Ninguém imagina que 2020 será lembrado como annus mirabilis. Metade do ano se foi e já temos uma coleção de más notícias que cria créditos para pelo menos uma década de paz, tranquilidade e harmonia. Veremos.
Os livros de história não devem tratar com condescendência o ano do coronavírus, a peste que encurtou em poucos meses a vida de seiscentas mil pessoas, na estimativa oficial mais conservadora até agora, 75 mil no Brasil, entre pragas de gafanhotos e vespas gigantes, incêndios na Austrália, dilúvio em Minas Gerais, ciclone na região sul, a morte trágica de Kobe Bryant e o assassinato de George Floyd, recessão econômica global, sem falar nos abalos sísmicos diários na política brasileira. Mesmo com a esperança de uma vitória de Donald Trump e a conclusão do Brexit para fechar o ano com algum otimismo, é um ano que não deixará saudades.
Se não bastasse esta pequena lista de grandes infortúnios, temos dois lançamentos editoriais que merecem destaque na retrospectiva de 2020: “Capitalismo sem rivais: O futuro do sistema que domina o mundo” (Ed. Todavia), de Branko Milanovic, e “Capital e Ideologia” (Ed. Intrínseca), de Thomas Piketty. Quando o mundo mais precisa de uma recuperação econômica pujantes e rápida, duas obras que usam e abusam do ferramental marxista aparecem para nos lembrar que tudo pode piorar.
Na última segunda-feira (13), estive na bancada do Roda Viva da TV Cultura para entrevistar Branko Milanovic sobre seu novo livro e suas teses para entender a economia mundial atual, além de questionar suas previsões sobre o futuro do que ele chama de capitalismo. Sérvio-americano de 66 anos, Milanovic tem passagens pelo olimpo dos economistas da esquerda mundial, a London School of Economics, e hoje leciona na Universidade da Cidade de NY. É considerado uma das grandes referências em “desigualdade econômica” atualmente e não há veículo da imprensa tradicional que não ofereça generosa cobertura para ele.
A engenhosa tese central defendida por Milanovic em “Capitalismo sem rivais” é que o capitalismo venceu, seguindo a malfadada proposta de Francis Fukuyama em seu livro de triste memória “O fim da história e o último homem” (1992), ou “O Mundo É Plano” de Thomas Friedman (2005), equívocos que marcaram a era “pós-política” da Terceira Via de Bill Clinton, Tony Blair, Felipe González, Lionel Jospin, Gerhard Schröder, Massimo d'Alema, António Guterres, Fernando Henrique Cardoso, entre outros.
O consenso social-democrata, europeu ocidental e elitista, que pensava num mundo governado a partir de Bruxelas e Davos, durou 25 anos e foi devidamente superado em 2016 com o Brexit e a eleição de Donald Trump. Uma nova era populista renasceu nos últimos anos, emergindo dos escombros deste falso consenso de um quarto de século (1990-2015) em que os principais líderes mundiais tentaram transformar o fim a Guerra Fria e a queda da URSS numa vitória da Europa, um delírio que durou até demais.
A debacle social-democrata em 2016 abriu as portas para que os descontentes de todos os lados, que foram alijados do debate público durante os anos anteriores, finalmente mostrassem o que as redes sociais já gritavam desde meados da década anterior. Os novos populistas miraram sua retórica inflamada nas elites globais e nos burocratas sem rosto que “brincaram de Deus” por tempo até demais, ignorando os anseios e demandas legítimos das populações locais sem vez e sem voz nos salões de Bruxelas e Davos.
Representando a esquerda raiz, pós-marxista, que rejeita o consenso social-democrata, autores como Thomas Piketty e Branko Milanovic, pela economia, e Ernesto Laclau e Chantal Mouffe, pela política, foram alguns que buscaram ressuscitar a ideia de luta de classes, do protagonismo do estado como ente de razão político e da ideia de “desigualdade”, um substituto ardiloso para a pobreza que está sendo vencida pelo capitalismo no mundo, com estratégias que chegam ao ponto, como fez o economista sérvio em seu último livro, de classificar o regime comunista chinês como “capitalista político”.
A ginástica mental dos novos marxistas, envergonhados ou não de sua verdadeira origem, terá tanto espaço quando os conservadores, que defendem as boas ideias econômicas sem desprezar as demandas sociais legítimas da população, e os liberais, que defendem abstrações elitistas que ao menos funcionam no campo econômico por um tempo, permitirem.
Não é o caso de desprezar a nova investida de intelectuais muito influentes como Thomas Piketty e Branko Milanovic no debate público, mas estudar a fundo suas obras e refutar, com inteligência, solidez conceitual e dados concretos, suas propostas estatizantes que nunca deram ou darão certo. No máximo, como a Covid-19, conseguem asfixiar por um tempo seus pacientes.
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