O economista Arthur Laffer desenhou numa curva o resultado de suas observações sobre tributos. Quanto mais sobem os impostos, mais sobe a arrecadação. Mas há um limite em que os pagadores de impostos se cansam de pagar e, se os impostos continuam subindo, a arrecadação faz uma curva e começa a cair, como a trajetória de uma bala de canhão. Aqui no Brasil, a retirada de limite nas despesas do governo, com a abolição do teto de gastos e o aumento do tamanho do governo, assusta os pagadores de impostos e há quatro meses a arrecadação vem caindo. Cansados de pagar, os contribuintes sonegam ou produzem menos, vendem menos, trabalham menos, reduzindo seus custos, percebendo o absurdo de pagar tanto imposto. A perspectiva de uma reforma tributária que deixa ainda pior a situação do pagador de impostos confirma a trajetória futura da Curva de Laffer.
É um fenômeno psicossocial com consequência econômica e política. O psicossocial é o povo, origem do poder em democracia, regida pelas ideias da Magna Carta de 1215. Já lá vão 808 anos de tentativas de aperfeiçoamento e de supressão. No campo político, no Brasil de hoje, outra trajetória ascendente: Laffer registraria o poder crescente de um dos três poderes, por ironia o único sem representação expressa do voto. O Supremo tem um inquérito que foi criado sem Ministério Publico, em que o tribunal é vítima e ao mesmo tempo condutor absoluto. Também há julgamentos em que o tribunal é vítima de invasões e julga e condena os invasores. Julgamentos virtuais que tolhem a manifestação oral e presencial da defesa. Decisões que interferem de tal modo no Poder Legislativo que tornam o Supremo um criador ou revogador de leis. Chegou ao cúmulo, durante a pandemia, de dar a prefeitos o poder de revogar cláusulas pétreas da Constituição. E, ampliando ainda seu poder, interfere no Ministério Público sobre arquivamento ou não de inquéritos.
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A trajetória ascendente da curva de poder do Supremo parece ter encontrado o esgotamento do silêncio de dois atores análogos aos pagadores de impostos: a OAB e o Senado – dois agentes fiscalizadores das leis, da Constituição e do próprio Supremo, como são os senadores. A OAB emitiu uma nota dura em que defende o direito de defesa, “que é uma garantia constitucional e, portanto, não se submete a regimentos internos, mesmo o do STF”. Conclui afirmando que a OAB continuará insistindo “para que o tribunal cumpra as leis e a Constituição, bem como respeite as prerrogativas da advocacia”.
Por sua vez, o presidente do Senado quebrou o silêncio para se declarar a favor da PEC que proíbe decisões de um único ministro do Supremo que alterem decisões do Congresso. Além disso, Rodrigo Pacheco não quer que partidos derrotados no voto usem o Supremo como “terceiro turno”. O senador disse ao Correio Braziliense, qualificando de invasão de competência de outro poder, que o Supremo “não pode decidir tudo – caso de drogas, aborto, marco temporal. Essas são decisões do Congresso”.
No discurso de posse na presidência, o ministro Luiz Fux identificou o desgaste do Supremo por essas interferências. Revelou esse temor em setembro de 2020; depois disso, ampliou-se o desgaste, que parece não ter sido percebido pelos ministros da corte, na medida em que precisavam isolar-se cada vez mais do povo na rua. Mais distância, mais desgaste. Mais desgaste, mais distância. Mário Henrique Simonsen costumava falar do trapezista que, cada vez mais enlevado com seu poder nos ares, um dia decidiu que poderia voar e mandou tirar a rede.
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