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Durante a transição, Jair Bolsonaro enfrenta um desafio inédito na presidência da República: transpor para o governo a excelência de suas redes sociais durante a campanha. No meio do caminho tem uma pedra, a diferença entre administrar uma conta de twitter e um país de 210 milhões de habitantes parece ainda não ter ficado tão clara nos pronunciamentos em mídias sociais do presidente eleito e de seu núcleo duro, mais especificamente, núcleo familiar que, de alguma forma misteriosa, também virou sinônimo de governo.

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“Uma coisa é a campanha eleitoral, outra coisa é a comunicação do governo. O marketing de mandato vai ter de avaliar bem quais são as melhores formas de comunicar, ele vai ter a estrutura toda da EBC agora como presidente. Então, não vai ser uma forma tão simples e ele vai ter de entender que ele vai precisar começar a envolver uma série de outras pessoas porque ele, sozinho, não é o governo. Ele vai ter de consultar uma série de pessoas e de formatos de como falar algumas coisas.”, explica o especialista em marketing político digital Rodrigo Gadelha, da RG Organics.

Para ele, a principal diferença entre o que foi feito até agora – uma organização impressionante e orgânica de voluntários a favor de Bolsonaro nas redes – e a realidade daqui em diante é a transformação de pedra em vidraça. “Qualquer coisa mal falada agora vai impactar no Governo Federal, vai impactar na imagem dele como presidente. (…) A família Bolsonaro vai ter que aprender o que é gestão de crise. Porque uma coisa é você ser só o cara que fala, mas agora ele virou o teto de vidro, tudo é em cima dele. E eles vão ter de aprender como gerir isso.”, defende Rodrigo Gadelha.

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Há uma resistência da família Bolsonaro na profissionalização da comunicação, talvez pelo sucesso colhido de forma espontânea durante a campanha. Na transição, o resultado do amadorismo é evidente. Flavio Bolsonaro, o filho sobre quem paira a história dos assessores que não trabalham e do motorista milionário, que ele não explicou até agora, providenciou sem saber um meme para que os detratores de seu pai dêem mais fôlego à história usando o ridículo. Após uma série de piadas maldosas nas redes envolvendo a palavra “laranja”, ele próprio posta no Instagram uma foto de uma reunião regada a suco de laranja. Qual a necessidade disso?

A gestão desse escândalo, com toda certeza, não passa pela criação involuntária de piadas negativas para o presidente eleito. Antes, toda a família Bolsonaro chegou a tentar a tática, copiada dos petistas, de questionar por que o COAF não investigava outras pessoas e, ao perceberem que investigava, passaram a perguntar por que a mídia volta seus olhos para o presidente eleito e não para um bando de deputados desconhecidos do grande público, parte deles já presa. É tão óbvio que chega a ser infantil o questionamento.

“Não foi uma eleição de propostas, foi uma eleição de valores. O foco era anti-corrupção. Então, a única promessa que ele fez é que iria lutar contra a corrupção – e esse é o ponto do COAF, por isso que está estourando tudo isso. E ele precisa defender porque foi o principal item que ele defendeu durante a campanha inteira.”, argumenta o especialista em marketing político digital.

“Algumas vezes durante a carreira dele ele foi vidraça, mas não com o foco de todos, como ele é hoje. Hoje, ele é o principal assunto do país, ele é o presidente.”, observa Rodrigo Gadelha sobre Jair Bolsonaro.

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Quando alguém é responsável pelos rumos de uma nação, precisa ter noção do poder que exerce e das consequências dos erros. “Ele fala alguma coisa fora de contexto, pode ser mal entendida. Como a questão ‘se tivermos alguma coisa, nós vamos pagar’. Pagar o quê? Arcar com as consequências ou pagar a conta financeira? Então esse é o ponto, ele vai ter que agora aprender como falar. Mesmo que seja nos canais oficiais dele, nas redes sociais, ele vai ter de aprender como falar.”, defende.

No caso específico dos funcionários de Flavio Bolsonaro, a falta de planejamento da reação fez com que o grosso do peso da acusação recaia sobre o presidente eleito. É ele quem fala, o que seria necessário de qualquer maneira devido ao cheque recebido pela mulher dele. Mas o silêncio e o sumiço do filho responsável pelo gabinete, um homem feito, de 38 anos de idade, aprofunda a crise sobre o pai. É ele quem deveria capitanear a gestão da crise, deixando ao pai apenas a explicação que realmente lhe cabe.

Há outros rompantes familiares totalmente desnecessários, como a briga requentada com a Venezuela sobre a posse do presidente eleito. Nesta manhã, Carlos Bolsonaro, o filho mais ativo nas redes durante a campanha, resolveu ressuscitar o assunto que em nada favorece nem o pai nem a diplomacia de seu novo governo.

Ainda falta uma explicação sobre os critérios para não convidar para a posse um país com o qual temos relações diplomáticas. Se a questão é com ditaduras, por que a primeira a ser rejeitada não foi justamente a que assassinou recentemente uma cidadã brasileira, a do socialista Daniel Ortega, na Nicarágua? Por que Venezuela e Cuba? Qual o critério?

