Por Guilherme Macalossi
Acima de tudo, a entrevista que Ives Gandra Martins concedeu ao “Imprensa Livre” é uma radiografia precisa da crise entre os poderes. O jurista, que se notabilizou por ser um dos mais severos críticos do ativismo jurídico, aponta para os riscos da teoria neoconstitucionalista, que, na prática, faz com que o Judiciário se torne um legislador positivo.
“Na prática, o que nós tivemos foi uma corrente denominada neoconstitucionalismo, ou neoconsequencialismo. As decisões têm que examinar a consequência melhor para o país em função desses decisões. O Judiciário passou a ter uma atuação além das suas competências, além da Constituição”, disse.
Gandra Martins lembra das audiências públicas que participou durante a constituinte de 1987. Ele afirma que o objetivo era fazer do Judiciário um legislador negativo, exercendo apenas seu controle de constitucionalidade.
Ao longo dos últimos anos, essa mudança na linha de atuação, que tem sido protagonizada principalmente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), resultou em uma série de invasões de competência. Não foi apenas uma vez que a Corte tomou as atribuições que seriam do Congresso Nacional. Ives Gandra destaca alguns desses casos:
“Eles legislaram a infidelidade partidária. O Art 17 [da Constituição] dava a cada partido o direito. Legislaram no casamento de homossexuais. E não tenho preconceito nenhum contra os homossexuais, mas, de qualquer forma, o casamento é entre homem e mulher, a união estável é entre homem e mulher. É o que está na Constituição. (…) Quando o Supremo declarou, por exemplo, o aborto do anencéfalo. O Código Penal só permite a impunidade do aborto terapêutico (salvar a vida da mulher), o aborto sentimental por estupro . O eugênico não estava lá. Criaram um novo tipo”, afirmou.
À medida que o STF tutela os demais poderes, também cria uma distorção no equilíbrio institucional, o que coloca em risco a estabilidade e a segurança jurídica país. Gandra Martins alerta para os riscos e consequências do aprofundamento dessa situação:
“Se num determinado momento um poder resolver não obedecer decisões do Supremo por invasões de competência, e pode ( o Art. 49, inciso XI da Constituição declara o seguinte: que cabe ao poder Legislativo zelar pela sua competência normativa perante os outros poderes), (…) o que vai fazer o Supremo? Mandar prender? E o que cabe ao poder Legislativo? Recorrer pelo 142 [Art da Constituição] às Forças Armadas. As Forças Armadas declaram no 142 que são três as funções das Forças Armadas: defender a pátria, garantir os poderes constituídos e repôr a lei e a ordem a pedido de qualquer dos poderes.”
Acompanhe a íntegra da entrevista que Ives Gandra Martins concedeu a Alexandre Borges. Na conversa, além do conflito entre os poderes, o jurista também analisa o processo de condenação de Lula pelo então juiz Sérgio Moro.
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