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Meire Poza, olho do furacão da Lava Jato, vira ré em São Paulo
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Ela é um elo entre o Mensalão, a Lava Jato e o caso Celso Daniel e acaba de virar ré na Operação Encilhamento, do Ministério Público Federal em São Paulo, Polícia Federal e Receita Federal, que investiga fraudes contra Institutos de Previdência Municipais. A denúncia recebida integralmente pelo juiz João Batista Gonçalves, da 6ª Vara Criminal Federal de SP, especializada em crimes financeiros, acusa Meire Poza de crimes que são punidos com 20 a 86 anos de prisão.

A nova acusação não tem nenhuma relação com os processos da Lava Jato. São 6 crimes de gestão fraudulenta cometidos entre janeiro de 2016 e agosto de 2017, quando a operação já corria a todo vapor, e são relativos à aplicação ilegal do Fundo de Previdência da Prefeitura de Campos dos Goytacazes (RJ) em fundos de investimento fraudulentos.

O processo corre em Segredo de Justiça, mas o MPF-SP informa que a contadora Meire Poza e o corretor Fabrício Fernandes Ferreira da Silva são acusados de auxiliar os controladores da corretora Gradual em operações de investimento do dinheiro de fundos municipais de previdência em papéis sem lastro que administrava.

A operação é complexa e, segundo os procuradores, envolve emissão irregular de debêntures (títulos de dívida de empresas privadas) e apresentação de documentos falsos para justificar a aplicação por parte dos fundos dos funcionários públicos municipais.

Até o momento, são investigados 13 Fundos de Investimento. Eles teriam recebido aportes de 28 Institutos de Previdência Municipais e há indícios que apontam para corrupção de servidores públicos ligados a alguns desses institutos. O montante total movimentado na fraude contra aposentados é estimado em R$ 1,3 bilhões. Alguns dos principais nomes na investigação têm feito parte das manchetes nos últimos dias.

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A denúncia do MPF pede que os controladores da Gradual, Fernanda Ferraz de Braga Lima e Gabriel Paulo Gouvêa de Freitas Júnior, sejam condenados por crimes cujas penas variam de 27 a 109 anos de prisão. O corretor acusado de auxiliar a operação está sujeito a pena de 18 a 78 anos de prisão.

 

MEIRE POZA NA LAVA JATO

Meire Poza é uma das personagens mais polêmicas da Operação Lava Jato. O auge das referências ao seu nome foi o incêndio em seu escritório de contabilidade, a Arbor Contábil, em 1º de abril de 2016. Na época, ela garantiu que nada da Lava Jato havia sido perdido porque ela já havia repassado todos os documentos ao delegado Marcio Anselmo, que fazia parte da Força-Tarefa.

Ela afirmou só ter ficado sabendo do incêndio, iniciado às 22h, na manhã seguinte. O escritório estava interditado para busca e apreensão de documentos.

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Alberto Youssef é o doleiro que se tornou o estopim de toda a operação Lava Jato e Meire Poza era sua contadora, pessoa de confiança e pioneira nas denúncias. Sua participação no dia-a-dia do início da operação está documentada no livro “Assassinato de Reputações II – Muito Além da Lava Jato”, do jornalista Claudio Tognolli.  Além disso, era amante de Enivaldo Quadrado, doleiro que trabalhava com Youssef e foi condenado no Mensalão quando estava à frente da Bônus Banval, após ser flagrado com euros na cueca no aeroporto de Guarulhos.

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CONEXÃO COM O CASO CELSO DANIEL

Foi durante as investigações da Lava Jato que Meire Poza revelou ter em seu escritório um contrato, apreendido posteriormente pela Polícia Federal, de um empréstimo da empresa de Marcos Valério (2S Participações LTDA) à Expresso Nova Santo André, de Ronan Maria Pinto, um dos condenados no esquema de fraudes nos transportes na prefeitura de Santo André durante a gestão Celso Daniel.  O contrato pertencia ao doleiro que era seu amante, Enivaldo Quadrado, e a contadora afirmou não saber a motivação da transferência em depoimento à CPMI da Petrobrás.

