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Adriano Gianturco

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Funcionalismo

Empregados estatais não pagam impostos

Esplanada dos Ministérios: tudo bancado com os impostos do povo
Toda a máquina pública, inclusive as pessoas que fazem parte dela, são bancadas com os impostos de quem está fora dela. (Foto: Fábio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)

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Essa é uma daquelas simples e óbvias verdades que geram muita raiva e polêmica: empregados estatais (vulgo “funcionários públicos”) não pagam impostos. Quem paga impostos são os trabalhadores do setor privado. Os empregados estatais recebem impostos, são pagos com dinheiro dos tributos. Não se trata de crime de sonegação: é tudo completamente legal e previsto pelo sistema.

É verdade que os empregados estatais recolhem impostos na fonte, como Imposto de Renda e contribuição previdenciária, mas este é um caso daquilo que chamamos de “ficção contábil”. Peguemos o exemplo hipotético e simplificado de um burocrata que recebe um salário bruto de R$ 10 mil e tem desconto de 50% na folha. Ele recebe, de fato, R$ 5 mil. Quanto ele custa aos cofres públicos, à sociedade? Custa R$ 5 mil, e não R$ 10 mil. Se recebesse diretamente R$ 5 mil sem a ficção contábil que coloca no papel um salário de R$ 10 mil com retenção de 50% de impostos na folha, não mudaria absolutamente nada: ele continuaria ganhando o mesmo valor e teria o mesmo custo para a sociedade. Mesmo quando o empregado estatal compra algum produto ou serviço e paga ICMS, ISS ou IPI, ele o faz com dinheiro advindo de impostos. Mais uma vez: se recebesse menos e fosse isento desse imposto sobre o consumo, o resultado seria exatamente o mesmo. Agora, talvez, tenha ficado claro que empregados estatais não pagam impostos. E é por isso que falamos em “ficção contábil”.

Essa é a diferença entre pagadores de impostos e recebedores de impostos. Há quem paga e quem recebe o dinheiro dos tributos. Na linha do norte-americano John Calhoun, que divide a sociedade entre “pagadores de impostos” e “consumidores de impostos”, o professor Guido Hülsmann ilustra muito bem esse conflito entre as duas classes, a de quem paga e a de quem recebe, em sua obra Abundance, Generosity and the State.

Quem paga impostos são os trabalhadores do setor privado. Os empregados estatais são pagos com dinheiro de impostos. Tudo completamente legal e previsto pelo sistema

Trata-se de uma das várias “ilusões fiscais” tratadas em livro com o mesmo nome, escrito pelo economista Amilcare Puviani. Os pagadores de impostos tentam minimizar o pagamento, enquanto os recebedores de impostos tentam maximizar a arrecadação e minimizar a resistência dos pagadores. A ficção contábil, que torna mais obscura a realidade, é simplesmente um dos estratagemas normalmente utilizados.

Na verdade, os empregados estatais recebem impostos: o dinheiro que eles recebem vem exatamente dos tributos pagos pelos (perdoem a redundância) pagadores de impostos. Os funcionários do Estado, no fim das contas, não têm como pagar impostos nem que desejassem, pois os recursos que eles recebem provêm dos impostos. Se tivessem de pagar tributos, para quem pagariam? Para eles mesmos?

Para deixar isso mais claro, sugiro um experimento mental: se amanhã fossem abolidos todos os impostos, um trabalhador privado ganharia mais ou menos? Ganharia mais, pois a parte referente aos impostos ficaria no seu bolso. Mas e o trabalhador estatal, ganharia mais ou menos? Ganharia menos – na verdade, ganharia zero, pois o recurso que banca seu salário não existia mais, já que sua remuneração vinha dos tributos pagos pelos trabalhadores do setor produtivo.

Confrontados com esse simples e banal fato autoevidente, muitos empregados estatais se irritam, ficam com raiva e tentam negá-lo, como se não fosse verdade e como se estivéssemos acusando-os de faltar com a moral. Mas pagar impostos não é virtude nem ato moral; é mera obrigação. As pessoas não pagam por serem virtuosas e éticas, mas por serem obrigadas. Pagar é um ato de obediência e submissão na escala hierárquica do poder. Não pagar, por sua vez, simboliza poder.

As ilusões e as ficções são fundamentais para a manutenção do sistema e a ordem social. Se as pessoas soubessem, se a ficção acabasse, as pessoas notariam a ilusão fiscal, os vestidos do imperador de tecido fino cairiam e o rei estaria nu; a legitimidade acabaria, o descontentamento aumentaria e poderiam surgir motins, revoltas e greves fiscais. Daí a importância da ficção.

Não fomos feitos para entender a política, fomos feitos para sofrê-la.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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