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A primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, comemora resultado das eleições para o Parlamento Europeu em junho de 2024.
A primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, é líder de um dos blocos de direita que devem ganhar espaço no Parlamento Europeu.| Foto: Giuseppe Lami/EFE/EPA

Poucas vezes um resultado eleitoral foi tão previsível. Fala-se da ascensão da direita há anos, e as pesquisas de opinião e intenção de votos já mostravam isso. Foi uma vitória avassaladora. Em alguns casos, os resultados foram até além do esperado. A direita ganhou praticamente em todos os países; dentro de cada país, ganhou em quase todas as regiões.

A direita (ou seja, partidos populares, conservadores e eurocéticos) ganhou 320 de 720 cadeiras no Parlamento Europeu, com 26 a mais que na eleição passada. A esquerda (sociais-democratas, verdes e socialistas) perdeu 23 assentos, somando 303. Todos os grupos de direita ganharam cadeiras; todos os de esquerda perderam representação. Os partidos populares (de centro-direita) se confirmaram como o maior grupo e foram os que mais ganharam cadeiras em número, mas os conservadores e os eurocéticos foram os que mais avançaram em termos proporcionais. Já os liberais-democratas, sozinhos, perderam 26 deputados.

Na Alemanha e na França, os eurocéticos elegeram mais que o dobro dos eurodeputados sociais-democratas, atualmente no poder. A direita e os eurocéticos cresceram praticamente em todos os países. As nações bálticas (Estônia, Letônia e Lituânia) foram mais à direita. Na Polônia, Tchéquia, Eslováquia, Eslovênia, Hungria e Bulgária, a esquerda quase sumiu do mapa. Só nos países nórdicos (Suécia, Finlândia e Dinamarca), na Romênia e na Croácia os resultados foram mais equilibrados; Portugal foi o único país em que a esquerda ganhou um assento a mais que a direita. Nunca a União Europeia votou de forma tão uniforme.

Fala-se da ascensão da direita há anos, e as pesquisas de opinião e intenção de votos já mostravam isso. Foi uma vitória avassaladora

O impacto foi tão forte que o presidente francês, Emmanuel Macron, dissolveu a Assembleia Nacional e convocou novas eleições; o primeiro-ministro belga, Alexander de Croo, devolveu seu mandato ao rei. Na Espanha, na Alemanha e em Portugal a oposição também está pedindo novas eleições. Macron pode ter tomado essa decisão por dois motivos: 1. Ele prefere morrer de uma morte rápida em vez de esperar uma morte lenta até 2027; 2. Antecipa-se uma vitória eleitoral da direita nas eleições parlamentares, a Reunião Nacional (partido de Marine Le Pen) indica o primeiro-ministro e, dessa forma, começa a sujar as mãos e se desgastar, para depois, nas eleições presidenciais de 2027, Macron poder mostrar algum feito negativo da direita.

As causas do sucesso da direita e centro-direita

Os motivos dessa vitória são vários: imigração, guerra na Ucrânia, inflação e preços da energia, agricultura e reflexos das políticas ambientalistas, envelhecimento da população, movimento pendular, insatisfação com os incumbentes etc.

É normal que às vezes ganhe a direita e, outras vezes, a esquerda; tais movimentos pendulares levam a alternância do poder, assim funciona a democracia. Já a insatisfação com os governos atuais é relevante: ganhar consenso na oposição é fácil; quando, depois, um grupo ganha as eleições e governa, geralmente há sempre descontentamento e desgaste. Foi o caso de Espanha, França, Alemanha e outros países. A grande exceção foi a Itália, onde Giorgia Meloni está no governo e se confirmou como o primeiro partido, até aumentando os votos.

Os países da Europa têm entre 8% e 15% de imigrantes residentes (o Brasil tem 0,5%). A esquerda fala de multiculturalismo e integração, e é verdade que os dados mostram uma participação dos migrantes na criminalidade menor do que as pessoas pensam; mas, no dia a dia, as pessoas têm medo. O convívio não é fácil, especialmente com intolerantes, extremistas e com quem não respeita e até despreza os valores fundamentais de um país livre. A direita conseguiu falar com as pessoas comuns. A esquerda virou establishment, elitizou-se. Na França, o social-democrata Macron é ligado ao mercado financeiro.

A inflação está muito alta (para os padrões habituais): de 2021 a 2023 chegou a 11%; agora está caindo, mas em alguns países, como Bélgica, Romênia, Estônia e Croácia, continua entre 4% e 6%. Isso por si só coloca qualquer governo em dificuldade. Os preços da energia e dos combustíveis aumentaram ainda mais que a média, e especialmente as empresas sofrem muito. A Europa importa energia da Rússia, e isso engessa as mãos na hora de posicionamentos contra a invasão da Ucrânia e contribui para o aumento dos preços da energia. Por um lado, a guerra na Ucrânia contribui para o aumento dos preços; por outro lado, o apoio militar e econômico que os países estão dando à Ucrânia pesa sobre os pagadores de impostos.

Em alguns países, como Holanda, França e Alemanha, vimos protestos e manifestações de agricultores e “jaquetas amarelas”. Em parte, essa situação é o reflexo de políticas ambientais radicais que subsidiam energia eólica e solar, impondo uma série de exigências que encarecem a produção.

Giorgia Meloni está mostrando que a direita não é autoritária e que sabe governar

Itália desmente clichês sobre governos de direita

Talvez tenha havido até um certo “efeito Meloni”. A direita é sempre tachada de ignorante, autoritária e despreparada para governar. Mas Meloni está mostrando o contrário: ela fala inglês, francês e espanhol; não foi e não é bem acolhida pelos tecnocratas da UE, mas está ganhando cada vez mais respeito e está conseguindo até se impor nas relações bilaterais; do ponto de vista econômico, a Itália ainda tem muitos problemas, mas o PIB está aumentando, o desemprego está caindo, a ocupação cresce e a inflação é uma das mais baixas da UE. Meloni está mostrando que a direita não é autoritária e que sabe governar.

Por fim, é importante notar que votaram apenas 51% das pessoas com direito a voto, que é facultativo. Isso também conta, pois as pessoas que não votam não se distribuiriam de forma uniforme, mas geralmente votariam mais à esquerda.

“Eles nos viram chegar, mas não conseguiram nos parar” disse a primeira-ministra italiana. E foi exatamente isso: a esquerda sabia que ia acontecer, mas não conseguiu evitar.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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