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Recessão econômica é um daqueles conceitos em economia cuja percepção real da população importa mais que o conceito teórico.
Para a teoria econômica, recessão ocorre após duas quedas do PIB em trimestres consecutivos. Já para a população, recessão significa queda do seu consumo e do seu padrão de vida, seja pela inflação ou pelo desemprego. É quando o pessimismo macroeconômico noticiado pelos jornais começa a ter efeitos na vida cotidiana das pessoas, de forma mais concreta, e menos abstrata.
Por enquanto, apesar da aceleração da inflação, da alta dos juros e do dólar, e da piora fiscal, a taxa de desemprego continua em 6,10%, e o país deverá crescer próximo de 3,5% em 2024, o que não nos coloca tecnicamente em recessão.
Por outro lado, há um pessimismo em relação ao futuro, presente nas projeções macroeconômicas e nos preços dos ativos. As expectativas dos agentes econômicos convergem para uma inflação próxima de 5,00% a.a, taxa Selic ao redor de 15% e dólar a R$ 6,00 para 2025.
Com esse cenário, é possível o país manter um ritmo de crescimento de 3,0-3,5% e desemprego próximo de 6%, com a piora de juros, inflação, contas públicas e câmbio? Não é preciso ser economista para saber que a piora dessas variáveis ameaça a atividade econômica e o mercado de trabalho.
Com a Selic no atual patamar, e a possibilidade de chegar próxima de 15%, segundo projeções na curva de juros e no relatório Focus, o crédito se tornará mais caro e escasso no país, diminuindo o consumo e o investimento das empresas – variáveis fundamentais para alcançar o crescimento econômico.
Além disso, a elevação dos juros poderá trazer grandes prejuízos às companhias. Muitas empresas tomaram dívidas atreladas ao CDI no mercado bancário e de capitais.
Com a elevação da taxa básica de juros, e consequentemente do CDI, é inevitável haver um aumento na inadimplência, com impactos negativos na atividade econômica
Mas não é apenas a elevação do custo de capital que poderá prejudicar o processo produtivo. A alta do dólar também terá efeitos negativos para as empresas.
Muitas firmas importam máquinas, tecnologias e insumos do exterior. Com o dólar a R$6,00, o custo de produção delas aumenta consideravelmente. Como nem sempre é possível repassar todo o aumento do custo no preço, a empresa cortará despesas, o que significa, muitas vezes, demissões.
A capacidade de a empresa repassar os aumentos de custos nos preços dos bens se torna mais difícil com a inflação em alta.
Como o salário da população não acompanha instantaneamente o processo inflacionário (perda de renda real), o consumidor se torna menos propenso a absorver os aumentos de preços, principalmente de bens e serviços menos essenciais.
O cenário é agravado por uma variável de difícil mensuração, mas com impactos significativos no mundo dos negócios: as expectativas. Num clima de maior pessimismo, o empresário retém caixa e adia investimentos. No entanto, se a produção não se expande, ou eventualmente diminui, o país não cresce, e a recessão se concretiza.
O roteiro da crise no Brasil é mais previsível que final de filme de comédia romântica. Sempre começa com a piora das variáveis fiscais (aumento do déficit primário e nominal, e elevação do endividamento público).
Depois, vem a piora das expectativas de inflação, aumento do dólar e dos juros futuros. Em seguida, ocorre a estagnação do PIB. Por fim, o aumento do desemprego – variável considerada “retardada” pela literatura por reagir posteriormente ao ciclo econômico.
Aliás, não tem nada de inovador no roteiro dessa crise. Assistimos a esse filme durante o governo Dilma, com as mesmas políticas econômicas, baseadas na expansão do gasto público, isenções fiscais sem contrapartida de corte de gastos, aumento do endividamento e incremento do crédito via bancos estatais.
Tudo isso para se atingir o crescimento econômico a qualquer preço, sem preocupações inflacionárias e com a sustentabilidade da dívida pública. Busca-se o crescimento imediato, de curto prazo, com políticas fiscais expansionistas, sem responsabilidade com as contas públicas.
No final, o crescimento de curto prazo e os ganhos no mercado de trabalho são anulados pela materialização da deterioração fiscal em crise da atividade econômica. Infelizmente, o roteiro é previsível, mas o final não é feliz como das comédias românticas.
Conteúdo editado por: Aline Menezes