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Adriano Gianturco

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Guerras

O fim de uma breve era de paz mundial

Ali Khamenei segura fuzil enquanto discursa em Teerã
Segurando um fuzil (do qual só se vê a ponta na foto), o líder máximo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, voltou a ameaçar Israel durante cerimônia nesta sexta-feira, dia 4. (Foto: EFE/EPA/Iranian Supreme Leader Office)

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Entre 1815 e 1914, o mundo viveu o chamado “século da paz”, a “paz britânica” em cujo meio houve a “belle époque”. Foi um período de relativa ausência de grandes conflitos armados, entre as Guerras Napoleônicas e a Primeira Guerra Mundial. Na época, parecia durar para sempre. Mas acabou. Depois da Segunda Guerra Mundial até hoje, também vivemos um período de relativa paz, a ponto de Francis Fukuyama convencer muitos de que todos os países do mundo se tornariam democracias liberais. Não se tornaram.

Hoje temos guerra entre Israel, Hamas, Hezbollah e Irã, um conflito que está escalando; guerra na Ucrânia; ventos de guerra no Azerbaijão, na Venezuela e na Transnístria (um território da Moldávia sob influência russa que reivindica independência). A China tomará Taiwan, depois de ter se apossado de Hong Kong. É só uma questão de tempo.

A China tem se tornado cada vez mais mais agressiva, com incursões no Mar do Sul da China e chegando até as costas do Chile; exercícios militares perto de Hong Kong e Taiwan; testes nucleares próximos ao Japão sem os devidos avisos; discursos e declarações inflamadas contra Suécia, Austrália e Taiwan. A capacidade bélica da Coreia do Norte está aumentando. Japão, Taiwan, Hong Kong, Cingapura, Austrália, Índia e Coreia do Sul estão preocupados.

A história não é linear, nada é para sempre, a paz não é garantida. Estamos entrando em uma espiral negativa da qual é muito difícil sair antes de chegar a um ponto crítico

Suécia, Finlândia e até a Suíça estão revendo sua política secular de neutralidade. A famosa neutralidade suíça, na verdade, é baseada na condição de que não haja ameaças na Europa. Com a invasão da Ucrânia pela Rússia, isso mudou, e foi essa a justificativa de alguns países para rever sua postura. Não por acaso o país helvético mudou as regras e permitiu o envio indireto de armas para a Ucrânia. Foi por medo da Rússia que Suécia e Finlândia acabaram de entrar na Otan. Bósnia-Herzegovina, Ucrânia e Geórgia também querem ingressar na aliança militar. A mesma Otan prevê mais guerras nos próximos 20 anos, e afirmou que “temos de estar prontos para uma guerra com a Rússia”. O Japão recentemente levantou a possibilidade de criar uma “Otan asiática”, em chave anti-Rússia e anti-China.

Suécia, Lituânia, Letônia e Estônia reintroduziram o serviço militar obrigatório. França, Itália e Alemanha estão discutindo a mesma medida. A Ucrânia, obviamente, está tentando ir atrás de homens em idade militar de todas as formas. O mercado de mercenários também está em alta. Além do conhecido grupo russo Wagner, mercenários da América do Sul e cubanos estão sendo recrutados tanto pela Rússia quanto pela Ucrânia.

O gasto militar tem crescido desde desde 2014, chegando a um total de US$ 2,443 trilhões. Só em 2023 a elevação foi de 6,8%, a maior desde 2009. A despesa militar em proporção ao PIB chegou a 2,3% no ano passado, enquanto a média de gasto militar como porção do gasto estatal chegou a 6,9% e a despesa militar per capita é a mais alta desde 1990, chegando a US$ 306. Isso é causa e consequência ao mesmo tempo, uma profecia que se autorrealiza: os países gastam mais em defesa pois estão com medo da guerra; gastando mais em defesa, surgem as guerras. Além disso, o número de democracias no mundo vem caindo e o de ditaduras aumentando e, sabemos que, por uma série de motivos, as ditaduras fazem mais guerras.

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Consequentemente, o número de refugiados internacionais chegou ao maior número desde a Segunda Guerra Mundial, com 43,4 milhões de pessoas em 2024 contra 27 milhões em 2022 e 35 milhões no ano passado. Grande parte do aumento se deve à guerra na Ucrânia.

Alguns falam de desglobalização. Na verdade, os dados mostram que, apesar de o nome estar na moda, esse processo não está acontecendo de forma massiva, mas apenas com alguns produtos, setores e países específicos: medicamentos, vacinas, microchips, sanções econômicas contra Rússia e Belarus etc. Trata-se mais de diversificação e de “dessinização”. E sabemos que protecionismo leva a guerras: onde não passam mercadorias, passam os exércitos.

A história não é linear, nada é para sempre, a paz não é garantida. Estamos entrando em uma espiral negativa da qual é muito difícil sair antes de chegar a um ponto crítico. Sem exageros sobre uma “Terceira Guerra Mundial” e sem querer espantar ninguém, essa parece ser a tendência.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

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