Os fins justificam os meios? A ministra Cármen Lúcia pensou que sim, quando, às vésperas do segundo turno, justificou a censura “em caráter excepcionalíssimo” mesmo após sua convicção expressa num “cala a boca já morreu”. Agora, com o fim de reforçar a Previdência Social, os meios são acordos que anulam decisões claras do Legislativo. O Congresso Nacional dos representantes do povo e dos estados aprovou a prorrogação, por quatro anos, da desoneração da folha, vigente desde 2011, nos tempos de Dilma. Em 2020, Bolsonaro vetou a prorrogação, mas o Congresso derrubou o veto e o seu governo acatou a vontade do Legislativo. Agora, não.
Foi marcante a vontade dos representantes do povo: 430 deputados votaram a favor e só 17 contra. No Senado, foi quase unânime, em votação simbólica. O presidente Lula vetou, e o veto foi derrubado no Congresso por eloquentes 60 a 13 entre os senadores, e 378 a 78 entre os deputados. Ainda assim, o presidente baixou uma medida provisória contrariando a vontade dessas maiorias. A MP ficou parada, nem foi considerada, por motivos óbvios. Então, o governo apelou ao Supremo, alegando inconstitucionalidade de se criar renúncia fiscal sem apresentar impacto orçamentário. Estranho ser agora inconstitucional, após uma dúzia de anos de vigência pacífica.
Pela paz imposta entre os poderes, sacrificou-se o primeiro deles, o Legislativo. Só falta a missa de réquiem
Argumentando que já estava com o ministro Cristiano Zanin uma ação semelhante, o governo pediu que o recurso, com pedido de liminar, tivesse como relator o ex-advogado pessoal de Lula. E Zanin concedeu a liminar. Um homem, sem voto, contrariou 438 representantes votados. Desespero em 17 setores que empregam mais de 9 milhões de pessoas e em prefeituras de pequenos municípios. Sem conseguir pagar 20% sobre a folha de abril – a recolher até 20 de maio –, muitos teriam de desempregar, diminuindo o tamanho da folha. No Brasil, paga-se imposto até para dar emprego. Para cada R$ 1 mil de salário pode-se pagar até R$ 1,6 mil.
Aí, inventou-se um jeitinho, ignorando as decisões do Legislativo. E pior, com a participação dos presidentes do Senado e da Câmara, como se eles fossem os donos dos votos dos deputados e senadores. Os dois atenderam à reivindicação de Lula e Haddad, e contrariaram 438 parlamentares. A pressão que empurrou Pacheco e Lira veio do Supremo. Já havia cinco votos para anular as decisões do Congresso, só faltando um. Acertaram com o Supremo a suspensão da ação, em favor do acordo que vai reonerar a folha anual e gradualmente a partir de 2025 até chegar a 20% em 2028. Pela paz imposta (pax romana) entre os poderes, sacrificou-se o primeiro deles, o Legislativo. Só falta a missa de réquiem pelo parlamento.
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