Muita gente, assim como eu, fica sem entender como é que 60 milhões de eleitores brasileiros disseram “eu prefiro a volta daqueles 14 anos”. Foi o tempo da maior roubalheira que o país já teve. A maior da história. Todos os escândalos, ministros presos, tesoureiros do PT presos. O próprio ex-presidente foi preso. A presidente foi “impichada”. Foi um escândalo atrás do outro.
E isso envolveu estatais, ministérios, empreiteiras pagando propina, tudo. E 60 milhões de brasileiros disseram “eu quero isso de novo”. Não dá para entender. Eu me lembro do Alckmin dizendo que Lula queria voltar à cena do crime, que era a volta dele ao poder. Está aí, Alckmin hoje é o vice-presidente da República a partir do próximo dia 1.º de janeiro.
Não contesto o resultado da eleição. Mas ele mostra que o Brasil está dividido. Foi meio a meio, 51 a 49, praticamente. Mas eu fico sem entender. Por que as pessoas, já tendo conhecido, já sabendo como é um governo do PT, quiseram isso de volta? É difícil de a gente entender. Tem muita gente que diz que as pessoas votam nos candidatos com os quais mais se identificam pelo caráter. Aí é até meio cruel imaginar uma coisa dessas. Mas está aí o resultado. Na democracia cada pessoa vale um voto.
Foi o Nordeste que deu a vitória a Lula
E foi o Nordeste que deu a vitória para o Lula. A diferença no Nordeste foi tão grande que Bolsonaro não conseguiu anular essa diferença em São Paulo, nos estados do Sul, no Rio de Janeiro, no Centro-Oeste. Em Minas Gerais foi praticamente empatado. Antes, estranhamente, Lula havia ganho de Bolsonaro, embora os eleitores mineiros tivessem reeleito Romeu Zema.
Para governador, a grande surpresa foi no Rio Grande do Sul. O PSDB reelegeu Eduardo Leite, que renunciou para ser candidato a presidente da República e disse que não ia ser mais candidato lá, mas convenceu os gaúchos e vai ser de novo governador.
Presidente eleito vai ter oposição muito grande
Como serão esses quatro anos? Em 2 de outubro a centro-direita teve 70% da Câmara dos Deputados e 67% do Senado. É capaz até de fazer mudanças na Constituição, que exigem 60% nas duas casas, e já tem mais que isso.
O novo presidente terá uma oposição muito grande. Sem contar os governadores que foram eleitos e que estão afinados com Bolsonaro. Certamente Bolsonaro será o grande líder da oposição nesses próximos anos. E o novo Senado vai querer saber por que o Supremo Tribunal Federal saiu da Constituição por tantas vezes, assim como o Tribunal Superior Eleitoral.
Poderes estabelecidos pela Constituição são independentes
Não serão anos fáceis. O primeiro ano, acho, vai ser muito conturbado. É o que aparenta. Vamos, enfim, aguardar o que pode acontecer, mas foi um resultado que, de novo, mostra um país dividido. E os brasileiros estão com ânimos exacerbados. A gente tem visto confrontos nas ruas, numa espécie de raiva um do outro.
Não vou discutir vitimismo, ou dizer que Bolsonaro foi massacrado pelo STF, pelo TSE, por grande parte da mídia. Não vou discutir isso. Mas vou discutir outras coisas. Falando com ministros do STF, assim como com ministros aposentados, estão achando tudo muito estranho da forma como foi feito.
Inventaram uma territorialidade lá que nunca foi aplicada na história do Brasil. Exigiram a anulação de um processo porque não foi para o endereço certo. Isso depois de condenações e revisões do processo. O condenado já estava pagando, cumprido pena. Nunca se viu isso na história do Judiciário. Essa territorialidade é aplicada quando se está no início de um processo, quando se descobre isso antes de haver um encaminhamento maior do processo.
Os juízes sabem muito bem disso, os estudantes de Direito também. Mas, enfim, são coisas que têm de ser resolvidas à luz da Constituição, que diz, no seu segundo artigo, que há poderes independentes. Um é o Judiciário, outro é o Legislativo, que de tão importante vem até em primeiro lugar. O Legislativo é o que faz as leis, é o que pode mudar a Constituição, se não for cláusula pétrea. E não o Judiciário. São coisas que precisam ser resolvidas. O Ministério Público precisa voltar a ter o papel que foi deixado de lado. Se não, vamos continuar fora da lei.
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