É cada qual tem no seio dela o mesmo direito, a ideia, a palavra e a associação’.”
O que ocorreu agora? O General Heleno não seguiu o manual de Pronomes de Tratamento da Casa Civil, que dá ao presidente da República e aos generais uma espécie de paridade. Ambos são “Vossa Excelência”. Pois bem, em vez de dizer que “Sua Excelência” não acredita na inteligência ou usar a corruptela mais comum dos pronomes, colocando o vocativo “senhora ex-presidente” mesmo que ela não esteja presente, o chefe do GSI disse “senhora Dilma”.
Em sua resposta, Dilma revidou. Como o General também é da reserva – não exatamente como ela, que foi aposentada antecipadamente – resolveu fazer uma ironia dando a ele o mesmo vocativo, “senhor”, só que entre aspas, deixando claro que era uma alfinetada. Vejam o primeiro parágrafo da carta: “A “senhora Rousseff não acreditava na inteligência”. A declaração é do “senhor Heleno” ao assumir o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Tal afirmação vem sendo feita pelo “senhor Heleno” em todas entrevistas dadas à imprensa.”
Tomara que Roberto Requião não tenha visto essa barbaridade monárquica. Em seu projeto, ele classificava assim quem exige o uso dos pomposos pronomes de tratamento: “Se, por um lado, o título majestoso não confere virtude a ninguém (ainda que assim queiram os ditadores), por outro lado, exigir dos demais um tratamento diferenciado demonstra a falta de virtudes daquele que o exige.”
Por fim, há ainda a mentira pura e simples. “Houve falha, por exemplo, ao não detectar e impedir o grampo feito ilegalmente no meu gabinete, em março de 2016 – sem autorização do Supremo Tribunal Federal –, quando foi captado e divulgado meu diálogo com Luiz Inácio Lula da Silva, às vésperas dele ser nomeado para a Casa Civil”, diz a carta de Dilma Rousseff.
A ex-presidente mente quando diz que foi feito um grampo em seu gabinete sem autorização da Justiça. O grampo não estava lá, mas no telefone do ex-presidente Lula. Ao falar com ele, o grampeado, a presidente caiu no grampo.
O exemplo era desnecessário para o contexto descrito por Dilma Rousseff, uma coleção de falhas da inteligência brasileira. Não entendo o motivo de estar lá: amnésia, má-fé ou tentativa de repetir uma mentira até que se torne verdade. De qualquer forma, o documento é muito eficiente para comprovar que, sob a administração da petista, a inteligência brasileira realmente não funcionava.
Até a facada no presidente Jair Bolsonaro durante a campanha entrou na dança do elenco de fatos que indicam por que a ex-presidente não confia na inteligência brasileira.
Apenas uma dúvida não foi resolvida pela fala: durante os 6 anos em que esteve no poder, o que Dilma Rousseff, responsável maior pela inteligência brasileira, fez para sanar os defeitos que aponta e proteger a Soberania e a Segurança Nacional? Dilma Rousseff não precisa de inimigos. A carta que sai de sua própria assessoria é uma espécie de confissão de incompetência.
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