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Tancredo Neves (esq.) abraça José Sarney (dir.), seu candidato a vice na disputa pela Presidência da República em 1985.
Tancredo Neves (esq.) abraça José Sarney (dir.), seu candidato a vice na disputa pela Presidência da República em 1985.| Foto: Gervásio Baptista/Divulgação

Num 12 de agosto, há exatos 40 anos, o PMDB, reunido em convenção nacional, escolheu Tancredo Neves e José Sarney para concorrerem à Presidência da República, na sucessão de João Figueiredo. Tancredo me contou que, a pedido de Ernesto Geisel, tinha ido a Montevidéu convencer o então vice-presidente João Goulart a aceitar o parlamentarismo, para poder voltar ao país e assumir a Presidência, surpreendido que fora, enquanto estava na China, com a renúncia do presidente Jânio Quadros. Já Sarney, o vice da chapa, tinha sido destaque na “banda de música” da UDN, partido da direita considerado reacionário pela esquerda; depois, ingressou no partido criado pelo movimento de 1964, a Arena, onde ficou por todo o governo militar, até a mudança de nome para PDS, de que foi presidente. No ocaso do governo militar, criou com o vice-presidente da República Aureliano Chaves e Marco Maciel a Frente Liberal, e filiou-se ao opositor PMDB, para ser candidato a vice e se tornar o primeiro presidente após o período militar.

Não sei se os leitores que não testemunharam isso tudo, como eu testemunhei, vão entender. Creio que não, porque até para quem viu há dificuldade de crer. Tenho uma vantagem: não me surpreendo com o que vejo hoje. No dia em que nasci, o ditador Getúlio Vargas baixava um decreto-lei para ele próprio nomear o presidente do Supremo. E o que ele nomeou, quando Getúlio foi derrubado e o Congresso inexistia, foi indicado pelos militares para ser presidente interino. Era José Linhares, que aproveitou para nomear tantos parentes que o trocadilho em voga era “os Linhares são milhares”. 

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Já não me surpreendo quando nem mesmo o nome do país é desrespeitado, porque “República Federativa do Brasil” é apenas um rótulo escrito na Constituição, como muitos outros, já que na prática é uma república unitária, pois os estados têm pouca autonomia e dependem da capacidade de pedir recursos para o governo federal. Aliás, se formos ampliar a exigência, vamos achar que “República” também é marca de fantasia. Tanto quanto a marca de “Nova República”.

Nova em quê? Liberdades? Com fiscal do Sarney prendendo gerente de farmácia e de supermercado? Polícia Federal entrando no pasto para prender boi gordo? Depois veio Collor e congelou a poupança; metas de primeiro mundo e métodos de terceiro. Itamar, o nosso Truman, surpreendeu para o bem. Um ministro dele era suspeito, foi demitido, provou inocência e voltou. Itamar assinou o real, que já deixou de ser plano para ser cotidiano, no que foi a maior revolução desde a volta do poder aos civis. Ficamos, depois, entre tucanos e petistas, como tendo de optar entre Coca e Pepsi. E descobrimos que tínhamos anões no orçamento, vampiros de ambulâncias, mensalões tucanos e petistas, e uma grande Lava Jato. Juntaram-se mais drogas, com o crescimento do narcotráfico e da impunidade.

No despertar da reação dos que estavam passivos no berço esplêndido, resistimos ao teste da pandemia, que tentou matar o emprego, a economia, mirando no governo. A crueldade da época foi tanta que não queriam que as pessoas se tratassem e fossem curadas. Hoje pelo menos sabemos quem foi que conseguiu enganar a maioria. E vimos um grande engodo, o do fim da impunidade. Pobre Lava Jato da nossa desesperança! Na Constituição, feita com ufanismo para o nosso futuro, está escrito que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza; que é garantida a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à propriedade, que é livre a manifestação do pensamento. Mas, como fazia o ditador Vargas, está tudo cancelado, e só se ouve o silêncio medroso e cúmplice.

Conteúdo editado por:Marcio Antonio Campos
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