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Em São Paulo, a direita ficou e está dividida entre Ricardo Nunes, Marina Helena e Pablo Marçal. Bolsonaro escolheu Nunes. O ex-presidente mobiliza muitos votos, mas outros não seguirão o Capitão e votarão em Marçal.
As pessoas estão cansadas do sistema e dos acordos entre as raposas de sempre. Marçal parece ir contra tudo isso. Querem uma esperança de algo diferente, qualquer coisa.
Marçal ganha muito apoio por vários motivos. Ele é um homem rico que se fez sozinho, e a Fundação Perseu Abamo (do PT) já demonstrou que as pessoas viam com bons olhos tanto Lula quanto João Doria exatamente porque os consideravam pessoas que se fizeram sozinhos (mesmo que no caso de Doria não fosse verdade). Em um país no qual é tão difícil sair da pobreza, quem consegue é admirado.
Além disso, Marçal tem carisma e boa oratória; um carisma duro que atrai muitos e também rejeita vários outros. Isso se deve ao que muitos chamam de “agressividade” (verbal) de sua parte, algo que Jordan Peterson chama mais corretamente de “desagradabilidade”, ou a facilidade de falar coisas negativas de forma seca para as pessoas.
Marçal não é nem novidade nem ruptura. Não há nada mais comum no Brasil que líderes carismáticos, populares e populistas
Mas Max Weber explica melhor esse fenômeno. O autor austríaco distingue entre três tipos de poder legítimo: o tradicional, o carismático e o legal-racional. O poder carismático deriva das caraterísticas pessoais do líder; é o mais primitivo e simples. O povo atribui ao líder alguma caraterística excepcional, confia nele quase cegamente e acha que ele usará seus dotes para o bem comum. Personalismo: tudo depende dele. Se e quando o líder carismático não tiver sucesso, a aura de grande homem desmoronará facilmente. O poder tradicional deriva do poder familiar; é aquele hereditário, típico da nobreza feudal e das monarquias: as pessoas mandam porque sempre mandaram e têm o direito de mandar por isso. Por fim, o poder legal-racional é o típico das sociedades modernas. É impessoal: as pessoas obedecem à lei porque as normas foram emanadas respeitando o processo legal, e esse poder geralmente vem junto com uma estrutura burocrática e anônima.
Weber também fala dos correlatos tipos de ação social: o agir racional (em relação ao escopo, ou ao valor), o tradicional e o afetivo. Este último, o afetivo, é conectado ao poder carismático. As pessoas agem com base nas emoções, de forma instintiva, simples e passional, e não calculam as consequências. E esse é o caso da torcida, da paixão daqueles que apoiam Marçal de forma instintiva; são pessoas que enxergam nele o líder “macho alfa”, querem segui-lo e alçá-lo ao trono.
As pessoas apoiam Marçal por isso. Ninguém o apoia pelo seu programa. Ninguém nem sabe suas propostas. Ele mesmo se recusa a falar sobre isso em muitas entrevistas e até já disse que, no mérito, não discorda em nada da candidata Marina Helena, mas que “em democracia não ganha o melhor”, reconhecendo que ela é melhor e a elogiando muito.
Na verdade, Marçal não é nem novidade nem ruptura. Não há nada mais comum no Brasil que líderes carismáticos, populares e populistas. Ele é candidato por um partido do Centrão, o PRTB. E com quem terá de governar depois, caso ganhe? Ele não tem estrutura partidária própria e nem maioria na Câmara Municipal.
Esta é a velha busca por salvadores da pátria, o mesmo motivo pelo qual a maioria dos que jogam na loteria são pobres, é o desespero pela varinha mágica que irá resolver séculos de problemas em quatro anos, a volta do “50 anos em 5”. Um contra todos.
No fundo, muita gente só confunde as coisas. Acham que falar alto, na cara e na lata signifique ter coragem, ser contra o sistema, ter força e vontade para mudar as coisas. Mas é só primitivismo mesmo. Quem realmente está tendo a coragem de não fazer coligações com o Centrão, de propor mandar os pacientes do SUS para a rede privada, e até de pedir impeachment de Alexandre de Moraes é Marina Helena. Mas, em um país de renda média, o Novo soa “prudente e sofisticado” demais.
Não importam as propostas, mas a aparência. Poder carismático e agir afetivo. Weber já explicou Marçal.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos