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Muitos querem colocar sistemas de metas e bônus para funcionários estatais, de forma a determinar políticas salariais, promover e demitir com base nas performances. Mas é realidade é mais complexa do que os defensores das metas imaginam. Na verdade, programas de metas já existem – só que não funcionam. O que acontece é que os gerentes declaram que todos bateram a meta. Não há como mudar.
William Niskanen é um cientista que dedicou toda sua vida ao estudo da administração pública, e mostra várias de suas características e problemas.
Em primeiro lugar, é impossível medir o valor da burocracia. Por exemplo, quanto deveriam ganhar policiais, médicos, professores e juízes? Pode-se tentar ver quantos casos um policial resolve, quantos pacientes um médico cura, quantos casos um juiz julga, quantos alunos um professor consegue fazer passar no Enem ou no Enade etc., mas logo surgirão vários obstáculos insuperáveis.
Se o policial for avaliado em termos de casos resolvidos, gera-se incentivo a declarar como “resolvidos” muitos casos de forma rápida e aproximativa. Se, ao contrário, quer-se avaliar os casos investigados, gera-se o incentivo a tratar muitos casos (e até inventá-los), sem resolvê-los. A mesma coisa acontece com médicos, juízes e todo tipo de funcionários estatais. Além disso, se houver poucos casos de crime, a polícia merece ganhar pouco porque trabalha pouco, ou ganhar muito porque tem muito sucesso na prevenção? E esse baixo número de crimes depende apenas da polícia ou de outros fatores mais amplos? São perguntas sem uma resposta certa.
No mundo inteiro, funcionários estatais são (quase) inamovíveis. Isso é normal, e inclusive é importante para que possam se sentir à vontade para denunciar irregularidades
Em segundo lugar, metas podem ter consequências perversas. Na Colômbia, o Estado colocou metas para o Exército matar terroristas, e os militares acabaram matando também civis. Na Itália, o Estado começou a pagar incentivos a bombeiros para cada incêndio extinguido, e se descobriu que alguns deles tinham passado a atiçar incêndios; Recentemente, o estado de São Paulo colocou incentivos para policiais que mandarem drogados se internarem, que apreenderem fuzis etc. Alguém duvida do que vai acontecer?
Há casos em que, se um programa ou um departamento tiver sucesso, deveria fechar. Se o departamento de erradicação da pobreza, o programa de combate ao trabalho escravo, a polícia antinarcotráfico, um ministério da igualdade racial etc. tiverem sucesso na missão, não teriam mais motivos para existir; poderiam e deveriam ser extintos. Se é assim, não há incentivo ao sucesso pleno, e os trabalhadores dessas áreas alegarão que isso ocorre devido à falta de recursos, pedirão para que a meta seja ampliada, ou para que a esfera de atuação do órgão ou programa seja ampliada.
Alguns querem alinhar salários no setor público com quanto se paga no setor privado, mas há diferenças. Um segurança privado é diferente de um policial; um árbitro privado é diferente de um juiz; até um médico em estrutura privada faz coisas diferentes de um médico no setor estatal. Na iniciativa privada, o dilema se resolve com o preço de mercado; no Estado, resolve-se com a força que cada grupo tem para pedir um aumento de salário, por meio de greves e lobismo.
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Ludwig von Mises chega às mesmas conclusões, mostrando que é impossível replicar os mecanismos privados. Ele afirma, por exemplo, que 1. É impossível medir o valor do trabalho de um funcionário público em termos monetários; 2. Sendo assim, as relações entre um funcionário e seu superior acabam se baseando mais em questões pessoais e menos profissionais. A carreira depende mais da simpatia, da lealdade, da afinidade política e da subserviência que dos resultados concretos; 3. E, ainda, os funcionários públicos estão sujeitos ao poder dos superiores e dos colegas até na vida privada. Espera-se que tenham uma vida virtuosa, que apoiem as visões políticas dos chefes e dos ministros, e a possibilidade de apoiar partidos e candidatos de oposição fica muito limitada, para eles e até para os familiares.
Dessa forma, então, para tentar limitar o poder dos chefes sobre seus empregados (e mitigar os efeitos mencionados precedentemente), muitas vezes se estabelecem critérios fixos para a carreira: diplomas, cursos de idiomas, participação em eventos, cursos de formação vários. Mas, em consequência, há funcionários que ficam muito relaxados, enquanto outros se tornam muito hábeis em lidar com esses critérios para alavancar a carreira e acabam focando mais nisso do que no trabalho em si.
Considerem o caso da necessidade que o Estado estabelece de licenças, autorizações e alvarás para se desenvolver várias atividades. Alguém poderia pensar que, quanto mais licenças e autorizações se entregam, mais os funcionários deveriam ganhar; no entanto, o objetivo dessa regulação é exatamente limitar aquelas atividades econômicas! Se o objetivo fosse facilitá-las, o lógico seria extinguir a necessidade das licenças, e extinguir o órgão responsável por emiti-las.
O emprego estatal tem suas peculiaridades; não é possível simplesmente imitar o setor privado
A questão das promoções e demissões por rendimento é ainda mais complicada. Por todos os motivos aqui expostos, o mais provável é que se atribuísse baixo rendimento a quem não é simpático, leal ou alinhado politicamente aos gerentes, enquanto os mais alinhados seriam premiados.
No mundo inteiro, os funcionários estatais são, de fato, (quase) inamovíveis. Isso é normal, e inclusive é importante para que possam se sentir à vontade para denunciar casos de irregularidades, coisa que terceirizados raramente fazem.
Por fim, muitas empresas do setor privado têm metas, mas não foram obrigadas pelo Estado a colocá-las; fazem-no porque é conveniente. Se uma instituição precisa ser obrigada a colocar metas, elas não vão funcionar!
O emprego estatal tem suas peculiaridades; não é possível simplesmente imitar o setor privado.
Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos