O ministro do STF Flávio Dino.| Foto: Fellipe Sampaio/STF
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O ministro do STF Flávio Dino, dando uma palestra para estudantes na segunda-feira, insistiu em que o Congresso deveria revisar a cláusula básica da internet, o Marco Civil da Internet, que foi discutido durante muitos anos. Eu mesmo fiz vários programas na Globo News durante a tramitação do projeto, ouvindo as pessoas. Chegou-se a um texto ideal, aprovado em 2014 pelo Congresso Nacional e sancionado pela presidente Dilma, que concordou também.

Mas há um medo muito grande da democracia. A democracia é a voz do povo; quando o povo não tem voz, não é democracia. Mas por que estão com medo da voz do povo? Porque ela é a voz do poder, a voz do mando. A Constituição diz que “todo poder emana do povo”. Não é democracia se o poder não emanar do povo e não for estabelecido em função do povo, a serviço do povo. Isso é democracia: um Estado a nosso serviço – governo municipal, estadual, federal, com todos os seus integrantes. Os servidores de um governo são servidores do público.

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Estamos vendo essa insistência – porque não é apenas Flávio Dino; o presidente do Supremo já disse a mesma coisa –, em que toda hora vemos essas vozes que temem a voz do povo, temem a opinião, temem a crítica, o que é de uma burrice incrível, supina, porque o que mais me beneficia na vida é a crítica. A crítica é benéfica. O aplauso pode ser estimulador, mas também pode ser enganador; a crítica não. Só não confundam crítica com grito, ofensa, adjetivo, interjeição. Isso não é crítica. Crítica é argumentação: “eu não gosto do que você disse por isso, por isso e por isso”. Em geral o que acontece é o “não gosto de você”, que prejudica todo o resto. Vocês não veem aqui nada do tipo “não gosto de você”. Eu posso não gostar do estilo de alguém, das ações de alguém, mas isso está à parte da pessoa.

Derrubar sistemas de comunicação é coisa de ditadura

E aí vemos coisas como essas que os ministros Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes já disseram, em palestras também: que os satélites da Starlink, de Elon Musk, estavam invadindo a soberania brasileira. Eu não sei se eles nasceram agora; eu nasci em 1940 e ouvia, assim como meus pais e meus avós, emissoras da Argentina, do Uruguai, da França, da Alemanha, dos Estados Unidos, da Inglaterra, tudo por ondas curtas. Ninguém reclamava que as ondas curtas estavam invadindo o Brasil. Sim, havia Getúlio Vargas, que era um ditador e, depois que o Brasil decretou guerra a italianos, alemães e japoneses, perseguia, mandava confiscar rádios de imigrantes desses países, que poderiam estar sintonizando emissoras de rádio do governo de Hirohito, ou de Hitler, ou de Mussolini. Mas isso é coisa de ditador; Getúlio, depois que voltou eleito pelo povo e como democrata, não fez mais isso.

Mas é exatamente isso que estão falando em fazer de novo. Assim como sai a onda curta – que já está fora de moda – de uma antena lá em Buenos Aires, ou em Washington, ou em Nova York, e entra aqui, com o satélite é quase a mesma coisa. Só não é exatamente igual porque a qualidade agora é muito superior e porque na onda curta nós não falávamos de volta com a BBC, ou com a Voz da América, ou com a Rádio El Mundo de Buenos Aires, mas com o Starlink eu estou transmitindo a minha fala para a China (se a China quiser receber), para Taiwan, para o Japão, para Oakland, para Sydney, e recebo o retorno. Na onda curta era mão única, não em mão dupla como agora. Todos nos servimos hoje de um celular que nos permite essa ligação com o mundo e, sobretudo, nos permite ter voz como cidadão, origem do poder.