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Alexandre Borges

Alexandre Borges

Nem Pacheco, nem Leite. Kassab é Lula

O ex-presidente Lula negocia com o presidente do PSD, Gilberto Kassab, apoio no primeiro turno das eleições (Foto: Divulgação / Ricardo Stuckert)

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Num país onde até o passado é incerto, como disse Pedro Malan, prever cenários futuros é um esporte radical. Na falta de mapas precisos sobre os caminhos da política no Brasil, sobram apenas alguns balizadores como referência. E Gilberto Kassab é um deles.

Kassab é um dos estrategistas mais argutos e engenhosos da fauna política brasileira e, mesmo que seja impossível a ele ou a qualquer um acertar todas, seus movimentos costumam estar bem ajustados aos ventos políticos e prestar atenção em suas articulações nunca é perda de tempo. Nos últimos anos, quem apostou contra Kassab normalmente perdeu e é por isso que tantos analistas e comentaristas tentam desesperadamente antever seus passos e decifrar suas motivações,

Como presidente do PSD, partido sem colorações ideológicas claras e com 35 deputados federais, a quinta maior bancada da câmara, o ex-prefeito de São Paulo é uma noiva cobiçada por todas as correntes que disputam a presidência este ano, mas está cada vez mais claro que seu coração está com Lula, líder isolado das pesquisas e que goza de uma vantagem muito folgada em relação aos principais adversários.

Apenas para constar, o PSD exibe como pré-candidato à presidência o anódino Rodrigo Pacheco, político provinciano que não deverá ser mais que uma nota de rodapé na história política do Brasil - e parece feliz e confortável no papel de elenco de apoio de Brasília, mesmo ocupando a presidência do senado.

Eleito com apoio de Bolsonaro para derrotar os grupos de Davi Alcolumbre e de Renan Calheiros, o mineiríssimo Pacheco tem se esforçado para não criar arestas com ninguém e gastar o tempo de seu mandato sendo o mais inexpressivo e discreto possível, tendo mostrado empenho em raras ocasiões como na tentativa de solucionar o impasse das famigeradas emendas de relator. Até agora, não exibiu qualquer requisito e vontade real de pleitear a presidência da república.

Com o esvaziamento do primeiro balão de ensaio pessedista, Kassab planta na imprensa que seu objetivo é atrair o governador gaúcho Eduardo Leite, político com quem tem evidentes afinidades e que, ao que tudo indica, estaria disposto a se prestar ao papel de criar mais um nome na já congestionada terceira via. Sua função seria repetir o papel do centro em 2018, quando Geraldo Alckmin, João Amoedo, Marina Silva e Álvaro Dias não conseguiram 10% dos votos. Somados.

O jovem governador tucano, de apenas 36 anos, parece não perceber a péssima sinalização que passa para a classe política ao se submeter a um processo de prévias partidárias em seu partido, perder e depois cogitar o abandono da agremiação para ser candidato no PSD, deixando seus apoiadores internos numa saia justa que não será esquecida ou perdoada tão cedo.

Estaria Leite com receio de disputar a reeleição estadual e preferindo uma derrota honrosa no pleito presidencial que daria a ele uma relevância nacional? É perfeitamente possível e uma estratégia defensável no curto prazo, mas nada dignificante para sua curta biografia no longo prazo. Se ele vier a liderar uma debandada em massa de quadros tucanos para o partido de Kassab, sua imagem pode sair ainda mais chamuscada.

O que importa, afinal, é saber de onde vem a obsessão de Gilberto Kassab com o lançamento de uma candidatura própria. E a resposta tem apenas quatro letras: Lula. O líder do PSD está jogando junto com o líder das pesquisas numa estratégia ardilosa para rachar o centro e ajudar Lula a conseguir os poucos pontos que para liquidar a fatura já no primeiro turno. Divide et impera.

Lula, segundo as pesquisas, está a poucos pontos de uma vitória acachapante já no próximo 2 de outubro, e como Bolsonaro parece ter um teto de crescimento, um racha no centro democrático, ou na terceira via, é tudo que ele precisa para não ter que se submeter a uma guerra campal com o presidente Bolsonaro num segundo turno que pode ser o mais sujo e violento da história do país. Não é à toa que tanto se fala, nos corredores do Congresso, de que uma vitória de Lula no primeiro turno "pacificaria o país".

Políticos experientes e bem sucedidos costumam falar mais por ações do que por palavras e, a despeito das declarações, Kassab parece mesmo empenhado em servir como um agente de divisão das forças de centro, tirando delas os votos necessários para que Lula conquiste o terceiro mandato já no início de outubro. Ele sabe que sacramentar uma aliança com Lula já no primeiro turno enfraquece seu poder de barganha, além de fomentar um motim interno com os antilulistas do seu partido, especialmente no sul do país. Por isso, o apoio velado é a opção preferível no momento, com as previsíveis negativas em público.

Pacheco deve desistir oficialmente de sua natimorta pré-candidatura até março e Leite já conversa abertamente com o PSD, o que deixou seus antigos aliados no PSDB de cabelo em pé esta semana. Leite já serviu a Aécio Neves para enfraquecer Doria nas disputas internas e agora parece pronto para servir de massa de manobra de Kassab para favorecer Lula, outro papel incompatível com um político tão promissor como ele.

Diversas lideranças do PSD, como os senadores Omar Aziz, Otto Alencar e o prefeito Alexandre Kalil, não seriam empecilhos para um acordo com Lula. Eduardo Paes, prefeito do Rio, não engole os acenos de Lula a Marcelo Freixo na disputa do governo do estado este ano e ainda está reticente, fazendo inclusive movimentos de aproximação com Ciro Gomes como forma de pressão e rebeldia. Mesmo assim, dificilmente conseguirá impedir o rolo compressor lulista no seu partido.

Kassab está apostando alto e convém não subestimar sua capacidade de leitura do jogo político. Lula está numa posição confortável, mas há um forte sentimento antipetista na sociedade, especialmente nas classes médias, que ainda não foi despertado e que pode, ao longo da campanha, tirar pontos do líder das pesquisas e fortalecer um nome da terceira via ou até o presidente atual que, com todos os problemas sabidos possui, ao menos, um forte recall como contraponto ao petismo.

O jogo ainda não está jogado e um segundo turno entre Lula e Bolsonaro ou um candidato da combalida terceira via não pode ser totalmente descartado, mas Kassab pode ser o que faltava para que o petista tenha sua primeira vitória no primeiro turno. O ano está apenas começando, mas a campanha já pega fogo. E Kassab não é bombeiro.

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