Qualquer comparação entre Donald Trump e Jair Bolsonaro costuma ser esdrúxula, míope e forçada, para dizer o mínimo. Com a divulgação da última pesquisa PoderData 360, a primeira semelhança real emergiu: a possibilidade do último ser também um presidente de um único mandato, um feito inédito no país em que todos que disputaram reeleição até agora conseguiram um novo mandato.
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O resultado da pesquisa seria devastador para as pretensões eleitorais de Bolsonaro se não estivéssemos há mais de 500 dias da eleição. Num país com presidencialismo imperial, autoritário e retrógrado como o Brasil, o chefão do executivo nunca é carta fora do baralho numa eleição. Ele tem poder, caneta e força para reverter qualquer situação, como Lula mostrou ao sair das cordas em 2005 e ser reeleito no ano seguinte.
O levantamento da PoderData 360 é o mais completo do país hoje para quem se debruça sobre pesquisas de opinião pública. São consultas realizadas a cada 15 dias com, no mínimo, 2.500 entrevistados. A pesquisa divulgada anteontem consultou 3.500 eleitores, com margem de erro, segundo o instituto, de 1,8%. É o que temos de mais preciso e confiável no momento para avaliar, como diria Edmund Burke, “os humores do povo”.
As descobertas mais importantes da pesquisa dão o tom da política brasileira nos próximos meses. Lula é franco favorito, lamentavelmente, abrindo nada mesmo que 18 pontos de vantagem no segundo turno sobre Bolsonaro (52 x 34). A rejeição ao presidente atingiu a estonteante marca de 56%, com sua aprovação seguindo na casa de um terço do eleitorado. Mais importante: Bolsonaro não vence um único adversário no segundo turno, mesmo os nanicos, perdendo feio para Lula e Luciano Huck (48 x 35).
O resultado devastador no segundo turno lembra a eleição da França em 2017, quando o candidato de centro-esquerda Emmanuel Macron teve 24% dos votos para presidente, seguido de perto por Marine Le Pen (21%), François Fillon (20%) e Jean-Luc Mélenchon (19,5%). No segundo turno, a migração dos votos de Fillon (direita) e Mélenchon (esquerda) foram todos para Macron, que teve arrasadores 66% dos votos contra esqueléticos 34% da opositora nacionalista.
O “cluster” de apoio de Bolsonaro, grupo que mais apoia o presidente, é composto por homens (41%) entre 45 e 59 anos (40%), moradores da região Sul (48%) com ensino fundamental (37%) e renda acima de 10 salários-mínimos (53%). Alguém falou “tio do Zap”? Sim, é ele. Branco, sulista, meia idade, classe média alta e sem curso superior.
Já quem mais desaprova o presidente é mulher (60%) com 60 anos ou mais (69%), moradoras das regiões Centro-Oeste e Nordeste (62%) com curso superior (66%) e que recebe de 5 a 10 salários-mínimos (60%). Mulheres nordestinas e da região central do país, na terceira idade e com alta escolaridade e de classe média. Pense na alagoana Heloísa Helena, 58 anos, ex-senadora, deputada, vice-prefeita de Maceió e ex-presidente nacional do PSOL, atualmente filiada à Rede de Marina Silva. Dos que receberam auxílio emergencial, 57% rejeitam o presidente.
Na eleição do ano passado, Donald Trump cresceu entre negros e latinos, mas o recuo entre brancos com curso superior foi fatal para suas pretensões políticas. Com este resultado, juntou-se a John Adams, John Quincy Adams, Martin Van Buren, Franklin Pierce, Andrew Johnson, Chester Arthur, Grover Cleveland (que voltaria a vencer quatro anos depois), Benjamin Harrison, William Howard Taft, Herbert Hoover, Gerald Ford, Jimmy Carter e George H. Bush no clube dos presidentes americanos de um mandato só. Não estou contando os que foram assassinados no cargo, evidentemente (Abraham Lincoln, James Garfield, William McKinley e John Kennedy).
Se os números não são nada auspiciosos para Bolsonaro, o que dizer das perspectivas? O morticínio de mais de 350 mil brasileiros pela covid-19, mais de 3 mil por dia em média nos últimos dias, segundo a pesquisa, ainda não se reflete diretamente na popularidade do presidente. Se mais brasileiros passarem a culpar o presidente pelo massacre, seu resultado pode ser ainda pior nas próximas pesquisas. A conferir.
Em Chapecó (SC), no último dia 07, Bolsonaro disse que está “se lixando” para 2022 (acredite quem quiser). Pelos resultados da última pesquisa PoderData 360, ou ele passa a “se lixar” para a próxima eleição ou pode mesmo voltar, de mala e cuia, para o famigerado condomínio Vivendas da Barra em janeiro de 2023.
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