Comecei a escrever este artigo meia hora depois de o ex-governador do Distrito Federal e ex-senador José Roberto Arruda ter me perguntado que rumo eu prevejo para o Brasil. Respondi que não tenho bola de cristal, porque nosso rumo é impossível de prever. E citei Pedro Malan, como havia citado, horas antes, com o ex-presidente Bolsonaro: “No Brasil, até o passado é imprevisível”. Argumentei que, com uma população indiferente a grandes questões e objetivos nacionais, cujas elites igualmente mal conseguem observar a periferia de seus umbigos, é impossível identificar qualquer rumo para um país. Sem espírito público, sem consciência social e nacional, sem ativismo cidadão, sem objetivos, com uma passividade quase masoquista, é impossível perceber um rumo para o Brasil, a não ser um marchar vagabundo (no seu stricto sensu), andando cada passo sem saber para onde vai.
Se tivéssemos fidelidade à Constituição, pelo menos teríamos uma disciplina sobre o andar para o dia de amanhã, mas até disso fomos privados. O guardião da Constituição passou por cima dela e se tornou mais importante que ela; faz as regras sem perguntar aos que representam o que seria o poder originário, o Legislativo, que recebeu a procuração do voto da origem do poder. A omissão dos que juraram defender e manter a Constituição contribui para esses desvios de rumo. Quem poderia corrigi-los, o Senado, está congelado por um presidente igualmente inerte. Aí o presente e o futuro rumam “qual pluma ao vento”, como a ária da ópera.
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Aí, tudo aqui é imprevisível. Ninguém sabe o que pode ser o dia seguinte. Podemos amanhecer com um general de quatro estrelas preso por ter recebido um telefonema; podemos acordar com o dólar acima de R$ 6, ou com a picanha ainda mais longe. Pode morrer no presídio um preso por se manifestar, que só vai abalar os que vivem a cidadania, mas nunca os responsáveis pela morte. E as instituições permanentes de Estado entram em letargia, como se não fossem responsáveis pela manutenção da lei. Os representantes do povo, que juraram manter e defender a Constituição, vivem seu próprio mundo de interesses egoísticos, e lavam suas mãos sobre o futuro de seus filhos, netos e bisnetos. Parece haver uma alienação geral.
O poder faz, volta e meia, lancetadas, para saber se a cidadania ainda sobrevive a tantas amputações de direitos, e se ouvem apenas gemidos. A liberdade de expressão vai sendo sufocada; busca-se suprimir a vedação à censura, relativizar a inviolabilidade do mandato parlamentar, sepultar o devido processo legal, inverter a relação Estado-nação. Pois, como se sabe, o Estado só existe para servir a nação; só se justificam impostos se for para prestar bons serviços à nação – e não para sustentar o Estado ineficiente. E, assim, sem norte, sem rumo, sem saber para onde vamos, passamos de um dia para o outro, sem perceber que no caminho vamos afundando em areias movediças.
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