O deputado Daniel Silveira (União Brasil-RJ) subiu à tribuna da Câmara na semana que passou para reclamar do não cumprimento da Constituição por parte de ministros do Supremo Tribunal Federal. Foi um discurso ousado. É bom lembrar que ele já esteve preso, injustamente, por ordem do próprio STF.
Silveira foi detido um ano atrás, às 11 horas da noite, em casa, embora o artigo 5º da Constituição esteja escrito que a casa é o asilo inviolável do cidadão, a menos que ele esteja em flagrante delito. Mas o ministro Alexandre de Moraes inventou um tal de flagrante continuado, pelo fato de as ofensas feitas a ministros do STF estarem em um vídeo na redes sociais.
Na tribuna, Silveira usou uma linguagem muito dura, mas a Constituição diz, no artigo 53, que deputados e senadores são invioláveis por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos. Não estou dizendo que concordo com a linguagem dele, mas sim que a gente tem que defender a Constituição. Se não, estamos perdidos, não haverá nada mais para nos defender.
Ainda em seu discurso, o deputado perguntou se não entendiam o que significava a palavra “quaisquer”, porque ele foi preso mais de uma vez por suas opiniões, algo que a Constituição lhe assegura. Posso discordar do estilo e do que ele disse, mas está garantido na lei, o que é que se pode fazer? Temos que seguir a Constituição, ipsis literis, assim como está escrito, porque ela é cidadã, ela é muito clara.
Pois bem, depois dessa fala na tribuna, a subprocuradora da República Lindôra Araújo oficiou ao Supremo para que Silveira volte a usar a tornozeleira eletrônica e que não possa sair de Petrópolis, onde mora, ou de Brasília. O ministro Alexandre de Moraes, alvo das críticas do deputado, aceitou o pedido do MP.
Lindôra chegou a escrever no pedido que o parlamentar tenta abolir a democracia, o que é sem dúvida um exagero. Eu acho que a abolição da democracia pode se dar, pouco a pouco, quando não se respeita a Constituição, porque ela é o cerne da democracia.
Leis casuísticas
Tenho pena do Tribunal Superior Eleitoral que terá de aplicar nesse ano leis casuísticas, será uma loucura. A cada eleição surge uma lei especial. Está escrito na lei: não pode fazer propaganda eleitoral antes de 15 de agosto.
Com base nisso, o Partido Liberal reclamou que num festival de música lá em São Paulo foi mostrada uma bandeira do Lula e falado mal do presidente Jair Bolsonaro. Um juiz do TSE, que é também do Superior Tribunal de Justiça, proibiu manifestações políticas no festival e determinou multa de R$ 50 mil por vez que essa decisão seja descumprida.
Mas o que é propaganda eleitoral? Segundo os juristas, é pedir claramente voto para um candidato e recomendar que não se vote em outro candidato. Qualquer dessas duas opções é propaganda eleitoral e o resto não é. Fazer apologia de pessoas, de ideias, de doutrinas, etc, não é, mas é um negócio muito subjetivo.
Por exemplo, o ex-presidente Lula foi a Niterói (RJ) neste fim de semana comemorar o centenário do PCdoB. Estavam lá vários políticos: a presidente do PT, Gleisi Hoffmann; o ex-ministro Aloisio Mercadante; o ex-senador Lindbergh Faria; o deputado Marcelo Freixo; a ex-deputada Manuela D’Ávila; e o governador de Pernambuco, Paulo Câmara, do PSB. O evento chamava-se festival vermelho e Lula fez discurso falando mal do adversário e bem do governo dele, enfim.
Ao mesmo tempo, no domingo, teve um evento do PL no Centro de Convenções de Brasília para filiação de apoiadores de Bolsonaro que serão candidatos. Também teve discurso de Bolsonaro, que disse que a luta neste ano não será entre a direita e a esquerda, mas entre o bem e o mal.
Estavam lá aliados dele que serão candidatos: João Roma ao governo da Bahia; Tarcísio Freitas ao governo de São Paulo; Gilson Machado ao Senado por Pernambuco; e Marcos Pontes a deputado por São Paulo. O ministro Braga Netto, provável vice de Bolsonaro, não foi ao evento para evitar qualquer enquadramento na lei.
Então, são manifestações políticas e eleitorais. Mas a lei quer restringir o que está liberado pela Constituição, que fala na livre manifestação do pensamento, das ideias, da expressão, sem censura, e a lei tenta censurar. Esse vai ser um problema sério para o TSE, porque ele é o tribunal da apelação, que terá sempre que resolver esse tipo de conflito.