Cinco dias após a publicação online dos documentos pelo embaixador da Venezuela no Brasil, o filho de Jair Bolsonaro voltou ao tema com uma série de tweets em que critica a imprensa, nega fatos reais e depois tenta uma justificativa que, em vez de favorecer, vitimiza o novo Chanceler, de quem o país espera nada menos que total familiaridade com o Itamaraty e controle das atividades dos subordinados.

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Se o Brasil está mudando antes que Jair Bolsonaro assuma, como pode, ao mesmo tempo, não estar mudando, já que o Itamaraty segue o mesmo? Existe uma “agenda que interessa ao sistema” nas relações internacionais? Que sistema? Qual agenda? Por que o futuro ministro das Relações Exteriores não tomou as providências de modificar a regra de convites a autoridades estrangeiras? Ele não sabia que se manda a TODOS os países com os quais o Brasil tem relações diplomáticas, não foi avisado da mudança ou simplesmente esqueceu de se manifestar sobre a posse?

Ocorre que, dias antes, os venezuelanos postaram na internet os documentos mostrando o convite e a negativa oficial de Nicolás Maduro. Veja que o ofício original do Itamaraty é endereçado a todos os países que têm missões diplomáticas acreditadas junto ao governo brasileiro, como é a tradição diplomática internacional desse tipo de convite.

“Eles estão muito em acerto e erro, estão testando. Solta uma informação, vamos ver se pega bem ou não. Só que, quando ele assumir de fato, não vai ter mais esse acerto e erro, as pessoas vão começar a cobrar. Hoje, ainda dá. Agora, a partir do dia primeiro de janeiro, vão cobrar uma posição concreta e aí ele vai ter de organizar a comunicação como um todo. ‘Eu vou falar da economia’, então tem de saber tudo certo para não falar bobagem porque, senão eu vou gerar uma expectativa positiva ou negativa no mercado. Esse é o ponto que eu acho que eles ainda não enxergaram.”, analisa o especialista em marketing político digital.

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“O que vai acontecer com os históricos? Tudo o que o Bolsonaro falou com certeza a imprensa está guardando e uma hora ele vai ser cobrado e aí ele vai ter de aprender a mostrar que uma coisa é estar no governo e outra é ser da oposição. Esse é o ponto que eu acredito que vai ser o grande desafio do Bolsonaro, o grande desafio desse governo: é como se posicionar como governo sem quebrar todos os cristais, quebrar todos os copos. Porque vai estar em cima da mesa com toda a equipe que ele tem. Uma forma que ele não comunique certo do governo vai gerar uma crise enorme. Esse é o grande desafio do governo, como comunicar de maneira unificada. Uma coisa é ele falar lá na rede social dele é uma coisa. Agora, ele vai estar organizado com todas as peças do governo?”, questiona Rodrigo Gadelha.

Uma outra questão importante é a forma simplista como tem sido vista a comunicação de governo, inclusive apresentando como inovação a comunicação direta de temas políticos, ideológicos e comentários de notícias, algo já centenário. O governo não se resume à figura do presidente e a suas opiniões emitidas por uma conta de twitter, a comunicação de quem administra um país vai bem além disso.

As inovações digitais na área governamental criam sistemas fundamentais para a transparência da administração e fiscalização dos agentes públicos. Além disso, podem revolucionar a forma como serviços são prestados à sociedade em áreas como emissão de documentos, saúde, educação e até segurança pública. A revolução digital de que o governo precisa é menos fazer diferente o que já existe – pronunciamentos públicos e políticos do primeiro mandatário – e mais novidades reais, que coloquem verdadeiramente a tecnologia a serviço do cidadão, eliminando burocracia, melhorando a qualidade dos serviços prestados e diminuindo custos.

“O grande desafio desse governo é enxergar que a comunicação não é só um pronunciamento direto de um candidato, de uma pessoa.” – explica Rodrigo Gadelha, da RG Organics.

“Quando você olha governo, é totalmente diferente: é prestação de serviço, é prestação de contas, é transparência, é conseguir envolver o povo. Ele pode até tentar, como ele aprendeu muito a mobilizar o povo em prol da campanha, ele pode mobilizar o povo em torno de uma vacinação, por exemplo, em prol de outras coisas”, sugere o especialista em marketing político.

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A tentativa de mimetizar o comportamento online de Donald Trump, que utiliza suas contas em redes sociais para brigar com a imprensa e mandar recados, ignora que esse sistema de comunicação é coordenado com outro, gigantesco, de uma democracia madura, acostumada com o contraditório, que já possui um sistema estatal de comunicação para a prestação de serviços, prestação de contas e atendimento social. Levando em conta o sistema completo e as necessidades do Brasil, cabe um Trump tupiniquim? É boa estratégia para o país? A análise se faz necessária.

Por enquanto, uma coisa é muito clara: o sistema de pronunciamentos políticos das pessoas mais próximas a Jair Bolsonaro traz mais problemas que soluções ao presidente eleito. Se poderia ser utilizado para blindá-lo e, por consequência, blindar a instituição Presidência da República contra ataques e crises, tem funcionado como gasolina no fogo, ressuscitando problemas, fomentando rivalidades, demandando retratações e desgastando a imagem muito além do necessário.

É exatamente por isso que eu me pergunto: qual a necessidade disso, Bolsonaro?

 

Veja AQUI a entrevista completa do especialista em marketing político digital Rodrigo Gadelha, da RG Organics:

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