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Pesquisas costumam estar certas para quem sobe e erradas para quem derrete. Como no velho adágio, “pesquisas são como postes de luz, iluminam os sóbrios e servem de apoio para os bêbados”. Mais uma eleição, mais gritaria contra os vilões de sempre. Hora de colocar a bola no chão.
Antes, uma ressalva importante: o eleitor muda de ideia ao longo da campanha sim, é para isso que a campanha serve. Nem sempre as alterações nos números significam “manipulação” ou “conta de chegar”, mas a competência ou não do candidato. Alguém disse Celso Russomanno e a “ama de leite negra”? Ou Alckmin em 2006 com o macacão de estatais?
Se o movimento dos candidatos nas pesquisas ao longo da campanha pode ser explicado, em parte, pelo que eles próprios fazem, como justificar erros grosseiros de resultados divulgados na véspera ou no dia da eleição? E estes erros são mais ou menos comuns do que se costuma alardear? Mesmo que raros, dezenas de acertos atenuam os erros?
Para o Ibope divulgado na véspera da eleição para a prefeitura de São Paulo (votos válidos), aquele tipo de pesquisa com uma capacidade direta de influência na preferência do eleitor, Bruno Covas aparecia com 38%, Guilherme Boulos com 16%, Celso Russomanno e Márcio França com 13% (1.204 entrevistas, margem de erro de 3%). O Datafolha trouxe números parecidos (votos válidos): Covas com 37%, Boulos com 17%, França com 14% e Russomanno com 13% (2.897 entrevistas, margem de erro de 2%).
Comparei estas pesquisas de sábado (14/11) com os resultados das urnas, calculando uma média ponderada que leva em conta o tamanho das amostras de cada instituto:
O cálculo pode surpreender muita gente, mas o grande erro foi a favor de Bruno Covas (PSDB), que teve uma votação 4,44% inferior do que a prevista pela média ponderada das pesquisas Ibope e Datafolha de sábado. O mais prejudicado foi Guilherme Boulos (PSOL) com um desempenho 3,53% superior nas urnas do que indicado pelas pesquisas. Os números de Márcio França foram de uma precisão milimétrica e Celso Russomanno acabou obtendo uma votação 2,5% inferior àquela projetada pelos dois principais institutos do país.
Os erros registrados indicam dolo ou “manipulação” dos institutos? Não necessariamente. É preciso considerar que as diferenças, não tão grandes, podem ser explicadas por movimentos de última hora na preferência real do eleitor. A votação de Arthur do Val (Patriotas), por exemplo, foi subestimada ao longo da campanha e parte de seus votos pode ter sido uma migração de última hora de eleitores de Covas. A subida de Boulos pode ser atribuída a um voto útil de esquerda que desidratou a candidatura Jilmar Tatto (PT).
Se houve alguma manipulação intencional, o que não acredito, beneficiou Bruno Covas e prejudicou Guilherme Boulos, um resultado que contradiz as teorias conspiratórias das tias do zap, influenciadores com chapéu de alumínio, templários virtuais e microfones de aluguel. A diferença, neste caso específico do primeiro turno de São Paulo, é perfeitamente explicável e não dá margem para quem vê nos institutos de pesquisa instrumentos malignos de uma conspiração comunista para controlar ou influenciar a opinião pública.
Você pode fazer esta conta facilmente e checar como foi na sua cidade. Basta pegar o resultado de uma ou mais pesquisas divulgadas na véspera da eleição, considerar os votos válidos e o tamanho de cada amostra, calcular a média ponderada e comparar com o resultado das urnas.
Uma diferença de resultado como a de São Paulo é um banho de água fria na cabeça dos teóricos da conspiração. Se pesquisas servem de apoio para os bêbados, talvez seja exatamente o que estejam precisando.