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O pedido de impeachment do prefeito do Rio de Janeiro, Marcelo Crivella (PRB), foi arquivado de modo até tranquilo para ele e sua base aliada: foram apenas 16 votos a favor da abertura do processo, e 29 contrários. No entanto, o arquivamento não determina o fim das discussões que envolvem o caso. E por três motivos: porque a situação ainda pode dar dores de cabeça ao prefeito, por reacender o debate sobre a relação entre política e religião e pelos possíveis impactos nas eleições de 2018.

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O processo foi motivado por promessas que Crivella fez a um grupo de pastores durante uma reunião na sede do Executivo municipal. O prefeito, que é bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, disse aos líderes religiosos que eles poderiam “furar a fila” de cirurgias na rede pública de saúde e também que os ajudaria na obtenção de isenção de IPTU para os templos.

A oposição a Crivella anunciou que pretende fazer uma CPI para investigar, na Câmara de Vereadores, a conduta do prefeito. E o Ministério Público decidiu apurar uma demissão em massa de servidores comissionados que, segundo a acusação, teriam sido substituídos na administração pública por fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus.

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A ligação entre Crivella e a igreja é histórica e foi explorada – de maneira favorável e contrária – em todas as campanhas eleitorais em que o atual prefeito participou. Agora, em 2018, voltou à cena com a crise que apareceu após a descoberta das promessas feitas aos pastores. Críticos do prefeito sugerem que o fato comprova que Crivella mistura religião e administração; já seus aliados apontam que os opositores demonstram intolerância religiosa.

Vereador da capital e um dos autores do pedido de impeachment, Tarcísio Mota (PSOL) afirma que a gravidade do episódio estaria na promessa que Crivella fez a um grupo em especial, independentemente de qual a origem desse grupo. “Se naquela reunião, no lugar de pastores estivessem sindicalistas, o ato de improbidade e o crime de responsabilidade seriam os mesmos. Há muitos evangélicos concordando com isso que estamos falando. Isso não é um preconceito, uma luta contra todos os evangélicos”, disse.

Por outro lado, o deputado federal Roberto Alves (PRB-SP), colega de partido de Crivella e também pastor evangélico, vê preconceito contra o prefeito. Alves afirma não ter sofrido com isso em sua carreira política, mas acredita que o preconceito é um problema disseminado na sociedade: “as pessoas sofrem preconceitos por causa da cor da pele, da religião, sofrem preconceito por causa das condições financeiras, sofrem preconceitos de todos os lados. O prefeito sofreu preconceito religioso”.

Também vereador – e apoiador do impeachment de Crivella – o ex-prefeito César Maia (DEM) reconhece haver a existência de um componente religioso, “mas o principal é sua [de Crivella] performance como prefeito”.

O fato de César Maia e de Tarcísio Motta – que, além de vereador, é o pré-candidato do PSOL ao governo do Rio – estarem do mesmo lado nesse processo revela o caráter “suprapartidário” que envolveu a tentativa de afastamento de Crivella. MDB, PDT, PMN, PTB, DEM e PSDB tiveram parlamentares votando a favor e contra o impeachment.

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A variação é também um indicativo de como as eleições locais, assim como a federal, estão imprevisíveis no Rio de Janeiro em 2018. Diferente do que ocorreu em outros estados e na briga pela Presidência, o Rio não viu uma polarização entre PT e PSDB nos últimos anos. As três últimas eleições para o governo foram vencidas pelo PMDB, partido que se esfarelou após a Lava Jato, a prisão do ex-governador Sérgio Cabral e o governo rejeitado de Luiz Fernando Pezão.

Atualmente, quem lidera a disputa para o governo do estado é o senador Romário (Podemos). A segunda posição é de Eduardo Paes (DEM), ex-prefeito da capital e que, por muito tempo, ingressou a cúpula do PMDB e foi aliado de primeira hora de Pezão e Cabral. Outros nomes que estão na corrida são o deputado federal Indio da Costa (PSD), o vereador Tarcísio e o ex-governador Anthony Garotinho (PRP).

O deputado federal Miro Teixeira (Rede) figurava entre os pré-candidatos até poucos dias, mas retirou seu nome da disputa. “Eu e a executiva nacional do partido vimos que com oito segundos [de tempo de televisão] minha candidatura não seria competitiva. Então achamos melhor eu me candidatar novamente a deputado federal, até para ajudar o partido a superar a cláusula de barreira”, disse. O partido de Miro e da ex-senadora Marina Silva contém, atualmente, apenas dois deputados federais, condição que tende a dificultar a corrida de Marina ao Planalto.

O prefeito Crivella, por conta da legislação, não poderá disputar as eleições de 2018. Mas seu filho, Marcelo Crivella Filho, se apresenta como pré-candidato a deputado federal. A controvérsia que envolveu o prefeito poderia prejudicar os planos do filho? Para o deputado federal Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB), não. “Sob o ponto de vista dos adeptos da igreja, não impacta. Porque a característica de quem mistura religião com política não é prestar conta, ou fazer crescer seu conceito perante a sociedade. É ampliar o poder das igrejas, e foi isso que ele quis fazer”, disse.