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Recentemente, escrevi um artigo dizendo que Lula 3 é pior que Dilma 1, principalmente pelo lado fiscal. Assim como Dilma, o atual governo segue com a expansão do gasto público, subsídios setoriais e linhas de crédito com taxas de juros artificialmente baixas. São várias as semelhanças, com um agravante: a dívida pública agora está em 78,5% do PIB, contra 53,14% do PIB em julho de 2014, e o déficit nominal do setor público chega a 10,02% do PIB, contra 3,46% do PIB em julho de 2014.
Apesar da piora fiscal, há um ponto positivo em relação ao governo Dilma: a inflação hoje está mais controlada. No acumulado em 12 meses, o IPCA está em 4,45%, e a projeção para 2024 em 4,25%. Durante o governo Dilma 1, os números eram bem diferentes. A inflação rondava na casa de 6% a.a., mesmo com represamento artificial de preços administrados, como gasolina e eletricidade.
Se a política fiscal piorou, e a linha econômica de ambos os governos é a mesma (keynesiana, desenvolvimentista), por que agora a alta nos preços segue mais controlada, comparativamente ao período de Dilma Rousseff, mesmo com um mundo mais inflacionário, consequência da pandemia e de conflitos geopolíticos?
A resposta se deve à atuação do Banco Central. Durante o governo Dilma, mesmo com inflação elevada, o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) reduziu a taxa Selic. O movimento despertou a desconfiança do mercado financeiro. Para economistas, analistas, gestores e investidores, o Banco Central, sob a presidência de Alexandre Tombini, sofria pressões políticas de Dilma e do PT para redução da Selic e induzir o crescimento econômico, mesmo com inflação elevada.
Agora, a situação é diferente. Mesmo com toda a pressão política de Lula em cima do atual presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, para reduzir a taxa básica de juros – como se a decisão dependesse apenas dele, e não de mais 8 diretores –, o Copom tem agido tecnicamente no combate à inflação.
Provavelmente, em outros tempos, Lula teria demitido Campos Neto. Porém, após a aprovação da independência do Banco Central em 2020, a demissão do presidente da instituição tornou-se muito mais difícil. Agora, para exonerar do cargo o presidente do Banco Central, é necessária a aprovação da maioria absoluta no Senado. Na prática, o Banco Central se tornou muito menos suscetível a pressões políticas. “Menos suscetível”, porque sempre é possível aparelhar instituições de Estado para que elas ajam conforme os interesses políticos do governo vigente.
Em 2025, o Copom, responsável pela definição da taxa básica de juros, será formado por 7 diretores indicados por Lula, incluindo o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo. Apenas 2 diretores da gestão Bolsonaro continuam.
Resta saber se Gabriel Galípolo, e os demais diretores, agirão de maneira técnica, ou irão agradar o presidente da República, com reduções artificiais de juros, em descompasso com um cenário de piora fiscal e de expectativas inflacionárias.
Até pouco tempo, na reunião de maio de 2024, a desconfiança do mercado em relação à próxima diretoria do Banco Central aumentou, uma vez que os 5 diretores indicados por Bolsonaro votaram pela queda de 0,25p.p. da Selic (10,75% a.a. para 10,5% a.a.), enquanto os 4 diretores indicados por Lula optaram pelo corte de 0,5p.p. (de 10,75% a.a. para 10,25% a.a.). A divergência de votos levou a turbulências no mercado financeiro, com alta do dólar e dos juros futuros.
Curiosamente, a partir daquela reunião, os votos passaram a ser unânimes pela manutenção da Selic em 10,5% a.a. Será que a unanimidade foi obtida por uma convergência de argumentos técnicos, ou foi uma estratégia de comunicação do Copom para evitar novos ruídos no mercado financeiro?
Independentemente da resposta, Gabriel Galípolo tem dado sinalizações de um alinhamento com Campos Neto sobre o combate à inflação
Fica a pergunta se esse alinhamento é apenas uma estratégia, para não ter maiores problemas na sabatina na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado Federal, e também acalmar o mercado, evitando problemas – alta do dólar, com impactos inflacionários - que se voltem contra ele, no momento em que assumir a presidência do Banco Central; ou se reflete, na essência, sua visão no combate à inflação?
A resposta definitiva só teremos a partir de 2025. Por ora, sabemos apenas que este governo se diferencia do governo Dilma pela ótima atuação do Banco Central. Se o Banco Central passar a agir politicamente, a probabilidade de crise econômica se torna muito grande. Está nas mãos de Galípolo e seus diretores evitar uma crise econômica do país. Que Deus tenha misericórdia desta nação.