Depois de quase trinta anos sem eleições presidenciais, a disputa entre Fernando Collor e Lula terminou de forma apoteótica num debate que entraria para a história. Praticamente empatados nas pesquisas, o momento serviu para Collor superar de vez o adversário e se tornar o primeiro presidente do país eleito depois da redemocratização.
Os dois candidatos se enfrentaram num debate que deu à luz a uma das maiores lendas urbanas do país: o Jornal Nacional do dia seguinte teria favorecido Collor e decidido a eleição a seu favor. A esquerda não é conhecida como boa perdedora e a criação de uma narrativa que culpasse a Rede Globo, a “emissora da ditadura”, pelo resultado desfavorável, serviria perfeitamente como ração ideológica e estímulo para a militância. Funcionou.
Roberto Marinho (1904-2003), dono e presidente da emissora, nunca escondeu sua preferência por Fernando Collor no segundo turno daquela eleição, mas culpar a edição do Jornal Nacional pelo resultado é uma piada de mau gosto. Lula foi atropelado por Collor e uma edição honesta deveria mostrar o que aconteceu, assim como o 7×1 que levamos da Alemanha na Copa do Mundo não poderia ser mostrada como um empate. Lula estava abalado por conta das ameaças de revelação de algum escândalo em pastas que Collor mexia o tempo todo durante o programa e quem deve, teme.
Quando Marinho morreu, Lula decretou três dias de luto oficial no país e fez elogios a ele já comemorando a chegada dos herdeiros ao comando do maior grupo de comunicação do país. Motivos não faltariam. Desde então, o grupo deu uma guinada ideológica e caminha cada vez mais para a esquerda, cuspindo na memória do fundador. A Globo faturou bilhões e tem o tamanho que tem por conta, em grande parte, do regime instaurado em 1964 e que hoje seus herdeiros renegam, sem fazer qualquer menção a devolver o dinheiro, o poder e a influência conquistados no período.
Você não gosta de mim, mas sua filha gosta
Ela gosta do tango, do dengo, do mengo, domingo e de cócega
Ela pega e me pisca, belisca, petisca, me arrisca e me enrosca
Você não gosta de mim, mas sua filha gosta
E nada como um dia após o outro dia
Pro meu coração
E não vale a pena ficar, apenas ficar
Chorando, resmungando até quando, não, não, nãoE como já dizia Jorge Maravilha
Prenhe de razão
Mais vale uma filha na mão do que dois pais sobrevoandoChico Buarque
A TV Globo e seu principal jornal, O Globo, agora dizem que o “apoio editorial ao golpe de 64 foi um erro”. A ingratidão com o regime que é, no mínimo, co-responsável por sua trajetória de sucesso, é cada vez maior, como no panfleto ideológico “Os Dias Eram Assim” que está no ar. Mesmo assim, os herdeiros bilionários do grupo continuam querendo perdão por “pecados” cometidos no passado.
A penitência da vez é a edição do depoimento de Lula ontem para o juiz Sérgio Moro. O mesmo Lula, quase 28 anos do debate com Fernando Collor, só que agora líder espiritual e político de praticamente toda a classe jornalística e artística do país. A oportunidade de acertar as contas com um pecado que só existe na cabeça da esquerda brasileira não poderia ser desperdiçada e não foi.
A semana começou as capas infames da Veja e da Istoé colocando Sérgio Moro e Lula como combatentes políticos em igualdade, como se o juiz não estivesse representando a justiça, a lei e a ordem, e o outro sendo ouvido por conta de uma lista de denúncias e escândalos que já teria mandado qualquer outro menos poderoso para a cadeia.Os telejornais da TV Globo passaram o dia de hoje mostrando um Lula perseguido, acuado e vítima.
A edição claramente tentou exorcizar os fantasmas de 1989, uma atitude que nunca tratará a simpatia da esquerda e aumentará ainda mais a distância entre a emissora e o país que quer ver Lula respondendo as acusações e sendo responsabilizado por elas.
A Globo, como sempre, está na contramão da história.
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