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Em 23 de março deste ano, a transação foi o centro da condenação, na 27ª fase da Lava Jato, de Enivaldo Quadrado (o amante de Meire Poza), Ronan Maria Pinto e do ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares. Era parte de uma operação complexa de transferência de dinheiro envolvendo o pecuarista José Carlos Bumlai, que ficou conhecido por se apresentar como “amigo do presidente Lula” para o empresário dos transportes de Santo André. O dinheiro teria sido utilizado para a compra do Diário do Grande ABC.

Não há dúvidas de que a operação foi ilegal, tanto que há vários condenados, mas nunca foi apurado o motivo do pagamento a Ronan Maria Pinto.  “Nos autos não há a investigação sobre a motivação do PT para entregar os valores a Ronan, tendo o Ministério Público Federal levantado a hipótese de uma suposta extorsão praticada por Ronan contra o PT, mas o fato não foi esclarecido nem constitui objeto da denúncia, tendo esta se detido no crime de lavagem de dinheiro.”, diz a sentença do Tribunal Regional Federal da 4ªa Região.

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DELAÇÃO NÃO PREMIADA

Em 2015, no início da Lava Jato, durante longo depoimento ao juiz Sergio Moro, Meire Poza disse que seu amante, o doleiro Enivaldo Quadrado, estava a um passo de ser demitido do escritório do doleiro Alberto Youssef. O motivo não era exatamente a condenação a 9 anos de prisão no Mensalão, mas a depressão e o alcoolismo que o impediam de entregar o trabalho pelo qual era pago.

Na ocasião, a advogada de Enivaldo Quadrado perguntou diretamente se a contadora tinha algum tipo de acordo com as autoridades e ela foi taxativa: “Não, não tenho”.

O fato é que Meire Poza entregou, desde o início da Lava Jato, documentos que também a incriminavam e, até 2017, nem o Ministério Público Federal nem a Polícia Federal fizeram nenhum movimento no sentido do seu indiciamento. Quando foi indiciada, fez uma manobra ousada, convocando como testemunhas de defesa todos os membros da Força-Tarefa.

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Em fevereiro deste ano, durante depoimento ao juiz Sergio Moro, Meire Poza pediu perdão judicial pelas ações na Lava Jato e alegou ter firmado informalmente um acordo de delação premiada.

Embora não tenha sido assinado, doutor, nós tínhamos um acordo que, para mim, era 100% válido. Um acordo simples: eu colaboraria, como colaborei, em todas e quaisquer ações que houvesse e eles não me denunciariam. Então, era um acordo firmado… não sei, um acordo moral, enfim, e que foi cumprido por parte deles em 2014, 2015, 2016. Só foi quebrado esse acordo agora, em 2017. Mas existia efetivamente. – declarou Meire Poza no depoimento.

A contadora alegou que seguiu as instruções do delegado Marcio Anselmo, que fazia parte da Força-Tarefa, e que jamais negou qualquer tipo de acordo.

O Marcio dizia que, se eu não tivesse colaborado da forma como eu fiz, provavelmente a operação não teria chegado onde ela chegou. (…) No dia 17 de março de 2015, um ano de operação, eu recebi mensagens de toda a Força-Tarefa dizendo ‘ah, hoje NÓS vamos comemorar, a vitória é NOSSA’, me chamando para um churrasco da Lava Jato em comemoração. Membros do Ministério Público me dizendo que a minha ajuda, a minha colaboração foi imprescindível. – afirmou a contadora.

Meire Poza contesta que tenha se tornado testemunha na Lava Jato. Alega que, desde o princípio deixou claro que era ré, tentando uma colaboração premiada.

Eles dizem que eu não aceitei o acordo de colaboração premiada. Eu não aceito e me torno testemunha? O Ministério Público me perguntou literalmente: a senhora se considera ré nessa ação? E eu disse: sim, eu me considero. E daí foi oferecido esse acordo. – depôs a contadora em fevereiro deste ano.

A negativa teria sido apenas sobre uma oferta de proteção a testemunha, acompanhamento das autoridades o tempo todo. Agora, segundo o MPF, há novas denúncias. Enquanto divulgava os documentos da operação que mudou o destino do Brasil, Meire Poza estaria fazendo consultoria para outras iniciativas, aquelas que fraudam a previdência de servidores municipais.

Definitivamente, não há ficção capaz de competir com a nossa realidade.

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